domingo, 25 de abril de 2010

30766 até 31016

30766

Os dentes podres sorrindo
A criança mendigando
Outro sonho destroçando
Este olhar que fora lindo,
E meu mundo assim deslindo
Face exposta em tom nefando,
Quando passo sonegando
O que vejo, produzindo
A miséria sem saber
Nesta omissa relação
Entre fome e podridão,
Entre esgoto e o vil poder.
E decerto, sou canalha,
Faço parte desta malha.

30767


Voando sobre o meu rosto
Asas turvas rapineiras,
Entre fúrias e besteiras
Este mundo segue exposto,
E se tanto decomposto
Ao se ver nestas bandeiras
As imagens altaneiras,
Sonho torpe sendo imposto,
Neste sangue sem hemácias,
Nesta vida em vãs falácias
Eu percebo o meu retrato,
E se tanto uma mudança
Desejável não se alcança,
Também sei quanto eu maltrato.


30768


Devorando ao renascer
As imagens mais sutis,
Quanto tempo se desdiz
E produz em desprazer
O que outrora pude ver
E se um dia fui feliz,
Hoje volto, um aprendiz,
Tanta coisa por saber,
Mas no fundo a mocidade
Que esta ruga já degrade
Não se vê sequer se espera,
Neste outono em frio e neve
Coração moleque atreve
Ver surgida a primavera?

30769


Formas várias paladar,
Noite imensa, turbilhão,
Entre bares, sensação
Do prazer vender e dar,
Carcomido este luar
Em neon, a solidão,
Expressando a negação
Do que tanto quis amar,
Se vencido pelo nada,
Ao sentir a madrugada
Dentro da alma mais confusa,
O que pude ter em mente,
Noutro encanto se freqüente
Toda a dor minha alma acusa...

30770

Destes fraques, paletós,
Ternos, rica convivência
Vejo morta esta inocência
Da esperança amargos nós,
E se tanto fui algoz
Em total clarividência
A verdade em penitência
Tem a tez dura e feroz,
Resistindo ao que restara
Do que tanto fora amara,
Arduamente dói em mim,
Porta aberta? Nunca mais,
Explodindo porto e cais,
A viagem chega ao fim...

30771

Um sorriso de bom moço
Não merece esta atenção
E se fosse solução
Não seria fundo o poço,
Quando o tempo em alvoroço
Vai mudando a direção
Desta mesma embarcação,
Adentrando pelo fosso,
Encontrando a minha face
Neste esgoto que se trace
Com palavras e atitudes,
Filho, espero no futuro
Que teu tempo seja puro,
E o cenário torpe mudes...

30772

Todos sabem bem no fundo
Quanto vale o nada ser,
Nesta fome de poder,
Neste solo podre e imundo
Dos esgotos eu me inundo
Lamaçal eu passo a ver
Onde pude amanhecer,
Outro rumo, vagabundo,
Tento às vezes recomeço,
Mas de novo outro tropeço
Tudo volta a ser como era,
E se quase fui feliz,
Vou vivendo por um triz,
Volta e meia, surge a fera...

30773

São cardápios bem diversos,
Os que tanto se permitem,
E deveras acreditem
No que dizem tolos versos,
Nos momentos mais dispersos
Em que os vãos não delimitem
Meus caminhos se transitem
Entre tantos universos,
Bebo o sangue, como o pão
Vinho podre, farsa e grão,
Semeara em aridez,
Mas agora estupefato
Se medonho eu me retrato
Diferente do que vês...



30774


Servindo na bandeja
A cabeça decepada,
Outra história revelada
Muito além do que isto seja,
Quando a sorte enfim se almeja
E sem dó em disparada
Novo tapa ou cusparada,
Onde quer que ainda esteja,
A mortalha se reflete,
Mas ao povo este confete
Conferindo gozo e riso,
Pão e circo pra platéia,
A cabeça pra assembléia,
Onde resta o Paraíso?

30775


Dos sonhos que tive outrora
Nem um só revejo então,
E se busco solução
A saudade mete a espora,
E se tudo fosse agora,
Novo tempo indecisão?
Ou deveras sem perdão,
Tanta fúria nos devora.
Morte em vida se ver hino
E se ainda me fascino,
Vejo o corpo que insepulto
Vai servindo de repasto,
E se às vezes eu me afasto
Sigo omisso, sempre oculto...

30776


O meu sonho que às avessas
Entregando em devaneios
Adentrando turvos veios
As verdades mais espessas,
Onde vejo tais cabeças
E deveras tento seios,
Os meus dias tão alheios
Em mortalha sempre teças,
E bebendo com afinco,
No sertão, sapê ou zinco,
Resta apenas a tapera,
Do que tanto quis um dia,
Nem um ato se faria,
Só teu luto a vida espera...

30777


No pesadelo de agora
Costumeira companhia,
Toda a sorte mais sombria
Extrapola e comemora
O que nunca sei ter hora
E se tenho não se adia,
Rasgo assim a fantasia
A nudez clara decora,
Sem coragem para a luta,
A vontade se reluta
E restando mero esboço,
Do que fora carne e sonho,
Quando enfim me decomponho,
O que sobra, apenas osso...

30778


Votam aves rapineiras
E fazendo tanta festa,
Se em verdade o que inda resta
Das mortalhas mensageiras,
Não se vê conforme queiras
Da esperança mera fresta,
Toda a história desembesta
E somente carpideiras
Na parada de sucessos,
Eis assim nossos progressos
Rumo ao nada em podre face,
Mas se tento algum momento,
Novamente em desalento,
Quieto, mudo, em frio impasse...

30779


Tragando tudo deveras
Sem saber do paladar,
A vontade de matar
Acordando minhas feras,
Entre dentes, garras, eras
E deveras devagar
Nada resta em seu lugar,
Quando aos poucos degeneras
E perpetuando o não
Onde pude em solução
Salvação? Leda mentira,
O que acorda agora em mim,
A certeza deste fim,
Ao abismo já me atira...


30780


Destruindo estas campinas
Incendeia o matagal
Face escusa e tão normal,
Onde ditas nossas sinas
Destas mãos vis e assassinas,
Este tosco ritual
Onde outrora magistral,
Onde cenas tão ladinas,
Das latrinas da esperança
Na lixeira onde se lança
O futuro encarniçado.
O que tanto poderia,
Noutra face em agonia,
Nossa herança este legado...

30781

Sugando sangue à vontade
Hematófago morcego,
Se eu pudesse com sossego
Conhecer a liberdade
Talvez nunca mesmo agrade,
Mas se tento algum apego,
Nem tampouco peço arrego,
Eis a minha realidade.
Em Brasília meus irmãos
Semearam tantos grãos
Instalando-se o progresso,
Habitando este planalto,
Espalharam pelo asfalto
Dominaram o congresso.

30782

Ao forjar novas correntes
Entre tantas costumeiras,
Levantar estas bandeiras,
São deveras convergentes
Nos momentos em que sentes
Dores fartas corriqueiras,
Em searas financeiras,
Propagando tolos entes,
Se cubista, ou dadaísta
Pagamento só à vista,
Tão diverso e tão igual,
Na verdade a correnteza
Não percebe a sutileza
Basta ter cara de pau...


30783


São tão frágeis estes elos
Que inda uniam nossos passos,
E se tanto quis espaços
Entre rumos paralelos,
Não construo meus castelos,
E nem sei sequer os traços,
Dias mortos, velhos, lassos
Onde outrora foram belos,
Com o meu cinzel medonho
Cada face recomponho,
Caricata esta figura,
Persistindo em cada engodo
De um pedaço vê-se o todo,
Nem o tempo mais depura...

30784


Das correntes e galés
Que me deste de presente,
O que em nada se pressente
Não atando mais aos pés
Se deveras feras és
E se eu sou mais previdente,
Cada almoço se apresente
Esgueirando, de viés.
Não pudesse ter além
Do vazio que contém
Toda parte do que sou,
E se um dia fui diverso,
Hoje sendo assim disperso,
De mim mesmo o que restou?

30785


Se os meus cantos são dementes
Entre tantos que escutara
A saudade gera a escara
Somos todos penitentes
E se tanto já te ausentes
Quando a noite se declara
O que sinto desampara,
Com a faca entre meus dentes
Rastros busco e nada encontro
Onde vejo o desencontro,
Ponto inerte, pane à vista,
Mas às quatro da matina,
Retornando me alucina,
De onde andaste, sequer pista...


30786

Tire o dedo do nariz,
Que falta de educação
A meleca não é pão
Nem tampouco pedra e giz,
A criança tanto diz
Tão somente não e não
Come tudo o que há no chão
Não se queima por um triz,
Assim vejo este menino
Engatinha pela sala,
Tudo faz e nada fala,
Qual será o seu destino?
Só não seja sonetista
Por favor, disto desista!

30787

As unhas adentrando minha pele
Cortando friamente cada parte,
Assim se condeno a tal descarte
A vida tanto atrai quanto repele,
E tanto poderia e não apele
O fato é que deveras viver de arte
É coisa que não tento e se reparte
O sonho com outrem, o sonho sele,
E vague por estrelas, poesia,
Mostrando este cenário em rebeldia
Bebendo desta fonte inesgotável,
Às vezes procurando algum repasto,
Do todo que pensara já me afasto,
E tento ser decerto renovável.


30788

Acorrentando os mais fracos
Aumentando a sensação
Desta enorme podridão,
Com terror, temíveis tacos,
Ao comer apenas nacos
Do que fora a provisão
Já não tenho previsão
Nem tampouco dos buracos
Onde a queda se anuncia
E se tanto a fantasia
Traduzisse o que hoje tento,
Não pudesse ser diverso,
Não faria mais um verso,
Não teria um só momento...

30789


Expondo vísceras tantas
Se fartando da carcaça
A vergonha já se traça
Onde tentas, desencantas
E se ainda não te espantas
Na verdade, viras traça
E bebendo esta cachaça
Ao futuro te adiantas
E verás, pois retratado
O que fora meu legado
Num cenário surreal,
Onde fiz a minha festa,
O que tanto ainda resta
Um terrível festival...

30790

Dos trôpegos caminheiros
Pela vida a cada queda,
Nada sei do que se veda
Nem tampouco meus canteiros
Encontro os seus janeiros
Entre fúrias, a moeda
Que se cobra, nos enreda
Em momentos derradeiros,
Pago em dia meus impostos,
Mas os ratos decompostos,
Comem toda a provisão,
Na dispensa nada tendo,
Antes fosse dividendo,
Só resta a sonegação...

30791

Penetrando pelas bocas
Destes tantos que famintos
Colecionam seus helmintos
Entre fúrias, sortes ocas,
E das feras velhas tocas,
Entre riscos, sendo extintos,
Os seus sangues pouco tintos,
As moradas são malocas
E no fundo tudo igual,
Este fato é mundial
E não vejo qualquer cura,
O demônio em gargalhada
A televisão ligada
Já desliga da loucura...

30792

Destruindo como dantes
Dizimaram mil canteiros
De outros deuses mensageiros,
Sem almas tais habitantes
Entretanto diamantes
Com certeza verdadeiros,
Espanhóis foram ligeiros
Portugal, mesmos instantes,
E se tanto avermelhada
Esta tez ensangüentada
Abençoa-se o domínio
Hoje a face desolada
Desta tribo destroçada
Pra turista é um fascínio!

30793


Nesta dantesca folia
Geração pós geração
O que tanto em servidão
Já não tem mais serventia,
A vontade que nos guia,
Outro sim ou mesmo o não,
Resta apenas redenção
Do que tanto condoia
A farsante face vê
Um caminho sem por que
E a vontade de voar,
Aversão? Já não mais basta
Esta imagem velha e gasta
Nada tem a revelar...

30794

Quando ao rir és delirante
Nada tendo como lastro
Se decerto eu já me alastro
Sonho tolo e galopante
Não se mostra a todo instante
Nem tampouco sigo o rastro,
Solidão se tenho um astro
No meu peito em tom brilhante?
Poesia é mero dom,
Na verdade o mesmo som
Tem diversa dimensão,
Se eu pudesse em meu jardim,
Plantaria outro jasmim,
Mas só nasceu irrisão!


30795

Ao cuspir nas velhas faces
Degradadas dos mendigos,
Onde vira bons amigos,
Nada resta nem impasses,
E se tanto assim tu traces
Os diversos desabrigos,
Onde restam tais umbigos,
Não se vendo desenlaces
Mais sublimes e corretos,
Somos todos desafetos
E perpétuos carniceiros,
Parto sempre do princípio
Vendo em todo município
Tais cenários corriqueiros

30796

Ao ladrar nestas orgias
Das bacantes gozos fartos,
Entre várias camas, quartos
Gargalhadas e heresias,
No momento em que me vias,
Esperanças, mortos partos,
Nas paredes os lagartos
Entrelaçam fantasias,
E se tanto nada tenho
Ou se posso e não convenho
Convenções já não me cabem,
Se fechasse o cabaré
Não pudesse tanta fé
Onde os mundos se desabem...

