segunda-feira, 15 de março de 2010

ESPIRAL DE SONETOS - MÚMIA HOMENAGEANDO CRUZ E SOUZA

MÚMIA

Múmia de sangue e lama e terra e treva,
Podridão feita deusa de granito,
Que surges dos mistérios do Infinito
Amamentada na lascívia de Eva.

Tua boca voraz se farta e ceva
Na carne e espalhas o terror maldito,
O grito humano, o doloroso grito
Que um vento estranho para és limbos leva.

Báratros, criptas, dédalos atrozes
Escancaram-se aos tétricos, ferozes
Uivos tremendos com luxúria e cio...

Ris a punhais de frígidos sarcasmos
E deve dar congélidos espasmos
O teu beijo de pedra horrendo e frio!...

Cruz e Souza


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“O teu beijo de pedra horrendo e frio”
Explode-se em meu rosto, gelidez,
Num tétrico momento se desfez
Quimérica loucura onde desfio

O gozo em histriônica loucura,
Espasmos entre luzes, medos, sombras,
E quando se deitando nas alfombras
Diversos os delírios, dor e cura.

Etéreas maravilhas entre farsas,
Ecléticos prazeres divinais
Iridescentes primas em cristais
Enquanto me seduzes e me esgarças

Meteoros vagando pelo espaço
Ourives da emoção, teu corpo traço...




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Ourives da emoção, teu corpo traço
Em lúbricos delírios, luzes fartas,
E quando dos meus olhos tu te apartas
Seguindo feito um louco cada passo,

Esgueiras entre becos, vilas, ânsias
E tramas com sorrisos gozos vários
Moldando prazerosos, teus cenários
Gerando as mais diversas discrepâncias.

Estrídulos noturnos, vagas ondas,
Marulhos entre risos; bebes lua
E vendo a tua imagem clara e nua,
Enquanto meus desejos buscas, sondas.

Nefasto sonho em gozo assim descrito:
“Podridão feita deusa de granito.”

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“Podridão feita deusa de granito”
A deusa que em lascívia se acomoda
Na cama delirante enquanto roda
Girando em carrossel este infinito.

Atravessando os céus, cometas, luzes
Imersos entre as nuvens, cintilantes
E teimo ver deveras por instantes
Belezas com as quais, reinas, seduzes.

E lúbrica deitada sobre a cama,
Abraço-te demônio ensandecido,
Num ato de terror, fúria e libido,
Insensata mulher, doce, me chama

Na fugaz maravilha em que se fez
Explode-se em meu rosto, gelidez.

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Explode-se em meu rosto, gelidez,
Eflúvios de um momento em sonhos vários
E quanto mais além dos necessários
Carinhos em que uma ânsia se desfez

Sidéreas fantasias, loucas vagas
Mergulho em abissais, intensidade...
Tenazes maravilhas quando brades
E ao mesmo tempo lúdica me afagas

Ferozes luzes, mantras, ecos, hinos
Decifro no teu corpo teus enigmas
Marcantes cicatrizes quais estigmas,
Ao mesmo tempo gozos, desatinos,

E sinto num momento audaz e aflito
“Que surges dos mistérios do Infinito”.

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“Que surges dos mistérios do Infinito”
Em meio aos turbilhões sei e pretendo
Num ato tresloucado ou estupendo
Em fúrias, transtornado anseio e grito

Infames os delírios de um profano
Hedônico demônio; em ti me entranho
E bebo cada gota deste estranho
Veneno pelo qual luto e me engano.

Ferrenhas ilusões, vagos receios,
Espúrias fantasias, ares frágeis
Os dedos te percorrem, buscam ágeis
Caminho entre coxas, boca, seios.

E toda esta estupenda insensatez
Num tétrico momento se desfez.


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Num tétrico momento se desfez
Ensandecida audácia em noite imensa,
Orgástico delírio é recompensa
De toda esta fatal estupidez.

Edênicos caminhos percorridos,
Vacâncias entre vértices e vagas,
Adentro sem temor, sobejas plagas
E bebo destas ácidas libidos

Constelares anelos; ondas várias
Etéreas excrescências, sombras, luzes,
Por tantas paisagens me conduzes,
Em ânsias muitas vezes temerárias

Assim ao perceber-te, louca ceva,
“Amamentada na lascívia de Eva.”

