domingo, 28 de março de 2010

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27861


“A mucosa carnívora dos lobos”
Espumando-se ao ver a sua presa
Deliciosamente de surpresa
Espalhadas por tantos, vários globos,
São frágeis tais cordeiros, disso eu sei,
A fome dos abutres, incessante,
E quando se percebe a cada instante
A enorme discrepância de uma lei,
Condena-se com farta crueldade,
Na busca do que fora recompensa,
Maios do que deveras já se pensa,
A fome desta fera que te invade,
Vestindo-se de santa vejo então
Pior do que se fosse algum leão.

27862


“Lembra a fome incoercível que escancara”
Glutão insaciável, tal pastor,
Com olhos penetrantes de condor,
Gerando qualquer chaga, medo e escara,
Na fúria desta fera se percebe
O quanto de fartura em sua mesa,
Seguindo com terror tanta torpeza
Devora qualquer ser em fria sebe,
Assisto à derrocada do que outrora
Pensara em salvação, amor e paz,
Terrível criatura mais mordaz
Enquanto se apregoa já devora,
E tendo este disfarce de bondade,
Não há quem não maltrate e nem degrade.


27863


“Como no babilônico sansara,”
A vida se porfia e se renova
Enquanto todo dia posta à prova
A pútrida carcaça se depara
Com lobos, rapineiros e chacais,
Usando de armadilhas, bela caça,
Devoram cada parte da carcaça
E querem sempre muito e muito mais.
Assim da solidão de um eremita
À multidão ignara que caminha
Sem rumo ou direção já se avizinha
Usando da palavra mais maldita
Uma horda tão imunda quão profana,
E a todos com demônios mil engana.


27864

“Uivando, à noite, em lúbricos arroubos,”
Aguardam suas presas, tais canalhas
Assim também traçando em cordoalhas
Diversos salteadores em seus roubos.
Vestidos de terrível santidade,
Usando da mentira e do castigo,
A corja nos condena ao desabrigo,
Por mais que outro caminho a mesma invade.
Nefastos caricatos traçam planos
Adonam-se de todo este universo
Gerando um deus deveras mais perverso
A salvação vendida em vis enganos.
Restando ao caminheiro a negação
Mal reparando então contradição.

27865

“Toda a sensualidade da simbiose,”
Que é permitida dentro das igrejas
Envoltas por festejos e cervejas
Por mais que doutro lado não se goze,
Assisto à derrocada do que fora
Outrora a bela senda onde se via
Um sonhador em plena fantasia,
Traçando nova sorte, redentora.
Preâmbulos do inferno feito aqui,
Somando tais fortunas, nada crendo,
Somente se pensando em dividendo,
Martirizando o pobre que há em ti,
E quando te estraçalham e vomitam,
Os bolsos bem mais cheios, já se excitam.



27866

“No horror de sua anômala nevrose,”
Terrores costumeiros; disseminas
E sabes que eles são sobejas minas
Enquanto ao corpo resta uma necrose,
Partícipes da orgástica loucura
Que tanto professaste, vil fantoche
E mesmo quando em ares de deboche
Perfazes com terror a arranhadura
Dos pregos sobrevives, leda cruz,
Aonde ensandecido mensageiro
Do amor que redimisse e fosse inteiro
Goteja tanto sangue, linfa e pus.
Assim ao revendê-lo no mercado,
Tu geras vil moeda, a do pecado!


27867


“O cuspo afrodisíaco das fêmeas”
A tentação da carne, isto é pecado?
Se o sexo sempre foi abençoado
Por que tanto desvio enfim e; teme-as?
Hipócritas demônios de uma figa,
Se tudo o que desejas demonizas
Também já poluindo mesmo as brisas
Aonde em que caverna a alma se abriga?
Terríveis agiotas, sacripantas,
Vestindo santidade? São bufões,
Enquanto são das almas vendilhões
Produzem leda série: santos, santas.
E cobram aluguéis destes incautos,
Banquetes são satânicos e lautos.

27868


“No sombrio bazar do meretrício,”
Jogado pelos cantos, quem se fez
Um dia por total insensatez
Já que era carpinteiro por ofício,
Lunático talvez, mas com certeza
Uma alma bem mais pura, além da dor,
E quando se propôs um redentor,
Não tinha nem noção desta grandeza.
Falando para tantos mal sabia
Que ali na própria casa onde criara
Imagem mais sublime, em tal seara
Canalha sem perdão prostituía
Na face do cordeiro feito em paz,
Geraram um terrível Satanás.

27869

“E à noite, vai gozar, ébrio de vício,”
Depois de ter pregado paz e glória,
No quanto ainda vende-se em vanglória
Cavando com os pés seu precipício.
Se houver um deus, cuidado meu amigo,
Orando pra que tudo seja farsa
Senão tua alma podre, vaga e esparsa
Terá eterna fúria como abrigo.
Aterrorizas todos com pecados,
Que tanto propagaste, mas cometes
Envolto por meninos e pivetes.
Desejos mais terríveis saciados,
E agora vens falar na pobre cruz?
Tua alma acanalhada expele pus.


27870


“Sentindo o odor das carnações abstêmias,”
Regadas quando muito a vinho e pão,
Insuportável mesmo o vendilhão
Envolto com crianças, machos, fêmeas,
Pregando o que deveras nunca faz,
Artrítica mentira, tosca glosa,
E quando se transforma em perigosa
A fera nunca assume este ar mordaz.
Caprichos de uma natureza vã,
Vestindo-se de santo, demoniza,
E quando se impedindo mesmo a brisa,
Ainda necessita da manhã?
Perece-se em vergonha tal formato
Gerada pela insânia e desacato.


27871


“Suas artérias hírcicas latejam,”
Deliram com ternuras mais audazes,
E quando a lua trama novas fases
Os corpos já desnudos se desejam.
E assisto aos mais banais atos inglórios
Daqueles que se dizem inocentes,
Deveras o que cantam já não sentes
Porquanto serem toscos, merencórios.
Assumem várias faces, tais demônios
Usando os artifícios mais sutis,
E quando o que propagam contradiz
Um ato derivado dos hormônios,
Depois na sacristia, ditam normas,
Que tu mesmo deveras já deformas.

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