30797


Ao aproveitar impasse
O que tanto se fez réstia
Não pretendo com modéstia
Mergulhar em nova face,
Sendo amor uma moléstia
O que tanto assim se trace
Nem deveras me trespasse
Nem se tanto ainda ateste-a.
O cortar da solidão
Esgueirando rés do chão
Farpas crava neste solo,
Eu sonhei e não devia,
Muito embora a fantasia
Não transmite qualquer dolo...

30798


Repetindo melodias
Que se ouviam noutras eras
Extorquindo primaveras
Não se vê quando sorrias
As medonhas ironias
Pelas quais tudo temperas,
E verdades são quimeras
Minhas noites sempre frias,
Ouço vozes, nada vejo,
Sigo alheio ao meu desejo,
Profanada realidade,
O caminho para as pedras,
Se não vês e logo medras,
Tanta fúria nos invade...

30799


Ao cantar nos temporais
Ressabia-se quem tenta
E se vejo esta tormenta
Procurando sempre mais,
Nunca pude ser demais
E se ainda ao longe vento,
Qualquer dor traçando o intento
Os caminhos sensuais
Carnes rotas, boca aberta
Da mortalha que me alerta
Nem sinal sobrevivera
Do pavio sem a cera
O velório não tem pressa,
Nova vida recomeça.


30800


Criado sem fantasia
Dia a dia pés no chão,
No que tange a direção
Eu procuro sempre o dia,
Mas deveras a alforria
Se negara a precisão
Sonegara este verão
Tanto inverno se recria
Do pecado que abençoa
Naufragando esta canoa
O meu barco sem timões,
E se tento nova frota,
Meu caminho se amarrota
Quando tudo tu me expões...

30801

Se matasse liberdades
Novos dias não trariam
E deveras poderiam
Ter repostas velhas grades
Se talvez tu não te agrades
Do que tanto se fariam
Velhas faces mostrariam
Com terror duras verdades,
O mergulho no passado,
Torpe e arcaica ditadura,
Ao fazer a noite escura,
Foi decerto o meu legado,
Desta sombra, vadre retro,
Inda sinto a dor do cetro...

30802


Ao anoitecer o dia
Onde tanto quis o brilho,
Vou perdendo rumo e trilho,
Emoção de novo adia
A verdade se recria,
E se tento um andarilho,
O mergulho, um empecilho,
Corta e gera outra sangria,
Navegando neste nada,
Onde a sorte sonegada
Transformara em dor e pranto,
O que eu quis e nunca pude,
Morta em mim a juventude
Resta apenas desencanto...

30803


Noutro sonho revivido
Fantasia sei deveras
E se exposto às mesmas feras
Do futuro não duvido,
O meu canto apodrecido
As espinhas entre as heras
As verdades que tu geras
Onde resta dividido
Caminhar por entre as trevas
E se tanto ainda nevas
Renegando cada passo,
O meu mundo foi em vão
E se perco a direção,
Onde apenas me desfaço..

30804


Abandonado num canto
Quem se fez tão diferente,
O poder de cada mente,
Não se mostra em tal espanto
Se o planeta é desencanto,
O meu verso ainda tente
Novo dia, de repente,
Já não basta o velho canto,
Queda sendo enfim prevista
Do meu quarto só se avista
O final deste poema,
E se tanto ainda tento,
Onde outrora violento,
Contra a fúria não se rema...

30805


Acredito estar perdido
Tudo aquilo que se fez
Muito embora a estupidez
Já não faça mais sentido,
O meu corpo corroído
Minha pele se desfez
Tudo aquilo que não vês
Noutro instante é percebido,
E se quero alguma chance
Novamente ao nada lance
Minha voz em tom diverso,
Sendo ausente de mim mesmo,
Quando enfim eu me ensimesmo,
Vago e rondo outro universo...

30806

Renasceu em tanto espanto
O que outrora um colibri
Ao perder já não sorvi
Nem tampouco vejo o quanto,
O meu mundo é feito em pranto
Nele mesmo eu me perdi
E se tanto vi em ti
O que nunca houvera em canto
Pude ser diverso quando
Outro tanto se formando
Deste pouco que sou eu,
Cada fase representa
A visão mais violenta
Que de fato se bebeu...


30807


Numa noite, a madrugada
Entre fadas e condões
O que tanto ainda expões
Não traduz em vida nada,
Outra senda semeada
E se fossem soluções
As diversas direções
Traduzindo a mesma estrada
Aversão ao que se faz
E em verdade busco a paz,
Mas, mordaz não mais sossego
Se o caminho em tal delírio
Só recende ao vil martírio
Por que tanto em ti me apego?

30808


Sem luz de lua a brilhar
Sem saber se a sorte vem
Sem saber sequer de alguém
Sem saber do lupanar
Sem saber do que sonhar
Sem saber o que contém
Sem saber mais de ninguém
Sem saber nem mais contar,
Sem saber do verso em glória
Sem saber desta memória
Sem saber do que não sei,
Sem saber se sou ainda
Sem saber se já deslinda
Sem saber se existe lei...

30809


Sem vida, sem canto, o nada
Serenando em serenata
A saudade que maltrata
Renegando esta alvorada
Outra farsa desvendada
Outra noite tão ingrata
Outra morte se retrata
Nesta morte anunciada,
O vergão já tatuado,
Meu olhar que é desolado
Lado a lado com o vão,
Entranhei cada mentira
E deveras já se atira
Sem saber da direção...

30810

Nada pude festejar
Nem tampouco poderia
Se me falta uma alegria
Se não tenho nem luar
Onde posso em novo mar
Onde ausente maresia
Tempestade em teimosia
Não me canso de tentar,
Bebo o fim e deste vício
Já tentando o precipício
Sem ter nada o que me leve,
Outra vida desvendada
Noutra senha se enredada
Meu momento eu sei que é breve...

30811

Meu Pai afaste o tormento
Que se torna tão freqüente
Do meu canto já se ausente
Este tom puro lamento,
E se tanto me apresento
Por mais forte que se tente
O meu mundo de repente
Noutro rumo me aposento,
Fui vencido pelas trevas
Na saudade quando cevas
Em verdades mais diversas,
Ao princípio retornando
Onde fora mais nefando
Sonegando estas conversas...

30812


Não me deixe mais sonhar
Se meu verso sem valia
Ao entrar na fantasia
Não encontra um só lugar,
Poderia caminhar,
Mas não tendo quem me guia,
Este esboço em poesia
Poderia desvendar
Um caminho aonde a sorte
Pelo menos me conforte
E não trace só lamento,
Um restolho do que fora,
Alma turva e pecadora,
Simplesmente não agüento...

30813


Quero viver o momento
Mais feliz que se pudesse
Outro canto não mais tece
Sem vontade ou argumento,
Quando em fúria me atormento
E não tendo mais a prece
De quem sabe tanta messe
Desta vida em bom provento,
Numa ausência contumaz
O que fora outrora paz
Se tornou duro tornado,
Retornando ao que perdi
Encontrando aqui em ti,
Um desejo vislumbrado...

30814


Quero o brilho que redime
Quero a luz que ainda trace
Um caminho noutra face
Sem saber de dor e crime,
Onde tudo que se estime
Não se perca ou se esfumace
E se tanto amor não grasse
Pelo sonho a vida prime,
Onde pude ter a voz
Mais altiva, hoje feroz,
Nada resta só miséria,
O meu mundo em tal barranco
A raiz de mim arranco
Quis gigante e sou bactéria...

30815


Não permita o pesadelo
Nem tampouco a farsa lúbrica
Se esta vida fosse lúdica
Meu prazer jamais contê-lo,
Tanta fúria em pouco zelo,
Farsa torpe agora pública
Sonegando qualquer súplica
Perfazendo este novelo,
Onde incauto tive o infausto,
Mas sonego este holocausto
Falsos tons ditam promessas
E se tanto pude crer
Noutro raro amanhecer,
Teus engodos recomeças...

30816

Já não quero que retorne
A saudade de quem tanto
Trouxe medo e trouxe pranto
Minha vida já se amorne
E se enquanto assim contorne
O que fora só quebranto
Ao gerar um novo encanto
Tanto quanto possa entorne,
A lembrança dita a senda
Que meu coração atenda
Na vontade mais sutil,
Passarinho sem juízo,
O meu peito em prejuízo
Novo amor em ti já viu...

30817


Corte o fio do novelo
Sem velório a vida é boa,
A palavra quando ecoa,
Noutro tanto encanto sê-lo,
Mergulhando com desvelo
Onde tento uma canoa,
A saudade não revoa,
Nem tampouco em desmazelo.
Vou rendido sem defesa
Vou seguindo a correnteza
Sequioso coração
Nesta fonte se sacia,
E se teima em fantasia,
Novos cantos se farão...


30818



Não pode recomeçar
O que se sempre esteve errado
Tanta dor gerando enfado
Onde vejo a luz solar?
Se decerto ao te tocar
Novo tempo vislumbrado,
Mas o medo já traçado
Impedindo de sonhar,
Caminhante coração
Sem juízo e direção
Nada sabe e nada vê,
Minha vida se amortalha,
E perdendo esta batalha
Já não tenho mais por que...

30819


Estas aves que cevavam
Podridão, tanta carniça
Nesta vida movediça
Com certeza não cantavam
E decerto se embrenhavam
Com olhares de cobiça.
Onde a fúria sempre atiça
Sobre mim já mergulhavam,
Esboçando uma defesa,
Sendo a vida sobremesa
Nada resta deste tanto,
Hoje apenas semimorto,
Onde quis outrora porto,
Da mortalha faço o manto...

30820

Pelos tantos que morreram
Sem caminho ou solução
Sem saber da imensidão
E decerto percorreram
Onde tanto mereceram
Nesta vida algum clarão,
Mas no mundo sem perdão
Outras sortes conheceram,
Das feridas sempre abertas,
As palavras em que alertas
Ditam dias diferentes,
E se tanto quero a paz,
O meu canto então se faz
Neste sonho em que apascentes...

30821

Pelos corpos que lá fora
Decoraram cada rua
A verdade nua e crua
Com terror se comemora?
Morto em vida sei agora
O que tanto continua,
A mortalha ainda atua
Servidão se revigora
E o fantasma do passado
Assolando quem restara
Noite amarga e nunca clara,
Mundo novo, o mesmo gado,
Mesma espora e este ferrão,
Haverá mais solução?

30822

Apodrecem no quintal
Esperanças que eu tivera
A verdade dita a fera,
Outro instante e tudo igual,
O fantoche sensual,
O terror, velha quimera,
O meu corpo degenera,
Beija a ponta de um punhal,
Nada tendo, o que fazer?
Mergulhar no nada ser
E tentar outro caminho?
Mas se eu sigo e nada veio,
Tão somente este receio
De seguir sempre sozinho...


30823

Esquecidas nas favelas
Nos currais e nos cortiços
Onde os sonhos movediços
Tecem podres, turvas telas,
E se tanto já revelas
Os momentos em que os viços
Se mostrassem mais omissos
E tampouco nestas velas
Caminhando em turbulência
Onde resta uma inocência
Feita à bala, sangue e morte,
Esquecidas as meninas
Hordas podres e assassinas
Ditam sempre aqui o norte...

30824

Nas roças e nas cidades
Capitais, pequenas vilas,
Onde as mortes tu desfilas
Com terríveis mãos invades,
Ao gerar insanidades,
Ondas fortes, mesmas filas,
E se tanto ódio, destilas
Não pudessem claridades,
Sendo opaco o caminhar,
Senda tosca se aparenta,
E deveras violenta
Esta fúria já sem par,
Enlutado coração
Nossa luta foi em vão!

30825

Dos velórios carpideiras
Noites frias e sutis
Quando o mundo contradiz
Esperanças derradeiras
Entre tantas corredeiras
Procura ser feliz
Mas decerto por um triz
Novos rumos e bandeiras,
Morte tanto prometida
Feita assim a cada instante
Num cenário degradante
O que resta de uma vida?
Nada além deste vazio
Que hoje em versos vãos desfio...

30826

Ao sonhar com tantas luzes
Entre pedras, espinheiros
Regenero tais canteiros
Onde existem tantas urzes,
E se ao tanto me conduzes
Dos meus dias derradeiros,
Sonhos claros, verdadeiros
Maturando onde produzes
A esperança que tardia
Já não abandonaria
Lua cheia se polvilha
E derrama-se argentina
Onde o sonho se ilumina,
Soberana a bela trilha...

30827

Dos meus cantos, funerais
Entre velas e tormentas,
Onde ainda sonhas, tentas
Novos dias magistrais
Os meus cantos são jamais
E pudesse enquanto alentas
Descobrir porquanto argentas
Noites raras, triunfais,
Onde houvera outro matiz,
Céu em tom tristonho e gris
Azuleja-se esperança
Se inda houvesse esta benesse
Noutro tanto em que se tece
Sonho raro de criança...

30828

No teu nome traduzindo
Dores, pedras e esperança
Quando a voz ao nada lança
Canto imenso ou mesmo infindo,
Se a verdade não deslindo
A saudade sempre cansa
E se faço dela a lança
Penetrando já rescindo
O que outrora fora sonho
E hoje sei ser tão medonho,
Mas me atrai e me fascina,
Sendo assim dicotomia
Tanta dor, tanta magia,
Em ti vejo a minha sina..