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“Amamentada na lascívia de Eva”
Insana criatura me fascina
Dos gozos mais mordazes, doce mina,
Ao mesmo tempo luz e imensa treva.

Sedenta, me sacia e mais voraz
Adentra os meus delírios com ternura,
Enquanto me maltrata e me tortura
Intensamente vem e satisfaz.

Espectros do passado me rondando,
Cadáveres das dores renascidos,
Momentos muitas vezes divididos,
Um ar tão tormentoso ou mesmo brando

Emaranhada luz em tom sombrio
Quimérica loucura onde desfio.

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Quimérica loucura onde desfio
Os meus delírios tantos e fugazes,
Enquanto meus prazeres satisfazes,
A cada anoitecer, um desafio.

Bebendo cada gota do teu gozo,
Explodes feito louca em minhas mãos,
Adentro sem perguntas, furnas, vãos
Momento de prazer maravilhoso.

Excêntricos caminhos desvendados,
Nesta lubricidade que nos doma,
Multiplicando além de simples soma,
Tremores, cataclismos provocados

No solo dos delírios, morta a treva
“Tua boca voraz se farta e ceva”.

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“Tua boca voraz se farta e ceva”
De todas as vontades satisfeitas
E quando do meu lado tu te deitas,
Delícia se mostrando então longeva.

Excêntrico delírio, insensatez,
Volúpia se entornando sobre a cama,
Teu corpo insaciável já me chama,
Penetro mansamente, e agora crês

No quanto se faz sempre necessário
Fulgor ensandecendo nossas vidas,
Nas fráguas, labaredas percebidas
Adentro teus tesouros, qual corsário

E assim se concretiza esta procura:
O gozo em histriônica loucura.


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O gozo em histriônica loucura
Levando ao céu e ao limbo ao mesmo instante
Num ato tresloucado e fascinante,
Prazer que tantas vezes me tortura

Lascívia envolvendo nossas peles,
Anseios satisfeitos. Imensidão...
Momentos delicados mostrarão
Delírios com os quais, clamas, compeles.

Num êxtase supremo te idolatro,
Ao mesmo tempo em dores, medos fartos,
Na incrível maravilha destes partos
Ao mesmo tempo diz altar, diz atro.

Explodes em prazer doce e bendito
“Na carne e espalhas o terror maldito.”

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“Na carne e espalhas o terror maldito”
Enquanto me seduzes com sorrisos,
Inferno matizando paraísos,
Imerso em tais loucuras, nosso rito.

Nefastas maravilhas noites raras,
Ferrenhas emoções em tom tranqüilo,
Se pelo Céu deveras eu desfilo
A porta dos Infernos me escancaras.

Dicotomia gera insanidade,
E teimo em vasculhar cada segredo,
Numa ânsia incontrolável logo cedo,
E a fúria de um desejo assim me invade,

E lânguida me expondo nas alfombras
Espasmos entre luzes, medos, sombras.


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Espasmos entre luzes, medos, sombras
Enquanto me dominas com fulgor,
Ao mesmo tempo sinto este amargor
Terrível caricata tu me assombras,

Espalhas pela casa o teu perfume,
Sedento em avidez, descontrolado,
Vagando sobre escombros do passado,
Sentindo o teu calor, imenso ardume.

Ascendo assim aos vértices do sonho
E vago entre as estrelas, cordilheiras,
Vontades satisfeitas, corriqueiras,
Ao fundo espectro turvo e tão medonho

Derrama sobre a Terra em tom aflito
“O grito humano, o doloroso grito.”.


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“O grito humano, o doloroso grito”
Invade estas searas mesmo flóreas
Entranho por estradas que, marmóreas
Transcendem à beleza do granito.

E o quadro se repete novamente,
Esdrúxulos caminhos percebidos,
Arquejo com a força das libidos,
E o gozo tão premente não desmente.

