sábado, 27 de março de 2010

HOMENAGEM A ALBERTO DE OLIVEIRA

Última Deusa

Foram-se os deuses, foram-se, eu verdade;
Mas das deusas alguma existe, alguma
Que tem teu ar, a tua majestade,
Teu porte e aspecto, que és tu mesma, em suma.

Ao ver-te com esse andar de divindade,
Como cercada de invisível bruma,
A gente à crença antiga se acostuma
E do Olimpo se lembra com saudade.

De lá trouxeste o olhar sereno e garço,
O alvo colo onde, em quedas de ouro tinto,
Rútilo rola o teu cabelo esparto...

Pisas alheia terra... Essa tristeza
Que possuis é de estátua que ora extinto
Sente o culto da forma e da beleza.

Alberto de Oliveira


1


“Sente o culto da forma e da beleza
Suprema maravilha em belas formas,
E quando em deusa viva te transformas
Diana com certeza tem a presa.
Entregue aos teus caprichos, nada vejo
Senão cada momento feito em glória,
A vida que pensara merencória
Tomada pela insânia de um desejo
Transcorre em loucos dias, delicados,
Arcando com ternuras e delícias
Envolto tão somente por carícias,
Os dias entre cores bem traçados,
Sentindo-te presente a todo instante
Deidade em plenitude. Deslumbrante!

2

“Que possuis é de estátua que ora extinto”
Olhar entristecido, medo exposto,
E quanto mais percebo em contragosto
Deveras sem pensar sequer, eu minto.
Atemporal vontade de saber
Aonde se escondera esta verdade,
Ausente dos meus olhos, liberdade,
Delírio toma conta do viver,
E sei o quão se fez urgente a luz
E todos os temores que adivinho,
Porquanto caminhara tão sozinho,
O amor ao sonho nunca fez mais jus,
E o caos tomando conta do cenário,
Quando o ato de sonhar é temerário.

3


“Pisas alheia terra... Essa tristeza”
Deixando alguma luz que ainda creio
Vagando pelo tempo, sinto alheio
Desejo que traduz tanta incerteza.
Ariscas caminheiras, esperanças
Por vezes maltrapilhas, maltratadas
Seguindo sem destino tais estradas
Enquanto um brado tosco ainda lanças
Vencidos pelos mesmos desenganos,
Logrando tão somente dor e medo,
Se algum momento até penso e concedo
Mudando a direção de antigos planos.
O quanto desejara ser risonho
Futuro a cada dia decomponho.


4


“Rútilo rola o teu cabelo esparto”
Cobrindo os ombros, vejo tal beleza
E quando se percebe a natureza
Do encanto que tu geras, quedo farto.
Embevecido, sigo tal imagem
E nela se traduz tanta ternura,
Minha alma se entorpece e te procura,
Vagando paraísos na viagem
Que faz pelos recônditos mais belos,
E traça sem fronteiras o reinado,
Das ânsias do prazer, sinto tocado
Vivendo fantasias de castelos,
E traço em tais momentos meus anseios
Cabelos soltos cobrem belos seios...

5

“O alvo colo onde, em quedas de ouro tinto,”
Sensuais novelos ditam formosura
E quando se percebe tal ventura,
O amor que antes julgara quase extinto
Refaz e revigora num delírio
Gerando esta ternura mais audaz,
E quando este desejo satisfaz
Matando qualquer sombra de um martírio,
Desfilas maravilhas pela sala,
As luzes refletindo-se em teus pelos
O sol que se agiganta só por vê-los
Minha alma de tua alma uma vassala,
Rescendes a perfumes delicados
Meus olhos por sobejos tons tocados.


6


“De lá trouxeste o olhar sereno e garço,”
E assim ao se mostrar nua e tão bela
A divindade plena se revela
Olhando com volúpia mal disfarço,
O tempo se transforma e num repente
Aquilo que pensara ser vazio
Tornando caudaloso e raro rio
E a foz maravilhosa se pressente
Um mar de imenso azul tens num olhar
Que tanto se traduz imensidão,
Os dias do teu lado moldarão
Além do que pudera imaginar,
E assim ao perceber tal majestade
Minha alma de ternura ora se invade.