30829


Ao brotar da terra o não
Onde fora grão, semente
Toda a dor que se apresente
Não permite a solução
Se em teu corpo há sedução
Outra fonte se aparente
E percorro mesmo ausente,
Onda imensa, e sem timão
Naufragando nos teus braços
Entre fúrias e procelas,
Tanto encanto que revelas
No clamor de teus abraços,
Ao render-me vão corsário,
Jamais volto solitário...

30830


Amanhece em crescimento
O que fora noite em dor,
Ao brotar decerto a flor,
Minha vida eu apascento,
Solto ao sol, imenso vento,
Penetrando em tal fulgor,
O meu canto dita amor,
E decerto o sofrimento...
Não se vê qualquer saída
Labirinto inesgotável
Este mundo que insondável
Perpetrando assim a vida
Noutra esfera, outra visão,
Desvendando uma paixão...

30831

No estio em que se fez a claridade
Do quanto pude até mesmo sonhar
E nada do que tento desvendar
Permite no final a liberdade,
O peso a cada dia mais degrade
Quem tenta no vazio caminhar,
E tanto que aprendera a cultivar
Aonde não houver fecundidade,
Seria temerário se eu pudesse
Ainda ter nas mãos o meu futuro,
E quando novo fato em vão procuro,
O corte recomeça e nega a messe,
Um fardo tanto quanto imperecível,
O encanto se desfaz, sendo implausível...


30832


Navios de papel, correntes várias
Barrancos, soltos olhos meninice
E tudo o quanto a vida contradisse
Em noites temerosas, temerárias,
Exilo-me nos sonhos, procelárias
As horas acordadas na mesmice,
O fato de volver não se omitisse
Na vida de quem teima em horas párias.
Escárnio é tudo aquilo que se vê
No pantanal imenso aonde vivo,
O sonho de ser leve e criativo
Morrendo a cada instante, ainda que
Houvesse nova chance, nada vem,
Somente esta incerteza, e sigo aquém...

30833


Enxames destroçando o meu trigal,
Diversos gafanhotos, rotos prados,
Os dias entre tantos desolados,
Aonde pode a crença terminal,
Risível caminheiro tão banal
Os pesos divididos maus bocados,
Os dentes pela vida careados
A força do vazio é desigual,
E sem esta lavoura que socorra,
Aonde talvez sonho ainda morra
Na dura inanição da poesia,
Ocasos pós acasos, caso venhas
Verás enquanto em trevas tu te embrenhas
O quanto inutilmente se porfia...

30834

As águas poluídas, lavras farsas
E quando não se vê mais outra foz,
O corte na raiz, duro e feroz,
Enquanto cada verso em vão, esgarças
Assim ao não mais ver cisnes e garças
Apenas a brumosa e tensa voz,
O mundo de si próprio, ledo algoz
As horas de alegria são esparsas,
E passo a cada falso outro percalço
E quando da ilusão ainda calço
Meus dias com ternura, mero engano.
O modo mais sutil de ser feliz,
Enquanto a realidade nada quis
Urdida em cada verso, parco plano...

30835


Decerto deveria calcinar
O velho peito exposto ao frio e ao vento,
Mas quando tão somente o sofrimento
Adentra e toma todo este lugar,
Aonde se fizesse devagar
O desespero toma o pensamento
E quando vez por outra ainda tento
A fuga eu não consigo me encontrar,
Arrisco qualquer salto, novo bote,
Aonde quis galope vou à trote
E cismo entre os moinhos e gigantes,
Pudera ter nas mãos um novo sol,
Quem sabe a vida em paz neste arrebol,
Invés destes cenários degradantes...

30836

Descubro entre as fornalhas de minha alma
Momento aonde feito em instantâneo
Um dia de outro não contemporâneo
Vivera com ternura e até com calma,
Ainda se lembrar, o quanto acalma
E mesmo se mostrasse momentâneo
O quadro que pintara no meu crânio
Faculta ter ou não resíduo e trauma.
Mas nada se compara ao que pudesse
Se eu fosse mais feliz, louvável messe
Da qual não compartilho nem podia,
Pereço qual retrato amarelado
Vivendo deste instante do passado,
Rendido à mais completa nostalgia...


30837


Portal de um velho túnel rumo ao nada,
Trancafiado há tempos dentro em mim,
E sendo o meu caminho já sem fim,
Ainda não se vê qualquer lufada
Do vento que pudesse em voz alçada
Vencer as tempestades, mas assim
Do todo que pensara resta o gim,
E nele uma alma tosca e embriagada,
Ourives da palavra, nada resta
Senão esta verdade à qual se empresta
O sonho de mortalha feito em dor,
E nada do que adentre a poesia
Renasce ou mesmo em paz já me traria,
Pudesse ter um verso redentor...


30838

O mundo dissemina tal fragrância
Aonde poderia ser suave,
E tendo a cada engodo mais que agrave
Criando esta terrível discrepância,
Não tento navegar com elegância
Cansado de tentar na mesma nave
Um dia que não seja novo entrave
Nem mesmo que o vazio uma alma alcance-a
Carcomido fantoche, a serventia
De quem tentara senda mais diversa,
E terminando assim qualquer conversa
O quanto renovável fonte espia
Na pútrida faceta desolada,
A velha e insofismável tosca estrada...


30839

Tua boca ao abrasar a minha pele
Na fúria entre dois corpos que se buscam,
Enquanto novas tramam não ofuscam
O quanto se deseja e já se sele,
No pensamento ao qual a vida atrele
As ansiosas noites luscofuscam
E tento desvendar quando chamuscam
O peito de quem sonho em vão repele.
Apraz-me por somente ter sabido
Do pantanal extenso onde a libido
Eclode com tal fúria e não permite
Arfante madrugada encerra em luzes
E mesmo que de orgasmos sempre abuses
Não vejo nesta entrega algum limite...

30840


Olhos soturnos buscam soluções
E entranho cada senda aonde eu possa,
Revigorando o quanto fora fossa
E agora noutra cena tu me expões,
Dos corpos em nudez, exposições
Vontade incomparável ora endossa
Aórtico latejo, desde a crossa
Causando em pleno amor, inundações.
Aonde no passado mera alfândega
Dos sonhos um cenário se difere
E quando ainda o gozo cedo impere,
A noite se mostrando imensa e pândega
Na adega da esperança me embebedo
E vivo sem limites nosso enredo.

30841

Do milagre feito em pães
A certeza se reflete
Neste quanto me compete
Relembrando então das mães
Entre víboras, mil cães
Outro mundo me arremete
Ao que tanto foi confete
Rosa como em Guimarães
Sem espinhos, tal fragrância
Em superna tolerância
Trazem paz invés de fúria,
Quando ouvirem suas vozes,
Estes vândalos algozes,
Não terão jamais a incúria...

30842


Navego entre diversas tempestades
E sei quanto é possível um naufrágio
A vida cobra e caro, juros, ágio
E tanto quanto a vida me degrades,
Não pude conceber tranqüilidades
Tampouco desvendar ledo sufrágio
Aonde se mostrara em tolo adágio
Caminhos para as tais felicidades.
Mesquinharia segue à flor da pele,
E tanto quanto atrai e me repele
Um vicioso círculo se faz,
E tento desvendar esta vereda
Porquanto uma ilusão já se conceda
Quem sabe no final encontre a paz?


30843

Capturas albatrozes em teu sonho
E reinas absoluto sobre os mares,
Corsário ao traçar podres altares
Mostrando este perfil atroz, medonho,
Enquanto pouco a pouco decomponho
O mundo que em verdade encontrares
Depois das tempestades tão vulgares,
Esgoto se aproxima do que sonho.
Ao passo em que se mostre tal cenário
Demônios passeando entre as estrelas
E quando pude em tédio percebê-las
O mundo se mostrara em tom contrário,
Mas eis que se aproxima em tal elipse
Raríssimo fulgor: o apocalipse...

30844

Deslizo entre os abismos que eu herdei
E tento desvendar seus arcos, cores
Ainda que não restem mais albores,
Grisalhas esperanças encontrei,
Não posso confirmar a regra e a lei
E nela se percebem os açores
Percorro com temor as minhas dores,
E tanto quanto pude me entranhei,
Nefasta realidade se mostrasse
E tanto poderia noutra face
A mesma desbotada pelo tempo.
Residualmente ainda existe aqui
Um pouco do que tanto já perdi,
A cada vil tropeço e contratempo...


30845


Acima destes vales, cordilheiras
Bebendo deste céu em chuvas feito,
E quando em tais montanhas me deleito
Diversas cordoalhas são bandeiras
E tanto poderiam lisonjeiras
Fazerem do meu sonho, cama e leito,
Um pândego caminho sendo aceito
As mortes são decerto costumeiras,
Não pude e nem talvez mesmo inda possa,
Cegar esta verdade sendo nossa
A fossa que se abriu sob meus pés,
Arranco os olhos, mato este horizonte,
Bem antes que a tormenta venha e aponte
Os dedos preparando outras galés...


30846

Por sobre estas montanhas cena etérea
Em nuvens tão diáfanas paisagens
Mutáveis como fossem de Deus gens
Dominam emoção clara e sidérea;
Vislumbro vozes várias, versos vãos
Enfrento o meu espectro face a face
Ainda que em tamanha insânia grasse
Certeza de florada doma os grãos.
Não quero um mundo opaco e assim sintético,
Nem mesmo em cena torpe, vago plástico,
Caminho que percorro mesmo drástico
Talvez permita um sonho mais eclético,
Poético torpor, raro espetáculo,
Sentindo do Senhor, cada tentáculo...


30847


Esferas constelares, luas, sóis,
Em ênfase diversa um verso eu tento
E quando me extasio sigo atento,
Na florescência rara em arrebóis,
Aonde houvera ainda estes atóis
Um arquipélago enorme invento
E sendo favorável este vento,
Meus olhos de teus olhos girassóis...
Apático caminho não mais quero,
E tento ser por certo ora sincero
Ardências dominando a poesia,
Falésias ou escarpas nunca mais,
Primaveris anseios em florais
Encanto atemporal o sonho cria...

30848


Um mórbido cenário dita a senda
Aonde se pudesse ter em mente
O quanto novo rumo se pressente
No todo que talvez jamais se atenda,
Por quanto nos meus olhos mesma venda,
E dela não se vê completamente
À parte do que tanto se apresente
O corte não desmente a dura lenda,
Por terem os demônios conquistado
O que se imagina indestrutível
Um templo aos poucos sendo destroçado
Erguido pelo sangue dos pequenos,
Assim a humanidade perecível
Transfunde em si decerto tais venenos...

30849


Perfumes variados, podres rumos
E neles os vencidos poderão
Olhar com tal firmeza esta amplidão
Bebendo deste sangue, raros sumos,
E quando da esperança sem insumos
Fazemos nosso prumo e direção
O pendular caminho: ingratidão
Aonde as ilusões são meros fumos.
Resistem às tempestas? Nada disto,
Apenas ao tentar enquanto insisto
Resumo num vazio a imensidade,
E quando me entregara sem defesa
Seguindo com temor tal correnteza
Mortalha que teceste já me agrade...


30850


Assim ao infinito me proponho
E quando nada vem, quedo silente
Do quanto de mim mesmo sigo ausente
Redunda na expressão de um tolo sonho,
Assisto ao meu final, claro e tristonho,
Ainda que pudesse resistente
No fundo sou deveras paciente,
E tento novamente, mas quando oponho
Um passo contra a fúria de quem tanto
Vencera com terror guerra e quebranto
O encanto de fazer qualquer poema,
Ainda não liberto em plenitude,
Não posso caminhar onde se mude
Somente a velha chave, mesma algema...


30851


Lembrando do que tanto em mim se esconderia
Não fosse a vida assim amarga e dolorida
Restando ao sonhador um pouco do que a vida
Não deixa que se veja e nega a fantasia,
Resisto ao caminhar e tanto se traria
Notícias do passado em senda já perdida,
Medalha no meu peito, a cena destruída
O corte se infecciona e gera a sepsemia.
Metade do que sou ainda não conheço,
E tanto poderia ausente este endereço
Viver do quanto fui e nada mais além
O parto é doloroso, a morte me redime,
E quando vejo o fim, e nele acena o crime
Somente a ingratidão, ainda é o que contém...


30852


Um verso alexandrino um canto temerário
O vento no meu rosto exposto aos temporais
E quando desejei e soube o nunca mais,
O próprio pensamento agora um adversário,
Seria bem melhor se o sonho este corsário
Bebesse cruelmente e tanto me sangrais
Que em vós a voz se molda em atos sensuais
Dos fatos mais comuns, o mal é necessário.
Resido no vazio e tento após o nada
Um canto mais audaz, porém desafinada
Uma alma se destoa e voa aonde pude
Deixar a liberdade e crer nesta corrente
Porquanto ainda existo e o nada se apresente
Ausente deste olhar, a morta juventude...