Afetam-se deveras os desejos,
Arquétipos de tempos tão terríveis
E a sombra dos fantasmas mais temíveis
Explodem no meu céu, raros lampejos

Na cama em languidez tu sempre assombras
E quando se deitando nas alfombras.


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E quando se deitando nas alfombras
Pensara no teu corpo sobre mim,
Delírio desenhado; chego ao fim
Enquanto vejo vivas tuas sombras.

Abraço-te em sidéreas ilusões
E vago qual cometa por espaços
Momentos prazerosos são escassos
Além do que desnuda ainda expões

Nos sonhos e nas ânsias mais audazes,
Mergulho em tuas sendas e desvendo,
Em glorioso anseio em que estupendo
Caminho dos delírios já perfazes

Entretanto distante vejo a treva
“Que um vento estranho para és limbos leva.”

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“Que um vento estranho para és limbos leva.”
Deixando o Paraíso entre nós dois,
Vivendo sem temor do que depois
Ainda possa ser terror e treva.

Audaciosamente te persigo,
Vagando pelas sendas infinitas.
E quando me aproximo então me excitas
Deitando sobre ti, prazer e abrigo.

Os fardos que ainda trago já não pesam,
Extraio de teu néctar a delícia
Bebendo cada gole com malícia
E os medos e temores se desprezam,

Assim em plena luz, brilho e tortura
Diversos os delírios, dor e cura.


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Diversos os delírios, dor e cura”
Abismos que cavamos num mergulho,
A cada queda espinho e pedregulho,
Ao mesmo tempo insânia em vã loucura.

Abençoadas noites em que vês
O brilho destes astros entre nós,
Amor que é salvador, venal e algoz
Levando para sempre a lucidez

E adentro em tuas carnes desejosas,
Penetro os teus segredos mais profanos
E mesmo que inda veja desenganos
Sorrindo no momento em que tu gozas

E assim em precipícios mais ferozes
“Báratros, criptas, dédalos atrozes”

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“Báratros, criptas, dédalos atrozes”
Transfigurando a face desdenhosa
De quem ao me ofertar jardim e rosa,
Mudando com terror, traçando algozes.

Esgueira-se a venal caricatura
Daquela que se fez deusa e rainha,
Enquanto a divindade se avizinha,
A boca mais sedenta, me tortura.

Apalpam-se desejos incontidos,
Incontinentes traços, pesadelos.
Sentindo algum prazer ao revivê-los
Afloram sem segredos os olvidos

É quando vejo em luzes mais esparsas
Etéreas maravilhas entre farsas.


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Etéreas maravilhas entre farsas
Desejos desvendados e profanos,
A sorte molda acertos entre enganos
E nesta insensatez logo disfarças

E ris dos meus demônios incontáveis,
Terríveis ilusões, medos vorazes,
E quando dos meus sonhos tu desfazes
Traçando outros caminhos impalpáveis

Eu beijo tua boca em arrepios
E teimo em vasculhar cada segredo,
Do gozo que recebo e te concedo,
Refeitos feito em ciclos nossos cios

E em meio às ânsias fartas vis algozes
“Escancaram-se aos tétricos, ferozes...”


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“Escancaram-se aos tétricos, ferozes”
Delírios luzes fartas, sonhos vãos,
E neles espalhamos nossos grãos
Vagando por espaços, gritos, vozes.

Eclodem nebulosas e quasares
Vestígios planetários, astros vários
E quando se mostrando temerários
Fazemos dos dosséis nossos altares.

Fulguras sobre mim ensandecida,
Deidade, rara sílfide, profusa,
A fome se sacia e se lambuza
Alheia à própria vida que se acida

E tendo no teu corpo raro cais,
Ecléticos prazeres divinais.

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Ecléticos prazeres divinais
Rastreio teus anseios mato a fome,
E a fúria que deveras nos consome,
Pedindo cada vez e muito mais.

Ascetas caminhantes noutra sebe
Não vêm o delírio que se espalha,
A cama sendo um campo de batalha,
Unidos vencedores, se percebe.

O caos entrelaçando um infinito,
Augúrios variáveis e proféticos,
Momentos prazerosos são ecléticos
E neles refazemos todo o rito

Enquanto num desejo propicio
“Uivos tremendos com luxúria e cio...”

