sábado, 27 de março de 2010

27690/691/692/693/694/695/696

27690

“Devendo, ao desmaiar sobre o poente,”
O sol preconizando nova noite,
Que pelo menos trague enquanto acoite
A sorte dos meus olhos tão ausente,
Mergulho no vazio que me deste
E nele já percebo o temerário
E dolorido mesmo itinerário
Traçando um tempo amargo, duro e agreste.
Aonde se pensara em gratidão,
Somente um desvalido dia a dia,
O medo que deveras se recria
Moldando a cada tempo a solidão,
À qual ao me entregar eu percebi,
Olhar tão traiçoeiro e chego a ti...


27691


“Do peito afugentar bem rudemente,”
A fera feita em dores e temor,
Aonde poderia haver amor,
Tumor tomando tudo, já se sente,
Metástases invadem cada canto,
Não posso compreender felicidade
Se a cada novo dia mais degrade
Aquilo que julgara fosse encanto,
Mesquinhos olhos ditam abandono
E teimo contra a força mais cruel,
Distante do meu sonho imenso véu,
Teimando ainda tento e o gozo clono,
Mas nada do que houvera ainda vejo,
A glória se transforma num lampejo.

27692


“Saudades desta dor que em vão procuro”
E sinto tomar conta do que penso,
O amor se demonstrara tão imenso
Deixando para trás um solo duro
Aonde não se pode cultivar
Tampouco alguma planta além de abrolhos,
Os medos, os recolho em fartos molhos,
A vida já não sabe mais luar,
Tempestas entre brumas e somente
O mesmo amargo chão se mostra então,
Negando a melhor sorte a cada grão
Aborta-se deveras a semente,
E o tempo de estiagem se prolonga,
A fúria do vazio se faz longa...

27693

“Embebido em saudades do presente”
Já não comporto mais qualquer alento,
Aonde perfilara em sofrimento,
Da sorte me percebo tão ausente,
O gozo se transforma em dor e quando
O dia se aproxima, a madrugada
Somente pelo medo, transtornada,
O teto da ilusão se desabando,
Vagando em noites frias, um cometa,
Encontra novamente o mesmo não,
E assim ao se perder a direção
Só resta ao sonhador leda sarjeta,
O corte se aprofunda, imensa chaga,
Quem sabe outra saudade venha e afaga.

27694

“Vou a medo na aresta do futuro,”
Translúcida uma imagem do passado,
Presente totalmente consternado
Negando cada luz que inda procuro,
Peçonhas que me adentram, mais diversas
E delas me alimento pouco a pouco
Até que me perceba quase louco,
Seguindo cada passo que ora versas,
Mesquinhos os terríveis caminhares
Que deixas como herança para quem
Sabendo da verdade muito aquém
Destroça da emoção tantos altares,
Arestas penetrando dentro da alma,
Nem mesmo a morte em trevas já me acalma.


27695


“Sinto um vago receio prematuro”
E tento disfarçar em poesia,
Mas nada que a sorte me traria
Mostrando a solidão que inda perduro,
Gerando após o nada outro vazio,
Ansiosamente bebo do passado,
O quanto se mostrara destroçado
Traduz o que em verdade ainda crio,
O peso do viver já me envergando,
O medo do futuro ora transcende,
E o quanto sobrevivo só depende
Da glória não sei nem mesmo quando,
Assim se aproximando o meu final,
Quem sabe tenha um gozo triunfal?

27696

“Tenho sonhos cruéis; n'alma doente”
E nada além dos mesmos pesadelos,
Cansado tão somente de vivê-los
Persisto num caminho mais descrente,
E teimo contra a força das marés
As farpas penetrando em minha pele,
Às escarpas sombrias já compele
Os sonhos mais temíveis, tais galés
Açodam com terror este andarilho
Que um dia desejara ser feliz
Ausente dos meus olhos o que eu quis
Apenas o vazio ainda trilho,
E nele se prevê a direção
Traçada pelo mesmo e vago não....

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