30853

Englobo Satanás e sigo em voz sombria
Bebendo todo o esgoto e dele me sacio,
Aonde poderia haver um novo rio,
A sorte se amealha e mata a fantasia,
Resumo o verso em não e tanto outro queria,
Mas tarda a solução e quando sou vazio
O resto do que fui, em tons vãos desafio
Repica dentro em mim, a fúria em melodia.
Caprichos de um poeta? Audaz ou sonhador?
Não tendo mais caminho ascendo ao vil torpor
E tento ainda um passo ao menos mais sutil,
O vândalo sonhar, o pasto em relvas feito,
O manto da esperança há tanto já desfeito
E o charco que eu carrego, a vida enfim previu...


30854


Eu já não tenho a sorte
De ser clarividente
E tudo o que pressente
Deveras tendo aporte
Negando novo norte
Mergulho imprevidente
E quando já se ausente
Assim prevejo o corte,
Resumo em poucas frases
O quanto ainda trazes
E nada não trarias
Não fossem as paixões
Imensas dimensões
De raras pedrarias...

30855


Eu tanto procuro
Caminho sutil
Amor não previu
Um sonho que escuro
Deveras torturo
E quando partiu
O peso sentiu
Que tanto amarguro
Negando o caminho
Seguindo sozinho
Mortalhas refaço,
No verso que tento
Entrego-me ao vento,
E perco o meu passo...

30856


Encanto se faz
No quanto se pode
O verso me acode
Se a vida é mordaz,
E tanto se a paz
Na dor que me açode
Se num canto uma ode
Viver satisfaz
Eu tento e teimoso
Concebo outro gozo
E risco meu nome
Do mapa dos sonhos
Vadios, bisonhos,
Não tem quem me dome!

30857

Pudesse
Luar
Falar
Da messe
Da prece
Do mar
Cantar
Merece
Quem tenta
Alenta
O vento
Que diz
Feliz
Momento...

30858

Não chores se tudo
Não passa de nada
A sorte vedada
No mundo me iludo
E quando miúdo
O sonho degrada
A messe alcançada
E tanto transmudo
Meu verso se cala
Adentrando a sala
Busco o cobertor
O frio gerindo
O tempo que infindo
Matando o rancor.


30859

Jamais poderia
Falar de outro verso
Não fosse disperso
Mundo que se cria
E nele a alegria
Se eu tento ou imerso
Meu canto disperso
Não mais se faria
A grade calando
O que fora brando
Agora se torna
Divirjo de mim
Aonde jardim,
A sorte tão morna...

30860


Se meu verso
Te falasse
Deste impasse
Mais perverso
Desconverso,
Mas não trace
Nem desgrace
O universo.
Sendo assim
Chego ao fim
E nada vejo,
Nem semente
Nem somente
Meu desejo...

30861

Entre tanto pandemônio
O que vejo na verdade
Dando pena do demônio
Nesta tanta iniqüidade...
Venço o medo, e o patrimônio
Com terror já se degrade
No que pode algum campônio
Contra a imensa falsidade
Que se vê no dia a dia
Cada fato não adia
O que tanto pode ser
Mais diverso do que fora,
Mas uma alma sonhadora
Inda teima com prazer.

30862


O cenário se diverge
Quando nada em vão perdura
Quando busco uma ternura
O meu mundo em ti converge
Se este sonho agora emerge
Noite outrora bem escura
Clareando com brandura
Nesta lua o bem imerge,
Frente a frente face a face
Cada passo que se trace
Diz do fim desta viagem,
Não percorro mais vazios,
Entre sendas, meus estios
Vão dourando tal paisagem...

30863


Carcomido coração
Já cansado de lutar
Não podendo mais pensar
Em fatal ingratidão
Outro verso, outra versão
E se tanto procurar
Onde encontre algum lugar
Que jamais tenha a aversão
Do poeta em verso nobre,
Quando a rima enfim descobre
Se transforma, sorridente,
Inda tento sem reservas
As palavras não são servas,
Eu que sou mero indigente...

30864


Sem
Dom
Com
Bem
Vem
Som
Tom
Tem
Vida
Lida
Resta
Tanto
Canto
Festa!

30865

Não pude
Nem quero
Sincero?
Saúde

Se rude
Espero.
Venero?
Pois, mude.

Vencer
Poder?
Jamais

Aonde
Esconde
Meu cais?



30866

Ao procurar qualquer tônico
Encontrei o mesmo pânico,
E deveras se mecânico
O meu canto é quase afônico
E se um dia fui agônico
Noutro instante quase orgânico
Um mergulho que oceânico
Gera um fato desarmônico.
Se em verdade sou etílico
Com prazeres vou edênico
Este rito sendo cênico
Poderia ser idílico,
Mas jamais serei colérico
Nem tampouco sou homérico...

30867


Cadafalso se prepara
Cada falso com seu guia
Cada espaço poesia
Cada qual com sua cara
Catavento em noite clara
Cata folhas, traça o dia,
Catarina se prepara
Catapulta não adia,
Cara a cara com o sol,
Cara a cara caracol,
Canto a canto, risco tanto,
Canto encanto e tento abismo
Catarata ou cataclismo
Quanto devo? Não sei quanto...

30868


Quando a vida não mais finge
Nem permite outra saída,
A resposta manda esfinge
Senão sorte está perdida...
Quando o coração se tinge
De outra cor já mais surtida
Nada mais ainda atinge
Quem se deu em própria vida
E não posso ser diverso
Do que tanto prometia
O meu mundo se é perverso,
Nele tenho a garantia
Do que dita cada verso,
Seja dor, seja alegria...


30869

Não querendo repetir
Os meus erros costumeiros,
Não cevara meus canteiros
Ao pensar noutro porvir,
E deveras ao pedir
Mais conselhos, corriqueiros,
Onde fomos jardineiros,
Esperança sempre a vir
Vou bebendo desta fonte
E sabendo desta lua
Que decerto desce nua
E desponta no horizonte,
Revelando a claridade
Que por certo em paz invade...

30870


No caminho para o nada
Não encontro mais quem dera
A saudade viva fera
Adentrando cada estrada
Vejo sempre atocaiada
Dente, garra esta pantera
Quando assim ferida espera
Minha sorte desolada,
Venço o medo e até mergulho
Enfrentando o pedregulho
Coração embora sujo
Neste mar quando se salga
Ao saber de uma onda, da alga,
Entranhando um caramujo...

30871

Devorando sentimentos
Olhos, bocas, dentes, pernas
Sendo as noites sempre ternas
Onde encontro os meus alentos
Não importa quantos ventos
As vontades sendo eternas
No meu peito quando internas
O desejo é meu intento
Tanto quanto poderia
Desfraldando a fantasia
Entregar-me sem defesa,
Do que outrora se fez luz,
Hoje a festa reproduz,
E eu seguindo a correnteza...

30872


Tanta luz tanta beleza
Emoção tomando a cena
A saudade quando acena
Vem trazendo esta incerteza
Quando vejo a sobremesa
Feita amor, peito serena
Mas decerto se envenena
Com searas da tristeza,
Sendo assim, belo horizonte
Quando sol ao longe aponte
Traduzindo a maravilha
Deste encanto a cada olhar,
Como é bom poder sonhar,
Percorrendo a bela trilha...

30873

Ao pensar nestes canteiros
Eu me lembro de Cecília
Os meus sonhos jardineiros
Cultivando dália e tília
A saudade em derradeiros
Caminhares, diz mobília
Do passado entre os viveiros
Coração dita a vigília
E encontrando tais belezas
Entre flores, framboesas
Motivando a poesia,
Ao lembrar-me de você
Meu amor tendo um por que
Toda noite se recria...

30874

Por não saber falar com mansidão
Às vezes eu me perco e quando ocorre,
Nem mesmo a lucidez vem e socorre
E segue sem destino a embarcação.
Aprendendo a dizer com calma, o não,
Ainda que deveras seja um porre
Enquanto em fluidez já não escorre
O mundo em que buscava uma atenção.
Vivendo desta forma eu me maltrato,
E não me perfilando em qualquer trato,
Enfrento os meus demônios diariamente,
Pudesse ser diverso e ser capaz
De discernir aonde há guerra ou paz,
Mas não conseguirei, por mais que eu tente...

30875

Usando da palavra em virulência
Por vezes eu me perco tolamente
E quando este não ser já se apresente
A vida se mostrando em violência,
Pudesse ter enfim clarividência,
E nada guardaria em dor na mente,
Perdão aliviando traz freqüente
Caminho rumo à paz e à paciência...
Assim ao ser errôneo vejo o quanto
Preparo para mim o desencanto
E sigo sem sequer ter calmaria,
O tempo não me ensina e sigo só,
Aonde mais suave, imenso nó,
Que a cada novo engodo se recria.

30876


O tempo na verdade, uma bandeira
Que aprendo a desvendar em seus sinais,
Momentos tantas vezes magistrais
Escondem uma dor tão traiçoeira.
E assim mesmo que tanto inda não queira
Enquanto em vossos dias derramais
Delírios entre fúrias desiguais
Colhendo no final em torpe feira
Os frutos que decerto apodrecidos
Não servem para serem consumidos,
Apenas disseminam mais tormento,
E quanto mais deveras repudio
Completo desengano, um desafio,
Que a cada novo dia eu alimento...




30877

Desfraldo a cada passo outro momento
Aonde poderia acreditar
Num tão diverso mundo e procurar
Do quanto que não fui, mero excremento,
E quando em versos tento ou mais lamento
Na ausência de algum rumo, devagar
Não posso neste espelho me encontrar
No foco ainda vejo em tosco aumento
A face denegrida de quem busca
A sorte mesmo quando a vida é brusca
E teima contra a força destes rios,
Os dias em que tanto me encontrara
Agora se transmudam, nada ampara,
E enfrento assim os mesmos desafios...


30878


O coração de quem procura a paz
Diversa do que sempre se aparenta
Porquanto a vida mostra a violenta
Temível face atroz, torpe e mordaz.
E quando o sonho envolve e enfim nos traz
A luz; deixamos tudo e se alma tenta
Em nova face e mesmo se apresenta
Do quanto se queria tanto atrás
O vento dissimula outro caminho
E sigo em traiçoeiros passos tortos,
Sabendo a cada dia mais sozinho,
Aonde poderia ter encantos,
Os sonhos vão decerto agora mortos,
Inúteis, pois assim todos os cantos...

30879


Ao ter a concepção da piedade
Que tanto poderia em consciência
Do vago que ora sou dando ciência
E neste instante a imensa claridade
Trazendo ao caminheiro a liberdade
Gerida pela vida onde a clemência
Exponha a sobeja convivência
E nela todo bem que ao Pai agrade,
Assim teria em mim solucionado
Mistério e tendo a luz deste legado,
O mundo então teria enfim sentido,
Mas quando me percebo solitário
Aonde poderia solidário,
Apenas um fantasma, um desvalido...

30880


Sentindo ser possível caridade
Aonde nada havia, só tempestas
Enquanto em dores tantas; vida gestas
Terias outro rumo aonde a grade
Rompida com amor e liberdade,
Em cenas verdadeiras e modestas
As horas doloridas e molestas,
Porquanto a própria vida em si degrade,
Já não teriam sempre a face escusa,
E quem dos tais rancores usa e abusa
Não tendo no final claro horizonte,
Por mais que busque a luz já nada vendo,
O mundo em tais terrores se envolvendo
Secando da esperança qualquer fonte...

30881

O eterno desengano traça a vida
De quem longe de Deus procura a luz
E quando ao mais perverso rumo abduz
Quem teve este visão tão distorcida
Não sabe quanto a dor trama a ferida
E nela cada dia eu vejo o pus
E quanto aos tantos nãos sempre propus
Estrada iluminada, uma avenida,
Embora tão comuns os pedregulhos
Gerados pelas ânsias dos orgulhos
E neles a vaidade soberana,
Assim quem tenta escusa caminhada,
Ao ver depois do gozo o mesmo nada
A cada novo instante mais se engana.

30882

Ao penetrar em dor neste oceano
Aonde poderia ser diverso
E tanto neste ocaso sigo imerso
E bebo o tão temível, ledo, engano.
Condeno-me em sofrível tosco plano
E embora seja forte e firme o verso,
O mundo sem Jesus quanto é perverso
Perdendo o que talvez restasse humano.
E sendo assim da vida um sonhador
Gerido pela sorte em paz e amor,
Não posso me calar frente ao que eu vejo,
A cada novo passo a sordidez
E nela esta tormenta que já vês
Gerada pela insânia do desejo...

30883

Rolando pelos céus na imensidade
A fonte mais sublime, salvação,
E nela com certeza a direção
Que rompa alguma algema, torpe grade,
E quando a solução decerto invade
Aquele feito em luz, amor, perdão,
Percebe a mais divina provisão
E tendo esta ternura em claridade,
Não vejo outro momento mais feliz,
E quando novo rumo impuro eu quis,
A incúria dominando cada passo,
Apenas turbulência e nada mais,
Invés destes momentos supernais
No engano tão somente o inverno eu traço...