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“Uivos tremendos com luxúria e cio”
Somando nossos corpos, florescências
E bêbados de luz, vitais essências
Vencendo qualquer fúria ou desafio.

Esgueiras pela cama e te procuro,
Enlanguescida deusa aqui desnuda,
Em serpe esta figura se transmuda,
Dourando com ternura o quarto escuro.

Ansiosamente encontro na nudez
Suprema maravilha, raro encanto,
E tanto quanto quero, mais te canto
Além do que pretendes, mesmo vês

Momentos deslumbrantes, magistrais
Iridescentes primas em cristais.


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Iridescentes primas em cristais.
Fenômenos, luzernas, brilhos tantos,
Envolta por neblinas, frágeis mantos
A lua com seus raios divinais

Encontra-te em marmórea fantasia,
Argêntea insanidade nos domina,
E toda a profusão da rara mina,
Tomando-me de assalto já sacia.

Irônicas manhãs, noites sedentas
Sacrílegos caminhos descobertos,
Adentro por portais que agora abertos,
Enquanto tu me engoles me apascentas

E assim em correnteza, mil orgasmos
“Ris a punhais de frígidos sarcasmos”.




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“Ris a punhais de frígidos sarcasmos”.
Envolve-me com pernas, as tenazes
Ao mesmo tempo tragas e me trazes
Momentos divinais, loucos espasmos.

Assim nesta fantástica viagem
Percebo os descaminhos prazerosos,
Herméticos fulgores caprichosos,
Mudando num segundo a antiga aragem.

Ao fundo se percebe a plena lua
Deitando sua prata sobre nós
E o vento se aproxima em tom feroz
Tocando tua pele, bela e nua

Ao mesmo tempo ris em toscas farsas
Enquanto me seduzes e me esgarças.

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Enquanto me seduzes e me esgarças
Arrancas meus segredos, minhas peles,
Às ânsias e aos delírios me compeles
Com a beleza e graça destas garças

Ao mesmo tempo expões tua rapina,
Emanas os desejos em lascívia
Por mais que uma esperança viva. Prive-a
Durante a insanidade que fascina.

Espreito cada bote preparado,
Alheia aos meus temores, tu te ris,
E sinto-te deveras mais feliz,
Ao ver o sonho enfim despedaçado

Preparas para lúbricos sarcasmos
“E deve dar congélidos espasmos”...

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“E deve dar congélidos espasmos”
Algozes maravilhas me preparas
Cevando meus prazeres entre escaras
Matando com fulgor velhos marasmos.

E o tempo não se permite outra falácia,
Galgando noites tépidas, insone
Por mais que uma esperança me abandone
Tu trazes num olhar feroz audácia.

E tramas entre chamas, camas, luzes,
Fartura mesmo em trágica aridez,
No quanto ainda vejo que tu crês
Desvendas meus anseios e seduzes

Olhando-te desnuda em sonhos traço
Meteoros vagando pelo espaço.


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Meteoros vagando pelo espaço.
Adentrando este quarto, seus umbrais
Momentos muitas vezes eternais
Nos quais por vezes sonhos eu desfaço.

Degraus tão variados desta escada,
Delírios entre fogos e geleiras,
E quando pela cama tu te esgueiras
Às vezes adentrando a madrugada,

Alheia aos meus quereres, meus anseios,
Vagando por caminhos que não sei,
Talvez ainda creia noutra grei,
Enquanto acaricio belos seios,

Percebo no mistério que desfio
“O teu beijo de pedra horrendo e frio.”.


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“O teu beijo de pedra horrendo e frio”
Por vezes me maltrata, mas depois
Na fúria que te entranha; eu vejo, pois
Momento deslumbrante em desafio.

Da gélida explosão, doce quimera,
Verão que se invernado vez em quando
Jamais se reconhece em fogo brando
Incêndio que no incêndio regenera

Astuciosa fera me devora,
Insaciável deusa, voz e gozo.
Caminho tantas vezes caprichoso,
Sabendo desde sempre quando é hora

E assim mesmo que morto de cansaço.
Ourives da emoção, teu corpo traço...

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