7

“E do Olimpo se lembra com saudade”
Aquela que domina o pensamento
Trazendo para os sonhos o sustento,
Certeza de viver felicidade.
Aonde se mostrara dor imensa
Agora se conhece luz profana,
A deusa já desnuda em luz emana
O gozo; mais sublime recompensa.
Tecendo em plena vida eternos dias
E neles porfiando maravilhas,
Enquanto intensamente sei que brilhas
Descreves nos anseios poesias,
E assim ao te sentir aqui por perto,
Os medos do passado já deserto...


8

“A gente à crença antiga se acostuma”
E traça a cada dia velho encanto
Gerando dentro em nós um belo canto
Aonde se percebe a mesma espuma
Do mar que volta e meia beija a praia,
Reinando eternidade em tantas ondas,
E quando se perfazem novas rondas,
A sorte sobre o dito se desmaia,
Por tempos tão diversos motes tais
Envolvem com seus braços nossos sonhos,
E quando se mostrando mais risonhos
Caminhos conhecidos, magistrais,
O todo se refaz e o que se trace,
Pensara já perdido, mesma face.

9


“Como cercada de invisível bruma,”
Divina criatura reina em paz,
E quando me percebo mais audaz,
Minha alma ao te tocar, em sonho esfuma,
E o pendular caminho ora refeito,
Permite que se tenha esta certeza
De ser eternamente tua presa,
E desta forma estando satisfeito,
Sabendo desde sempre a maravilha
Do quanto é necessário ser feliz,
Vivendo da maneira que bem quis,
Ousando me prender nesta armadilha
Aonde a deusa traça com malícias
Caminho feito em ânsias e delícias.

10

“Ao ver-te com esse andar de divindade,”
Jamais eu poderia imaginar
Que a vida se faria em luz solar
Enquanto o brilho farto ora me invade,
Sedento do calor de teu carinho,
Vencendo os meus antigos desalentos
Entregue sem pensar mais em tormentos,
Do Olimpo em plena vida, me avizinho.
E sinto em teu perfume esta certeza
Do néctar desfrutado, da ambrosia,
O amor quando demais cedo porfia
E gera além de tudo tal beleza,
E nela me envolvendo, seduzido,
O tempo do sofrer ledo, esquecido...

11

“Teu porte e aspecto, que és tu mesma, em suma”
Deixando assim em paz já divisado
Caminho há tanto tempo desejado,
E nele toda a sorte se acostuma
A ter em rara fonte saciada
A sede de saber eternos ritos,
Os dias do teu lado tão bonitos,
A redenção da dor anunciada
Permite a geração de um novo tempo
Aonde eu possa crer num raio imenso,
E a cada amanhecer eu me convenço
Já não percebo mais um contratempo,
E alheio ao sofrimento de outras eras
Encontro nos teus olhos, primaveras...

12

“Que tem teu ar, a tua majestade,”
Já sabe caminhar entre as estrelas,
Belezas sensuais ao envolvê-las
Na insânia que mais forte grite e brade
Perpetuando a luz que tu me emanas,
Esqueço dos momentos mais vazios,
E encontro do futuro nobres fios
Palavras e delícias soberanas,
A fonte se transborda em luzes tantas
E nelas eu sacio minha sede,
Descanso nos teus braços, bela rede,
Enquanto com mais força tu me encantas
Acende-se esta chama dentro em mim,
Do amor que tanto quero, e não tem fim...

13


“Mas das deusas alguma existe, alguma”
Perdida no universo dos mortais
Vencendo os dissabores, temporais,
Aonde o coração em paz se apruma,
Esgueiro-me entre pedras, vejo em ti
A deusa que deveras procurava,
A sorte feita em luz rompendo a trava
Traduz o que quisera e pressenti,
Perenes os caminhos de quem ama
E sabe cultivar este jardim,
O amor que tanto espero sei em mim,
Selando com ternura antigo drama.
O quanto te desejo e tu também
Vivendo a plenitude e muito além.

14


“Foram-se os deuses, foram-se, eu verdade;”
Pensara há tanto tempo poder ver
O dia num raríssimo volver
Tocado pela luz que não degrade
E faça cada instante ser aquele
Que tanto desejara e mostraria
Além de simplesmente fantasia
O quadro que em belezas se revele.
Assisto ao conhecer-te a imensa cena
Aonde se perfaz um velho sonho,
E quando Olimpo aqui eu recomponho,
Minha alma com ternura se serena.
Viver este momento intenso e raro,
É tudo o que desejo e em paz declaro.

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