30884

A salvação traduz suavidade
Na vida de quem tenta ver o Cristo
E sei que se em verdade ainda insisto
No tema ao perceber a iniqüidade
Que a cada novo dia mais degrade
E tanto poderia, mas resisto.
Razão aonde em glória e paz existo
Traçando a cada encanto a liberdade,
Não vejo a solução em mera igreja
Nem mesmo este caminho agora seja
Somente feito em gozos no futuro,
O templo onde por certo eu quero e canto
E feito neste espírito tão santo
Vencendo um tempo amargo atroz e escuro...

30885

Percebo quão possível ter o afeto
Que possa enfim em vida redimir
E nesta paz traçando um bom porvir
O rumo para o Pai, o predileto,
Assim se em tal ternura me completo
Descubro a panacéia este elixir
Que possa com certeza permitir
Momento feito em glória o mais completo,
Reside dentro em nós esta certeza
Que possa nos trazer quando em destreza
Seara desejada por quem sabe
O quanto é necessário ter a fé
E sendo libertário e sem galé
Imensidão de um mundo que nos cabe.

30886

Quem sabe ter do amor o mais profundo
Caminho aonde possa ter o sonho
E dele outro momento onde risonho
Em glória mais sobeja assim me inundo,
E tendo esta certeza ganho o mundo
E quando outro caminho em paz componho,
O rumo desvendado antes medonho
Agora com ternura eu me aprofundo,
Vivendo este momento mavioso
Sabendo quanto o Pai é majestoso
Decifro a imensidão deste universo
Gerado por quem tanto nos amando,
Permite um novo tempo bem mais brando
Aonde em luz eu possa estar imerso.


30887

Já não conseguirei fechar-me ao quanto
Em plena treva traça-se este nada
Aonde a sorte eu vejo desolada
O mundo se transcorre em vil quebranto,
E quando se apodrece assim o manto
E dele mais distante uma alvorada,
O peso desta vida destroçada
Negando o mais divino e bom encanto,
Carcaça da ilusão sem fantasia
Seara abençoada destruía
Quem tanto sem juízo se fez vago,
O amor que nos permita caminhar
Traçando em claridade o sacro altar
Em cuja mansidão no amor me alago...

30888

Não quero em vida amargo trilho
Tampouco posso crer nesta ilusão
Tornando em desalento e negação
Um mundo em que decerto maravilho,
Ao caminhar pacífico em tal brilho
Momentos mais tranqüilos se verão
E tanto poderia esta amplidão
Vencendo em calmaria este empecilho,
Assim ao me entregar sem ter limite
Ao grande amor no qual já se acredite
Transido em plenitude, imensa glória
Assim aos e mostrar em clara luz
O amor que em tal candura nos conduz
Gerando a cada dia uma vitória...


30889

Caminho aonde flores mais estranhas
Expelem seus perfumes tão diversos
Gerando nova fonte em universos
Dos quais momentos vários tu entranhas

E quando vales surgem em montanhas
E nelas outros tantos vão imersos
Enquanto prados turvos em dispersos
Tormentos modificam velhas sanhas,

E tendo estas visões em turbulência
Pudesse ter ao menos a inocência
Das rosas que em espinhos pensam formas

Que possam protegê-las, ledo engano...
Assim também ao ver mundo profano
Realidade amarga tu deformas...

30890

Ao buscar novo caminho
Onde possa o meu canteiro
Semear com verdadeiro
Sonho feito em tal carinho
Onde outrora fui sozinho,
Tendo amor por companheiro
Deste encanto, o mensageiro,
Mergulhando nesta senda
Tanto sonho que se atenda
Desvendando esta emoção
Onde amar seja comum,
E eu que seja só mais um
Entre tantos que virão...

30891


Tanto amor existe em quem
Ao saber desta verdade
Feita em luz e liberdade
Que somente Deus contém,
O meu verso sabe bem
Deste encanto que me invade
Enfrentando a tempestade,
Que decerto sempre vem,
Nada encontro senão paz
Onde amor em perdão traz
Rumo aberto, céu imenso
E em tal prado iridescente
Farta glória se apresente
Desde quando amor eu penso...


30892


Das searas da paixão
Que eu conheço a cada dia
Onde outrora calmaria
Vejo agora este tufão
E perdendo a direção
O meu barco não sabia
Deste cais, luz e agonia
Onde os sonhos mostrarão
A diversidade aonde
Outro rumo já se esconde
E transcende à própria vida,
Deste amor feito em verdade,
Nova senda que se agrade
Com a glória em Deus urdida...


30893

Das roseiras, dos jardins,
Feitos luzes e perfumes,
Tanto bem que te acostumes
E deveras sendo os fins
Em que os meios são afins
Mergulhando em tais costumes,
Encontrando enfim os lumes
Entre arcanjos, querubins
Este mundo em tanta glória
Onde a sorte se aproxima,
Neste amor que nos redima,
Cada verso se abençoa
Sendo o amor a senda boa
Que nos trague uma vitória...


30894

Meditando sobre o encanto
De um momento mais feliz
Quanta vez se contradiz
Este mundo em que me espanto
Poderia em manso canto
Coração mero aprendiz,
Mas se o mundo não me quis,
Onde escondo o claro manto?
Jogo assim esta toalha
E se tanto se atrapalha
O caminho de quem luta,
Não mergulho no vazio,
Com meu verso eu desafio,
Força espúria, opaca e bruta...

30895


Navegando contra a fúria
Do oceano em tal procela,
Quando a sorte dita a cela
A verdade gera a incúria,
Não permito em mim lamúria
Quando a dor assim se sela
A certeza se revela,
Mas não vejo amor que cure-a.
Sendo assim, navego em rondas
E se tantos mundos sondas
Na procura de respostas
As feridas do passado,
Tempo amargo e delicado
Cada dia mais expostas...


30896

Seduzido pela sorte
Mesmo ingrata e traiçoeira
Ao fazer do amor bandeira
Tendo a paz que me conforte,
Encontrando enfim suporte
Onde a vida assim me queira,
E porquanto em verdadeira
Luz traçando agora o norte,
Amortalha-se em terror
O terrível desamor
E se vê com claridade
Esta lua sobre nós
E se outrora foi atroz,
Hoje a paz imensa invade.

30897


Peço tanto por quem tenta
Ao vencer os temporais
Encontrar os magistrais
Portos onde a vã tormenta
Com ternura se apascenta
E demonstra os seus cristais,
Horas raras divinais,
Onde Deus já se apresenta,
Pude ver com tal clareza
Deste encanto esta beleza
Que transforma uma seara
Onde tanto concebera
Solitária e dura fera,
Onde a dor se semeara...


30898

Não podia e não consigo
Perceber a faca aonde
O terror não se responde
E transforma algum amigo,
Vejo apenas o perigo
E deveras nele esconde
Tanta dor, amargo fronde
Gera o imenso desabrigo,
Desafeto e desamor,
Onde pude me propor
Noutra sorte, rara e bela,
Mas ao ver farta tristeza,
Sigo contra a correnteza
Quando Deus já se revela...

30899

Cada vez quando procuro
Caminhar com mais amena
Sensação que me serena
Mesmo quando vejo escuro
Céu aonde a dor perduro
E somente me envenena,
Alma quando se apequena,
Torna o chão escuso e duro.
Navegar contra a corrente
E tentar que se apresente
Novo encanto mais diverso,
Sendo assim um sonhador
Nas entranhas de um amor,
Sigo em paz e em Deus imerso.


30900


Se eu pudesse adivinhar
Os caminhos onde agora
Outra fera já se ancora
Pronta e mesmo a atocaiar
Desvendando tal lugar,
Dos demônios, indo embora,
Coração em paz se aflora
Flora rara a festejar,
A beleza cristalina
Onde a dor não mais domina,
Ensinando o dia a dia,
Ao tornar-me mais presente
Vejo o quanto me apascente
Soberana poesia...

30901


Não me esquivo da verdade
E tampouco poderia
Esconder a tez sombria
Que por certo desagrade
E rompendo algema e grade
Luto contra esta heresia
Ao sonhar com novo dia
Feito em paz e liberdade,
Nada impede que este sonho
Seja vero, e se eu proponho
Com intento mais tenaz
Após tanto temporal,
Num momento triunfal
Eu terei enfim a paz...

30902


Pude ver após a chuva
A mortalha do que eu fora
Entre a imagem sofredora,
Alma torpe de viúva,
Emoção como uma luva
Encaixando tentadora,
Não permite predadora
Dos meus sonhos, tal saúva.
Carpideiras ilusões,
Onde as feras tu me expões
Denegrindo o que pudera
Ter momento mais suave,
Quando a dor, terror agrave
Despertando em mim a fera...

30903

Lastimando cada engano
Procurando novo rumo,
Da esperança todo o sumo,
Na verdade soberano
Caminhar de um ser humano
Quando o amor em Deus assumo,
Num soneto então resumo,
Tanta glória em raro plano,
Sendo assim um servo Vosso
Novo mundo em paz endosso
E percebo em Vossas mãos
O poder feito em ternura,
Divina semeadura:
Sei que Tendes claros grãos...

30904

Vez em quando em apetece
Procurar outro caminho
E se tanto fui sozinho,
Deste sonho uma benesse
Como fosse imensa prece
E decerto eu já me aninho
Nas entranhas do carinho,
Coração um sonho tece.
Onde possa ter certeza
Da divina correnteza
Que me leve à paz eterna,
Solidão quando demais
Mais distante vejo o cais,
Sendo amor nossa lanterna...

30905

Não mais quero uma promessa
Nem tampouco a sensação
Deste mundo aonde em vão
Cada passo recomeça
E se tanto se endereça
Sorte em podre direção,
Não suporto este senão
Peço à dor que então me esqueça.
Resolvido caminheiro
Enfrentando um espinheiro
Nunca em vida retrocede,
Nem o medo mais atroz
Nem terrível dura voz,
Nada mesmo enfim o impede...

30906

Pantanais que conheci
Charcos tantos, vida inglória
Onde a senda da vanglória
Traz diverso rumo aqui,
Enfrentando o que senti,
Ao amar nova vitória
Reformula toda a história
Novo rumo eu descobri
Nos teus braços minha amiga
Minha amante e companheira
Esta luz, a verdadeira
Que em teu sonho já se abriga
Adentrando devagar
Faz do coração, altar.

30907


Carpideira sorte dita
Quem não vê sequer a luz
E se em pranto se conduz,
A seara é tão maldita,
Resoluta uma alma agita
E se em glória se produz,
Respeitando cada cruz,
Não se perde, mesmo aflita,
Rescendendo à rara flor
Semeando então amor
Poderás colher decerto
Tanta paz em tua vida,
Até quando alguém te agrida,
Num amor, o rumo certo...


30908

Ao cerzir esta esperança
Encontrei a mansidão,
Novos dias mostrarão
Onde a paz no amor alcança
Dominando esta lembrança
Onde amarga uma lição,
Vejo enfim a redenção
Bem diversa de uma lança
Guerrilheira sorte em Deus
Transbordando imensidade
Grita em plena liberdade
Ao matar terrores meus,
Eu percebo o Pai amigo
E em Seus braços eu me abrigo...

30909

Coração se reverdece
Pós as noites mais terríveis
Os meus sonhos corruptíveis
Tempestades, fúria e prece,
Quando assim já se obedece
O terror em outros níveis
Nossos dias mais sofríveis
Esperança não se tece,
Na fornalha do vazio,
Onde em tom turvo e sombrio
O não ser tomando forma,
Mas se eu tenho a luz em mim,
Vencerei a dor no fim,
Pois somente o amor transforma..


30910

O quanto poderia em raros louros
Tentar a liberdade onde algema
Por certo quantas vezes a alma tema
Abortos feito em duros nascedouros,
O amor um bem maior destes tesouros
A glória sendo assim suprema gema
Polida esta esperança gera o lema
E dele nossos bons ancoradouros,
Mortalha do passado se devassa
E tanto quanto pode me entretém
O amor das alegrias muito além
Vencendo qualquer dor, temor, desgraça
Gestando a luz aonde vejo a sorte
Que tanto nos acolha e nos conforte...

30911

“Ser mãe é padecer no Paraíso...”
Não tenho qualquer dúvida se vejo
Acima do seu próprio e bom desejo,
O quanto tanto amor toma o juízo,
Jamais se vê na mãe um impreciso
Caminho nem sequer turvo lampejo,
E tendo sempre ausente fúria e pejo,
Por mais que se mostrasse em prejuízo,
A senda à divindade se aproxima,
Maior do que decerto uma auto-estima
O amor materno gera a imensidão,
Vencendo com pacífica beleza
A inglória e tão temível correnteza
Ao Pai melhor caminho e direção...

30912

Ensangüentado rumo em dor e medo,
Arcando com terrores dia a dia,
E nele todo o mundo se faria
Diverso do que vejo agora ledo,
E quando novo tempo a mim concedo,
Deixando para trás uma heresia
Na luz se perfilando esta alegria,
Gestando com ternura belo enredo
No qual ao me encontrar logo deduzo
Que amor ao se mostrar mesmo confuso
Gerando novo ser que é bem melhor.
Marcado em cicatrizes outro tempo
E nele se percebe o contratempo,
Vencendo vejo encanto em tom maior.

