quarta-feira, 24 de março de 2010

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22

“Como recordação de lenda já perdida,”
A vida não se fez além da tempestade
E quando me percebo envolto em triste grade
O quanto se perdera ainda já se olvida

E nada saberei sequer do meu futuro
Aonde se talvez pudesse ter o grão
Apodrecida senda, imensa negação
Deixando o meu caminho ainda mais escuro.

O quanto se quisesse e nada se descreve
O peso do viver em minhas costas corta,
Fechando num momento a outrora aberta porta
Tornando a minha noite imersa em plena neve.

Meu verso ensandecido escuta este marulho
E nele todo o tempo, em vão, triste, mergulho...


23


“Caras sombras! sois vós? aéreas como em sonhos?”
Já não posso viver aonde se fez luta
E o coração mordaz, deveras se reluta
Mostrando tão somente instantes mais medonhos.

Houvesse em meu passado um dia mais feliz,
Quem sabe poderia ouvir tranqüilidade,
Mas nada do que tenho, ainda sinto invade
A sorte mais atroz, e nela se desdiz

O vento abençoado, oásis da esperança
Satânico desejo embrenho em noite vã,
Jamais conhecerei a cor de outra manhã
E ao medo tão somente a voz ora se lança.

Aprendo pouco a pouco a desvendar segredo
E tanto quanto posso, ao nada me concedo...


24


“Que imagens que trazeis de dias tão risonhos”
Se o nada em vós se faz e trama este vazio
Que em verso atemporal, agora já desfio,
Mergulho no passado e nele estes bisonhos

Caminhos que percorro; e o nada ao nada ligo
Paralelo traçado em tom sombrio e turvo,
E quando cada estrada em luzes, tento e curvo,
Deixando para trás o que pudesse abrigo

Insensato percebo o medo dominando
Cenário que se fez em cores variadas,
Aonde se pudesse ainda em vãs estradas
Saber de algum momento ao menos bem mais brando

Pendulares sutis, movimentos tantos
Provendo o coração em fartos desencantos.


25

“que exalais, vem tornar-me aos anos juvenis”
Perfumes que bem sei, tomando toda esta seara
Enquanto tanto brilho em voz calma declara
Tornando minha vida em glória mais feliz.

Pudesse transformar o canto em tanta luz
Teria além do sol um sol mais forte e claro,
E todo este brilhar traduz o que declaro
Na fonte maviosa aonde amor seduz

E mostra o dia a dia ainda em calmaria
Depois da tempestade, imensos temporais,
Deixando o sofrimento alheio ao belo cais
Que a fantasia gera e amor sempre recria,

Vencida cada etapa espelho eternidade
No encanto mais audaz que amor deveras brade.


26


“Vai-se-me em névoa o mundo. Emanações subtis”
Deixando no passado as cores mais suaves
E vendo tão somente o quanto agora agraves
Tornando em minha pele imensa a cicatriz.

O vago do futuro ainda em voz dolente
Matando esta alegria, e não trazendo nada
Impede que se veja ao fim uma alvorada
Neblina tão intensa agora se pressente.

O vendaval destroça imenso furacão
E o gozo feito em lava esboça o mais terrível
De tudo o que pensara outrora mais plausível
Somente os temporais deveras mostrarão

A força deste insano e insofismável canto,
Traçando a cada verso a cor do desencanto...


27


“furtar-me ao seu triunfo. Eis-me, Visões, sou vosso”
E nada mais impede a satânica luz
Que tanto me impelira e agora me conduz
Ao medo mais feroz, e sei que nada posso

Somente me calar e crer noutro momento,
Aonde poderia ao menos ser feliz,
Mas toda a minha história a vida contradiz
E nesta tempestade, adentro em desalento.

Vestindo uma ilusão há tempos não pensara
No quanto se mostrou em dores minha vida
Em trevas e terror há tanto decidida
Matando uma esperança inútil tal seara

Aonde o coração em trevas já se fez
Levado pelo vento, imensa insensatez...


28


“Chegam... que densa turba! Envolve-me... Não posso”
E nem consigo mais vencer demônios tais,
Aonde imaginara um dia em magistrais
Momentos tão sutis, agora sou destroço.

Escombros que carrego ainda dentro da alma
Escórias de um passado aonde sofri tanto,
E quando novamente eu busco a paz e canto
Somente esta ilusão invade e ainda acalma.

Pudesse ter no olhar a claridade enfim,
O mundo não seria apenas sofrimento,
Entranho-me do nada e em nada vejo o alento,
Morrendo sem o sol, pressinto este jardim,

Canteiro da esperança ausente dos meus olhos
Semente que inda vinga, apenas dos abrolhos.


29


“capaz de se render à vossa sedução”
O sonho deste incauto e tolo navegante
Por mais que ainda tente e mesmo se agigante
Diverso do meu canto o sonho de verão.

Esgarço-me vazio e nada se prevê
Somente a tempestade e o frio em vão granizo,
Distante do que quero e ainda sei preciso,
A vida se pressente ausente de um por que.

O caos domina a cena e o nada se percebe
Mergulho neste abismo em abissal formato,
E quando me concebo e trágico retrato
O vão da enorme e fosca, opaca e turva sebe,

O medo se mostrando em face plena e dura,
A noite se entornando em trágica procura...


30


“Poder-vos-ei fixar?... Tenho inda coração”
E mesmo quando sigo imerso no talvez
Deveras o que penso em toda insensatez
Moldando tão somente as cores que virão

Trazendo eterno inverno e medo a quem caminha
Por mais que a sorte mostre um rumo diferente
Apenas o não ser, é o que minha alma sente
Em noite escura e fria, e sei tanto sozinha,

Em vossos olhos creio um dia ter sentido
O brilho que ora ausento e tento perceber,
Opaca realidade entoa o desprazer,
Deixando esta alegria em torpe e tosco olvido.

Aonde se fez luta, escuto a insanidade,
Por mais que o coração ainda tente e brade...

31


“que me enchíeis outrora os olhos visionários
De um tolo sonhador em busca do futuro
E agora nesta ausência eu sinto mais escuro
E mesmo que inda tente em rumos mais contrários

Vencido pelo medo e nada se criando
O gozo mais sutil da vida se transcorre
Num ato tão atroz, e nada me socorre
Aonde se pensara um dia ameno e brando

À luz de um temporal imenso nada vejo,
Somente este vazio e nele o que pensara
Outrora em tez suave, ainda mesmo clara,
Matando dia a dia, aos poucos meu desejo.

A morte da esperança expondo-se voraz,
Levando para sempre o que trouxera a paz.


32

“Tornai-me a aparecer, entes imaginários,”
Demônios mais sutis, satânicas figuras
Em noites tão cruéis, em sombrias e escuras
Moldando a cada instante; atrozes, vãos cenários

Esqueço do que fora um dia a fantasia
E morro pouco a pouco em dores mais terríveis
Deixando para trás os sonhos mais possíveis,
Enquanto tão somente a morte ora me guia.

Escondo-me da fera exposta em armadilha
Quimera que consome o sonho mais feliz,
E nesta dor intensa a sorte contradiz
O que talvez pudesse ainda ao longe brilha.

Mordaz caricatura aonde se cultua
Exposta em noite atroz, imensa e clara lua...

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