30913

Ainda existe em mim a sombra amarga
De um dia sem ternura e em dores feito,
O amor quando se faz assim aceito,
A voz com emoção sobeja embarga,
E tendo esta impressão vivendo à larga
Eu posso ter meu sonho satisfeito,
E quando neste porto, o meu direito
Demonstro aliviando peso e carga,
A vida se encarrega de outra cena
Aonde toda a paz já me serena
Mudando a direção da ventania,
Sabendo deste mundo em claridade,
A divindade aos pouco ora invade
Enquanto novo tempo enfim se cria

30914

Adentro de minha alma as galerias
E tento desvendar qual o cenário
De um tempo muitas vezes temerário
Aonde em turvas noites mais sombrias
Enquanto novos rumos tu trarias
A quem se fez um torpe incendiário,
E tanto poderia necessário
Caminho entre tormentas e agonias,
Cardápios mais diversos nesta mesa,
Distante do que fora uma beleza
Esqueço-me por certo quanto posso,
E sendo assim servil aos teus desejos,
Momentos entre dores, mais sobejos
Fazendo deste sonho teu, o nosso...


30915


Cansado de lutar contra a torrente
E vendo incontestável vendaval,
Aonde se naufraga a minha nau,
Por mais que outro destino enfim se tente,
Do servilismo estúpido se sente
A força tão terrível, magistral,
E quando poderia ser cristal
Apenas vidraria se apresente.
Mecânicas diversas desta vida
Que enquanto se apresenta e nos agrida
Mudando a nossa sorte, em dor perdura,
Carcaça carcomida nada resta
E tanto quanto outrora fora festa
Agora do terror semeadura...


30916


Sorvendo cada gota do sinistro
Caminho feito em sangue, vinho e guerra
A sorte noutro rumo se descerra,
Porém a paz ainda em vão ministro,
E quando este porvir eu administro
Adentro meus enganos, porta cerra
E volto a mergulhar escusa terra,
E em cores mais sombrias eu me listro.
Alvíssaras? Agora desconheço
Do amor perdendo há tempos o endereço
Mereço tão somente este abandono,
E sendo então escravo dos prazeres,
O tolo entre os mais tolos, toscos seres,
Apenas do vazio enfim me adono...


30917


Imensa letargia me tomando,
Entorpecido ser em tez desértica
A sorte sendo sempre tão hermética
Jamais permitiria um tempo brando,
Mas tanto quanto posso desde quando
Vivendo em novo sonho, nova estética
Seara da esperança sendo asséptica
Permite um sonho em paz se transformando.
Acossa-me a esperança de outro dia,
Aonde a solidão não existia
E apenas de um amor a consciência,
Vivesse com ternura este lugar,
É como em vida tensa imaginar
O mundo se tornando em paz, clemência...

30918


De todos os meus erros o que ainda
Maltrata cada passo rumo ao quanto
Pudesse se tivesse neste canto
Magia aonde amor em paz deslinda,
E quando se transforma a sorte infinda
Indica-se deveras sem espanto
O prado da esperança aonde eu planto
E rara esta colheita em flor tão linda.
Amar e ter certeza de outro amor,
E ser deste caminho servidor
Perpetuando a glória de um bom Pai
É ter nas mãos seara condizente
Com tudo que deveras se apresente
Enquanto a dor em água turva esvai...


30919

Escuto a voz do vento na janela
Chamando como fosse quem outrora
Minha alma ainda vive e até se ancora
O barco se perdendo em frágil vela...
O corte mais profano se rebela
A sorte em tom temível me devora
E nada do que fora vejo agora,
Apenas esta sombra, dura cela,
Gerando a cada noite o mesmo estorvo,
Revela-se a mortalha feita em corvo
E nega uma possível redenção,
Medonha e caricata fantasia
Enquanto esta loucura em mim agia,
Invés de “nunca mais” escuto o NÃO!


30920


Enquanto em tal abismo ainda sinto
A fúria do passado revivido
E tanto poderia num gemido
Ou mesmo nalgum pranto estar extinto,
Mas quando me embebedo em tal absinto,
O corpo destroçado e desvalido,
Ainda não vê qualquer sentido,
E tolamente e espúrio, teimo e minto.
Resisto vez em quando num sorriso,
Mas quanto mais audaz, mais impreciso
E o passo rumo ao nada se aprofunda,
A sorte de quem tanto quis a paz,
Agora se mostrara tão mordaz
Seara que buscara, em dor, imunda.


30921


A sorte se mostrando sempre pouca
E nada do que tanto desejara
Agora a cada passo desampara
E a voz inutilmente estando rouca,
A velha fantasia me treslouca
Mergulho no vazio de uma escara
Escarra-me o torpor, minha alma encara
E sabe que afinal, atroz e louca...
Assim ao perceber tal covardia
A morte a cada cena se aproxima,
E tendo outro cenário em que se prima
Por medo, por terror, o nada cria
E vendavais terríveis se sentindo,
Aonde quis o amor, em paz e infindo...


30922


O peso de uma vida me transtorna
E quando a poesia poderia
Mudar em luz suave a tão sombria,
O medo a cada dia em dor retorna,
A sorte que buscara mesmo morna
Não tendo esta versão terrível, fria,
Fazendo da emoção a montaria,
Enquanto o Paraíso, amor contorna,
Nascido para ter a glória imensa
E tendo tal horror por recompensa
A virulência dita o meu caminho,
Amargo viandante do passado,
O quanto poderia... Morto o prado,
Apenas do vazio me avizinho...

30923


Carcaça de uma vida aonde eu quis
Sentir nova emoção e nada veio,
Apenas me transtorna este receio
E nunca mais serei sequer feliz,
O porte da ilusão tanto desdiz,
E quando tento estar a tudo alheio,
Falena em luz intensa, assim rodeio
Levando deste fato a cicatriz,
Macabra sorte dita o que pudera
Vencer a mais terrível, mas a espera
Não deixa que se creia em solução,
E quantas vezes cri noutro cenário,
Porém no quanto fora necessário
Do amor ouvi somente o mesmo não...


30924

Buraco na verdade é mais embaixo
A vida não é sempre brincadeira
E quando se prepara uma rasteira
Nas ondas mais diversas eu me encaixo,
E sei que quando o mundo vem abaixo
O quanto se porfia em derradeira
Seara aonde a sorte já se esgueira
Da imensa cordilheira ao bem mais baixo.
Percebo inúteis traços de uma luta
E nela sendo a glória mais astuta
Não deixa que se veja o fim de tudo,
Mas quando sou poeta ou tento ser,
O mundo noutra face e parecer,
Ainda mesmo assim, tolo eu me iludo...


30925

Semeio contra os ventos tempestades
E vejo quanto inútil tanta briga,
A sorte muitas vezes desabriga
Enquanto em novos rumos desagrades,
Arcando com temor e iniqüidades
Não pude preservar e já periga
Seara aonde o encanto desobriga
Gerando assim em dor variedades,
A imensa cordoalha se apresenta
E quando a fantasia não sustenta
A violenta cena se repete,
Aonde quis eterno carnaval,
Incêndio neste meu canavial
Ausente serpentina, amor, confete...

30926


Corcovas destas sortes mais atrozes
Partícipe da estúpida ilusão
Aonde não se vê qualquer verão
Invernos dominando minhas fozes,
As fossas vão se abrindo e em equimoses
Pancadas demonstrando esta lição
E nela se percebe outra intenção
Diversa da que, fútil, inda gozes.
Ferozes olhos dizem atitudes?
E quando assim ainda tu tentes, mudes
Resiste dentro em mim algum alento,
Nefanda sorte expressa cada verso
E tento deste rumo ser diverso,
Porém somente resta o sofrimento...

30927

Se acaso me encontrares pelas ruas
E bêbado fantasma do que outrora
Soubeste neste ser que desde agora
Expressa as almas turvas, seminuas.
E quando com a paz ainda atuas,
A fúria tão somente me devora,
E nem a intensidade em que se aflora
O sonho permitira novas luas,
Arcar com prejuízos, os credores
Em farpas mais diversas, sonhadores
Momentos esquecidos sobre a mesa,
Joguete da emoção velho fantoche,
Exposto desde sempre ao vil deboche,
Jamais pude enfrentar a correnteza...

30928


Joguei a minha vida toda fora
Pensando noutro tempo aonde em messe
A sorte de outra forma em que se tece
Negando a realidade que apavora,
Medonha face aonde em vão se ancora
O encanto de quem tanto não merece
Medalha da ilusão não se confesse
Nem mesmo a claridade em mim se aflora,
Acordo e mesmo tarde busco a paz,
Ingrata companhia que é mordaz
Da velha caricata desventura,
E quando quis apenas outro brilho,
Escuro caminhar por onde trilho,
Ainda se mostrando em vão tortura...


30929

Escolho das diversas paisagens
Que tanto dominaram minha vida
Em primaveras, sonhos, despedida
Alucinadas tardes, vãs miragens,
E tento construir entre as bobagens
História muitas vezes repetida
Um labirinto enorme sem saída,
Romper de velhas tétricas barragens,
E sendo em versos turvos dia a dia
Ainda que se veja na poesia
O alento necessário para quem
Vencido e em pleno outono vê no inferno
O trágico caminho para o inferno
Que uma alma desvalida em si contém...


30930

Votando o meu olhar para alamedas
Aonde percorrera em mansidão
Encontro nova face, outra versão
E nela tantas vezes tu te enredas,
Porquanto novos sonhos me concedas
Durante muito tempo esta visão
Moldando a tão real transformação
Em horas mais diversas, ora ledas...
E posso perceber quanto enigmático
E mesmo parecendo problemático
A redenção se mostra quando vejo
A sombra que inda ronda do menino,
Ao qual recorro enquanto não domino
As ânsias inconstantes do desejo.


30931


A casa esverdeada da esperança
Gerada entre montanhas e abissais
Exposta aos mais diversos vendavais
Aos alicerces fúria em dor se lança
E quando a sua base já se alcança
Terríveis cataclismos desiguais
Em pânico profano, o nunca mais
Buscando alguma ausente temperança.
Faz tempo que perdida num olvido,
O medo tantas vezes repetido
Negando uma existência a quem se fora
Durante tanto tempo acolhedora,
Agora vejo em mim tão esquecido
A casa da esperança, a sonhadora...

30932


Seria mais cruel deixar assim
Em pleno outono o sonho abandonado,
Durante tanto tempo do meu lado,
Cevando com ternura algum jardim
Que o tempo dissipara e vejo enfim,
Apenas mera sombra do passado,
E tanto poderia ser negado
O amor que não geraste ainda em mim.
Mas tento preservar este museu,
Que há tanto entre cenários se perdeu
Risível caricato de um momento
Aonde a juventude foi presente,
E agora com terror já se apresente
E protegê-lo ainda (inútil) eu tento...



30933


Como tantos balcões já destruídos
Por várias traições, os meus quintais
Enfrentam quanto mais vós derramais
Momentos entre insânias construídos.
Pudesse ter a cor de tais libidos
E nelas delicados, bons cristais,
Mas quando vejo os dias terminais,
Os sonhos todos eles, já vencidos.
O quarto de dormir, a solidão
Negando qualquer templo e adoração
Morrendo dia a dia quem se fez
Além de sonhador tolo poeta,
E tudo de um vazio se repleta
Gerando a mais completa insensatez.

30934

Os passos muitas vezes são em falso
E tanta queda eu vejo anunciada
Aonde não persiste quase nada,
Talvez o inevitável cadafalso,
A cada novo engodo outro percalço
Impede o retornar de uma jornada,
A sorte noutro canto abandonada,
Os sonhos pouco a pouco eu já descalço.
Retorno de onde nunca imaginara
E trago em minha boca a tez amara
De quem se percebera mais diverso
Do fútil caminhar pela corrente
E agora no final só se apresente
Inútil como sempre cada verso...

30935

Os inimigos sempre mostrarão
Diversa face embora com certeza
A mesma dor gerada com destreza
E nela em nova senda o eterno não.
Agigantando a dor, tal dimensão
Domina o que pudesse ser pureza
E ausente de meus braços a grandeza
Prepara a cada não sonegação.
Vestira a fantasia de palhaço
E quando em tais destroços me desfaço
Riscando deste mapa qualquer rastro,
Do quanto poderia, mas sem rumo,
Em pleno desespero se me aprumo,
Viagem naufragada, pois sem lastro...


30936


Ainda vejo aqui os espiões
Da vaga sensação da inútil ser,
Cevando sem pensar o desprazer
E nele todo o não que tu me expões,
Retardo o passo e em novas direções
Mergulho muitas vezes sem saber
O quanto poderia, mas sem ter
O prumo não encontro soluções,
São vários descaminhos, mesmo peso,
E tendo o coração bem mais obeso
Do que já desejara qualquer dia,
O medo de soslaio rende o sonho,
E quando em face exposta este medonho,
Caminho para o nada, ainda espia...

30937

As pernas femininas, coxas ternas,
Durante tanto tempo tal fascínio
Gerando em mim além deste domínio
A sensação audaz fossem lanternas,
E sendo muitas vezes conquistado
Deveras ao final em nada feito,
O rumo se mostrando em novo pleito
Revê as doces tramas do passado,
Agora em fase opaca em outonal
Desvio tão comum em nossas vidas,
Ao ver as mesmas forças renascidas,
O vento se transborda em frágil nau,
Porém enquanto o inverno é o que me espera
Terás o teu verão pós primavera...

30938


Ao resolver inútil equação
Da qual a minha vida se mostrando
Em ar por vezes trágico ou nefando
Matando pouco a pouco uma ilusão
Do quarto de dormir a viração
Do tempo em terrores vai moldando
Realidade atroz e em contrabando
Ausente dos meus olhos o verão.
Resido no passado e nada além,
Não posso nem tampouco me convém
Manter um sonho aceso, pois a ardentia
Já tanto destruída pelo inverno,
E quando me percebo mal hiberno,
E o sonho se demonstra uma heresia...

30939

Ainda que restassem passarinhos
E ninhos onde tento caminhar
As chuvas e tempestas devagar
Destroçam e meus dias vão sozinhos,
Mergulho em enfadonhos, velhos vinhos
E sorvo cada gota a imaginar
Seara onde um dia fui buscar
Momentos prazerosos em alinhos
Diverso desaprumo me açodando
E nele se percebe vez em quando
A face exposta e vaga do que eu sou,
Deveras procurara ser feliz,
E quando imaginara até, não quis
A vida e em seus vazios hoje estou.

30940

As folhas outonais amareladas
Caídas pelo chão, triste vereda
Porquanto vez em quando ainda ceda
Um passo; são perversas tais estradas
Resíduo das manhãs mais desoladas,
Enquanto no vazio se envereda
O sonho amortalhado já se enreda
Tomando os dias, noites assombradas.
Peçonha contumaz, a solidão,
Expondo em face nova outra aversão
E rastros do que fui não mais se vêm,
Persisto caminhando sem destino
E quando volto a ser este menino
Olhando em volta e sigo sem ninguém...


30941

As nuvens entre tantas ventanias
Anunciando o fim de qualquer sonho,
Cenário realista em que componho
Os fins de tarde, tantos duros dias...
Ainda ouvindo ao longe as melodias
Da fútil juventude, eu me proponho
A ter deveras risco mais medonho,
E nele conterei fartas sangrias,
Pereço a cada instante e mesmo ausente
Do quanto pode ser e se apresente
Nefasta face expondo a realidade,
E tento vencer erros com palavras,
Inúteis na verdade parcas lavras
E o mundo aos poucos sinto se degrade...

30942


As moscas adentrando na janela
Transcendem ao que fora em mim humano,
E vejo a cada cena o desengano
Aonde realidade enfim se sela,
A juventude eu sei quanto foi bela,
Mas dela não restou sequer um plano
E a fuga de mim mesmo gera o dano
Persisto neste não e traço a tela
Olhando mansamente de soslaio,
Quem tanto fora outrora hoje lacaio
Resiste ao perecer, mas nada disto
Trará qualquer momento em paz, presumo
O fim em distorcido e turvo rumo,
Porém mesmo inconstante eu não desisto...

30943

As rosas que cevara no canteiro
Aonde o meu passado demonstrara
A sorte mais audaz em luz tão rara,
Agora este vazio corriqueiro,
Pudesse ter a senda, mas se esgueiro
Caminho mais feliz nada declara,
E a própria sensação já desampara
E caio a cada instante, traiçoeiro.
Resido no que fora e nada além,
O quanto disto até só me convém
Gerando algum sustento em fim de tarde,
Mas sei que a noite é fria e solitária,
A seca em aridez é necessária
Por mais que o coração jovem retarde...

30944

Os sons que tanto trazem a ansiedade
A quem se mostra assim em fim de vida,
Ainda quando a sorte se duvida
Maior será decerto a realidade,
Pudesse ter nos olhos claridade
Distante e que se perde e a despedida
A cada nova tarde sendo urdida,
Porém meu canto ganha a liberdade,
Na ausência de total expectativa
Porquanto tão somente eu sobreviva
Não me permite mais qualquer algema,
E assim em libertário, mas tardio,
Cantar os meus temores desafio
Não tendo mais qualquer coisa que eu tema...

30945


Refaço em tão venais recordações
O passo dia a dia em que mergulho,
E sei do costumeiro pedregulho
E as horas em diversas dimensões,
Enfrento a cada mês novas monções
Resido no que resta; um mero entulho,
E quando dentro em mim tento e vasculho,
Ausentes as prováveis soluções,
A idade consumindo o que inda resta
De força nesta outrora feita em festa
Embora momentânea, alma vadia,
As cartas sobre a mesa, nada tenho,
E mesmo neste frágil desempenho,
O cofre dos temores se esvazia...


30946


Pudesse ter em mim a velha rua
Aonde se perdera em tais calçadas
Searas muitas vezes desoladas
Buscando qualquer raio, fútil lua...
Mas quando a realidade em mim atua
E vejo estas veredas maltratadas
Revivo o que julgara, pois estradas
E em sonhos a beleza continua.
Não passo deste estúpido poeta,
E quando me perdendo ausente meta
Colecionando as velhas vãs figuras
Num álbum de retratos dentro em mim,
Revejo e vou buscando e de onde eu vim
Apenas vejo rastros de amarguras...


30947


Encarniçado em mim velho propósito
De um tempo mais suave, nada existe,
E continuo amargo ou mesmo triste,
Das dores e temores vil depósito.
Atrozes noites dias virulentos
Tardios caminhares rumo ao nada,
E tanto poderia, mas velada
A sorte entre diversos sofrimentos.
Pacato vez em quando, mas teimoso,
No vandalismo exposto dentro em mim,
A cada instante acendo este estopim
E o que resiste traço em tom jocoso,
Afigurando assim a fantasia
Embora renascida, em vão, tardia...

30948


Ao menos resistindo em nostalgia
A sombra do que fora há muitos anos
Colecionando em dores, tantos danos,
O corte se profana em tez sombria,
Legado de quem tanto merecia
Os dias em terríveis desenganos,
Mecânicas diversas rotos panos,
A sorte a cada não se desfazia.
Negar a realidade? Eu não consigo,
E mesmo me traçando desde o umbigo
Jogado sobre a terra em que nasci,
Eu vejo decomposta a sensação
Matando a cada ausência a embarcação,
O que resta de tudo vês aqui...

30949

Ao vir do pó aonde em dor vieste
Verás a senda feita em luz disforme,
Por mais que a fantasia te deforme
Reside inevitável; viva peste,
E sendo assim caminho mais agreste
E nele do passado não se informe,
Ressurge a velha fera que inda dorme
E nela se reflete o que viveste.
De um verme virulento, da bactéria
Surgiste a agora em fausta face crês
Que tanto divergiste da matéria
Opaca e sem beleza, arcaico pó,
Tomando a tua face a estupidez,
Eterno caminheiro em vão e só...


30950


O que melhor em ti, melhor em mim?
Não vejo contra-senso, mas não creio
Na face decomposta em que este anseio
Gerara este demônio ou querubim,
Ascendo ao me entranhar por onde vim
Recendo a cada morto que rodeio
Por vezes me afastando, tento alheio
Decifrar os mistérios do Jardim.
Pacificando ou não tantos aspectos
Matando ou ressurgindo em outros fetos
Dos desafetos, laços de amizade,
Não restará sequer a menor sombra,
E o nada que virá se tanto assombra,
Também por outro lado, até me agrade...

30951

Eu tenho em ti o quanto em mim vigora
E parto do princípio de outro parto
Aonde a cada não vivo eu reparto
A sorte mesmo quando vai embora,
O caos generaliza e se devora
Mecânica constante e se descarto
O transformar insano, sigo farto,
Lavoisier em mim de novo aflora.
Reproduzindo em ti diversa face
Da mesma luz sombria eternidade
Não tendo e nem consigo a claridade
Por mais que ainda tente e mesmo passe
Momentos de dispersa companhia,
A vida após a vida se recria...


30952


Ficará do todo, a torpe imagem
Que se denigre aos poucos até nada
Gerar esta inconstância demonstrada
A cada nova face outra paisagem,
Apenas desvendando tal miragem
Ocaso após ocaso, mesma estrada
Embora tão diversa seja a estada
Realidades turvas tanto ultrajem...
Não vejo outro caminho senão este,
E tanto quanto outrora concebeste
Fagulha de uma vida refazendo
A nova enfrenta em si dicotomia,
E quando em luz constante ou mais sombria
Cobrando com tal ágio, dividendo?

30953


Tu és uma promessa do que eu fui,
E sei que refizeste esta esperança
Aonde a voz deveras não alcança
E assim sobre o futuro tanto influi,
Não vejo como o rio em paz já flui
Se o vento não trazendo uma bonança
Enquanto em temporal a alma se lança
O roto que persiste em mim se pui.
A morte inevitável do pensar
Embora esta matéria a renovar
Gerando outra diversa ou inconstante,
Não deixa qualquer rastro senão lendas
E quando a realidade tu desvendas,
Cenário surreal e degradante...

30954

Um acre sentimento me tomando
Após as velhas rixas que enfrentei
Lutando com mim mesmo mergulhei
Cenário aonde eu tento o quanto e quando
E neste mesmo não vou procurando
Resumo que permita ver da lei
Divina qualquer sombra em que tracei
Caminho para o etéreo duro ou brando.
E vejo ser plausível perceber
Que nada nem o sonho a perecer
Depositado aqui em meus escritos,
Participando a quem quiser me ouvir,
Embora seja tarde e sem porvir,
Os ermos que carrego, mais malditos.


30955


Relembro a face expondo esta brandura
E tento desvendar qualquer caminho
E quando da verdade me avizinho,
Não vejo satisfeita esta procura,
A sorte variável não perdura
E sei o quanto estou ledo e sozinho,
Negando o meu passado algum carinho
Pudesse sonegar tal desventura.
Apraz-me ter deveras conhecido
Quem tanto se mostrara decidido
Enquanto dividido sigo em vão,
A falta de desejos talvez seja
Remédio para uma alma tola e andeja
Quiçá dos meus anseios solução...

30956


Desgarro cada noite da fileira
De noites em diversos pesadelos,
E sei que quando posso aqui revê-los
A sorte noutra senda já se esgueira,
Não posso mais subir esta ladeira
Formada por engodos e desvelos,
E tanto ainda possa em torpes zelos,
Rasgando o que pensara ser bandeira.
Em solilóquio busco uma resposta
E quando não encontro a mesa posta
Arrisco outra saída e nada vem,
O vândalo caminho feito em festa
Abrindo do futuro turva fresta
O que melhor concebo, mesmo aquém.


30957


Buscando em ti retrato do que um dia
Sementes tão dispersas não trouxeram,
Enquanto os meus enganos degeneram
A vida renegando a fantasia,
Por ser assim decerto a alma sombria
Em novos descaminhos já se esmeram
Cometas mais diversos que assim erram,
Gerando em mim somente vaga algia.
Apátridas razões, riscos comuns,
Dos tantos que não tive guardo alguns
E sem ressentimentos ou falácias,
Residem as mortalhas no meu sangue
E mesmo quando morto e assim exangue
Genética persistindo em vis hemácias...

30958


O medo sendo fútil, a vergonha
Do fato de não ser quem poderia
Gerido pela tez dura e sombria
A quem a própria vida não se oponha,
Emérito caminho eu decomponho
E mato o que pudesse a fantasia,
Negando de mim mesmo a alegoria,
O parto sempre dói, duro ou risonho.
Felicidade é fato desejável,
Porém num solo opaco e não arável
Colheita se fará? Já nem mais creio,
O campesino vivo que ancestral,
Existe como tez residual
No agreste caminhar sabe o receio...


30959

Não tendo uma oração que me permita
Viver outro momento mais feliz,
No quanto a própria história contradiz
Seara com terrores se limita,
E quando inutilmente esta alma grita
Buscando alguma forma, este aprendiz
Riscado por enorme cicatriz,
Ainda procurando a grã pepita
Sem Eldorado segue ao quanto pude
E tento desvendar embora rude
O parto eterno ou nada que virá,
Ao crer em tantas fúrias e descrenças
Por vezes quando tentas me convenças
Das tantas desavenças o que irá?

30960


Pudesse ter a fé onde estas garras
Não fossem tão somente desprezíveis
Por mais que os sonhos sejam mais falíveis
Nas esperanças soltas tu te agarras,
E quando ainda fujo das amarras
Os passos se mostrassem divisíveis
Redemoinhos moldam riscos, níveis
Diversos do que ainda desamarras.
Não pude conservar tanta pureza
E sem a ingenuidade ou inocência
A vida não permite coerência
E nega qualquer luz, rara destreza,
Sofrível caminheiro do vazio,
A cada desengano eu me desvio...


30961

Somente me restando alguma noite
Aonde quis o brilho deste sol
Que tens como o teu Deus, raro farol,
Sobrando para mim o torpe açoite,
Enquanto a realidade não me acoite
O vandalismo impacta este arrebol,
E o furioso não faz caracol
Da inútil fantasia de um pernoite
Vivenciado em trágicos momentos
E ledos, mas freqüentes torpes ventos
Gestados pelo edênico fantoche
Que ainda resistindo nas profundas
De uma alma que se existe agora inundas
Com ares de piedade ou de deboche.


30962


Aonde mora o Deus que tu desejas?
Não sei se esta existência é consciente
Ou mesmo sendo assim se onipotente
E quanto mais as almas não protejas
Verás as esperanças mais sobejas
No olhar de quem deveras se apresente
Com furiosa tez, tolo demente
Ou mesmo em calmaria, se inda o vejas.
Não corro mais os riscos? Correria?
O carma existe em mim em voz sombria?
Negar qualquer caminho ainda eu posso?
Relacionando o ser com o poder,
Deveras vez em quando busco crer
E transformar o teu em sempre nosso...

30963


Os lábios se fecharam, nada falas
E tanto poderias me trazer
A luz que inutilmente busco ver
Ao procurar por fúteis, turvas salas,
E quando novamente me avassalas
Usando o solilóquio passo a crer
Na ansiedade tola do poder,
Momentos mais audazes, raras galas.
Peçonhas que bebera no passado,
A fonte destruída, o fim se vê
E quando imaginara algum por que
O fardo se mostrasse mais pesado,
Sonego o meu caminho com esparsos
Tropeço e desamarro os meus cadarços...


30964


O deus que Constantino nos impôs
Às vezes impostor ou mesmo arguto,
E nele com terror vejo este luto
Mortalha dissemina dor e pôs
Barbuda face escrota e se propôs
A ser o que demônio mais astuto
E quando crê-lo vivo eu me reluto,
Cadáver deste vândalo depôs
O quanto em mim já fora este depósito
E feito creio mesmo de propósito
Por velhos e castrados freis e abades,
O quanto neste inferno vil cristão
Tramando invés do amor pleno e perdão,
São de Satã decerto bons confrades...

30965


Um campanário eu vejo em sombras feito
E sendo cada sonho mais medonho,
Mesquinho caminhar ao qual me oponho
Deixando o meu futuro contrafeito
Resisto ao faiscante e bom efeito
Por vezes chega a ser mesmo bisonho
Caráter deste ser onde deponho
Meu medo e meu desejo insatisfeito,
Lutero com total sabedoria
Gerando nova fase, onde a sombria
Matara sem escrúpulos quaisquer
Degenerando assim esta potência
Ao destroçar a vida, incoerência
Que tanto se percebe ao ler Voltaire...


30966

Dos séculos e séculos em trevas
A face caricata de Satã
Mordaz em barbas feita, escrota e vã
Aonde ainda aqui residem cevas,
Mergulho no passado em que me levas
E neles se percebe sem manhã
Figura neste trono atroz, malsã,
Destarte seus impérios mais longevos.
Gerando semideus, a nova Roma
Com fúria e com chicote o povo doma
Tomando do que fora pensamento,
Resiste aos mais diversos contra-ataques
E vejo novos deuses nestes saques
Trazendo ao próprio Deus, o sofrimento...




30967



Daria todo o sangue se eu pudesse
Na luta que é constante contra aquele
Que tanto num cordeiro se fez pele
E traz a fúria tosca onde se tece
Medonha garatuja feita em prece
E nada do que tanto se revele
Mortalha sonegando não compele
Somente ao medo insano se obedece.
A pútrida figura em barba e trono,
Mesquinho caricato, rei e dono
Do quanto já pensara em destruir,
De tanta vilania ando cansado,
E sei que ainda é vivo este passado,
Pudesse não mais vê-lo no porvir...


30968


Aonde se cultuam turvos vultos
Humanos semideuses do presente,
O fardo mais atroz inda se sente
Gerando ao Criador tantos insultos,
Pacato cidadão entre tumultos
O pobre de um cristão não mais pressente
O quanto do seu Deus se faz ausente
Em tantas orações, dispersos cultos,
E incultos cavaleiros neo-andantes
Gritando em microfone, alto-falantes
Medonha e até risível garatuja
Na qual ao deformarem Jeová
Decerto novo tempo não trará
Uma alma assim espúria e sei tão suja...

30969

Ao esconder assim o teu olhar
Em névoas e neblinas inconstantes
Durante pelo menos tais instantes
Eu pude em céus imensos mergulhar,
Vagando por estrelas vasculhar
Sabendo ter decerto estes brilhantes
E neles os sobejos diamantes,
Trazendo uma alegria a quem sonhar,
E tento vislumbrar entre estas brumas
Enquanto da verdade tu te esfumas
Rumando para o etéreo de onde eu sei
Vieste me alentar em solitária
Noite tantas vezes temerária
Dourando com ternura a amarga grei...


30970


Coloca-se aos meus olhos tal beleza
E dela não percebo qualquer medo,
E quando aos meus desejos me concedo
Eu penso ser talvez a fera, ou presa.
E sigo com ternura a correnteza
Levado pelo anseio de um segredo
E quando com brandura enfim procedo
A sorte se demonstra em nova mesa,
Clarividência traça cada fato
E quantas vezes tolo me maltrato
Buscando outra resposta se eu já tenho?
Peçonhas destiladas vida afora,
E quando a solução assim se aflora,
O quanto do vazio eu desempenho...

30971


Iríamos por sendas onde a luz
Pudesse transformar a eterna dor
Num ato mais provável de louvor
Enquanto esta incerteza eu contrapus
Com toda a força aonde se produz
Seara desejada em rara flor,
E flóreo caminhar a se compor,
Negando a realidade em contraluz.
Resisto desta forma ao que sabia
Ausência mais constante de alegria
Regando com o fel cada canteiro
E ainda se pudesse acreditar
Na imensa claridade de um luar,
Se o tempo se nublara por inteiro?




30972


Bebendo desta mesma e clara fonte
Pudemos desvendar cada mistério
E tendo esta certeza nosso império
A cada novo dia mais desponte,
Rondando com ternura já se aponte
O rumo aonde outrora fosse sério
Tormento que desvendo em tal critério
Gerado pelo amor, raro horizonte.
Não posso discernir e nem pretendo
Caminho que garanta um estupendo
E raro amanhecer se eu sigo cego,
E quando mais procuro uma resposta,
A face com clareza assim exposta
Permite a calmaria em que navego...


30973

No espelho refletindo em ti meu eu
São tantas distorções, mas desejáveis,
Pecados do passado que insondáveis
Agora tudo em glória transcendeu
E o quanto se pudesse sendo meu
O rumo em novos dias demonstráveis
Gerindo tantos sonhos mais amáveis
E neles vejo ausente o eterno breu.
Enfim se é fantasia, pelo menos,
Os dias se passando mais serenos
E neles adivinho alguma luz.
No quase inverno vejo este resquício
Do quanto desejei e desde o início
O mundo só me dera espora e cruz...

30974

Espero que chegando mansamente
Alguém possa traçar um novo dia
Aonde na verdade não sabia
Possível caminhar em mesma mente,
E quando a realidade me desmente
A porta com certeza não se abria
E tanto sonho a vida sempre adia
Matando o que pensara tolamente
E se descrente sigo e nada traz
Especular vontade marca a fronte
De quem ao se perder noutro horizonte,
Jamais seria o quanto possa audaz
E nada do que tento se transforma
A vida se repete eterna forma...

30975


Não és quem és tampouco serei eu,
Diversos de nós mesmos, das mentiras
Proteges muito embora tu desfiras
As mesmas balas onde se prendeu
O rumo quando outrora se perdeu
E deles as medonhas, tolas miras,
Resumem o que tanto inda prefiras
Marcando cada dia no que é teu.
O passo sendo dado em rumo incerto,
Mas quando meus demônios eu deserto
Adentro a solidão que tu me deste,
Nefasta realidade assopra e morde
E quando noutro tanto finjo o lorde
No fundo desigual, mas tanto agreste.


30976


Venho de ti por vários descaminhos
E tanto quanto posso ser disperso
No quase sermos fúteis sendo imerso
Resumo no não ser os tantos ninhos
E sei que caminhamos mais sozinhos
Embora dentro em ti meu universo
E quando se profere mais perverso
O pântano devolve seus espinhos,
Imensos lamaçais são costumeiros
Mecânicas diversas, verdadeiros
E vândalos terrores aflorados,
Do quanto posso ou não estar contigo,
Às vezes noutro tanto eu não consigo
Em divergentes prados demarcados...


30977


Chegamos neste instante ao mesmo outono
E nisso se faz ver com claridade
O quanto se negou diversidade,
Mas jamais posso mesmo ou tanto adono,
Pereço quando em ti eu me abandono,
E ressurgindo quando a dor invade,
Usamos como algema a mesma grade
E nela cada farsa teimo e clono,
Corpúsculos do mundo celular
Reféns de uma membrana intransponível
No quanto este futuro é desprezível,
A proteção se mostra a cada olhar,
Veredas mais urgentes não percorro
E quando estou em ti aos poucos morro...

30978

Descanso meu caminho junto a ti,
Embora não sacie mais desejos
E tanto poderia em tais lampejos
Vivenciar o quanto já perdi,
Mas sei que a cada não eu pereci
Ofusco com meus ermos azulejos
E deles não percebo além dos pejos
E neles me protejo e estou aqui;
Resisto aos meus fantasmas quando busco
Em plena luz solar o lusco fusco
Qual fosse alguma forma de negar
O quanto nada sou se inda resido
E morro cada dia mais transido,
Buscando novo mundo ou patamar...


30979

Tocando em minhas pálpebras teu sol
Traçando qualquer luz mesmo que ainda
Na verdadeira face não deslinda
O quanto poderia se farol.
Renego cada errante girassol
E bebo desta sorte sendo infinda,
E rasgo esta medonha face onde se brinda
Em cristalinos copos vago escol.
Resumo em folhas secas o dia a dia
E tanto para o inferno o inverno guia
Melancolia gera nova dor,
Pudesse pelo menos por instantes
Vivenciar momentos deslumbrantes,
Porém cavo o jazigo em tal torpor...


30980


A noite se fundindo com o dia
Em luas, sóis a face desolada
Pudesse caminhar, mas sem estada
A estrada nada leva e nada cria,
Resulto no que insulto me traria
Nefasta realidade consumada,
E a porta permanece assim trancada
Aonde o nada ser se trancafia.
Pereço quando tento novo intento
E meço com palavras, pois o vento
Deturpa cada sílaba que eu diga.
Revestimentos frágeis, ilusões
Que quando te desnudas tu me expões
Negando ainda alguma leda liga...

30981

Vagas palavras traça o vento enquanto
Revisto com terrores os anseios,
E sei ao me mostrar sem mais rodeios
O peso do meu duro e amargo canto,
Não posso mais mentir, sigo portanto
Vencido desde quando em mesmos veios
Vivemos em conjunto quando alheios
Ao pântano gerado em desencanto.
Exilo meu caminho de mim mesmo
E quando posso crer e me ensimesmo
Patrulhas o meu sonho e renegas
O quanto sabem ser tão virulentos
Os dias onde outrora quis ungüentos,
Mas quando se percebe as almas cegas...

30982




Querer outra alvorada enquanto tramas
As armadilhas tolas e vulgares,
Por tanto quando enfim me procurares
Verdades são diversas, turvas chamas,
E sendo pertinaz quando reclamas
A ausência de prováveis bons altares
Escusos na verdade estes luares
Gerados pelas dores, merdas, lamas...
Parecem refletidos neste espelho
Olhares onde em vão eu me aconselho
Reparto com mim mesmo o nada ter,
E sei que tu diverges quando vês
A mesma face em tosca estupidez
Sonhando com momentos de prazer...


30983

Eu deixarei a vida em tuas mãos
Somente por motivos sem os quais
Ainda que se tentem funerais
Abrindo em farta terra, vagos vãos,
Negaste desde sempre novos grãos
E tento disfarçar com tais sinais,
Estranhos e diversos festivais
Cevando estupidez, inertes chãos.
Arcando com talvez ou nunca fora
O sândalo que tanto sonhadora
Quiseste agora traz outro perfume,
E tanto poderia, mas insiste
O caminhar ausente, e mesmo triste,
No qual o caminheiro se acostume...


30984


Pudesse abrir qualquer janela aonde
Eu visse rios, fontes, belas cenas,
E tendo esta beleza em que me acenas
O mundo do meu mundo ali se esconde,
E quanto mais procuro ou mesmo sonde
Buscando por diversas, mas amenas
Paisagens onde as luas sejam plenas
E o tempo volte ao mesmo e antigo bonde.
Refém desta ilusão por tantos anos,
E sendo costumeiros os enganos
Engodos se persistem hoje em dia,
Mas deles me alimento e tanto posso
Viver ainda morto, e me remoço,
Trazendo assim aporte à poesia...

30985



Não basta acreditar no que inda vejo
É necessário crer noutro cenário
Diverso do que sinto necessário
E dele não somente este lampejo,
Preparo o caminhar onde o desejo
Não seja tão somente temporário,
E nem este tormento visionário
Esboce o que deveras azulejo.
As farpas são comuns e disto eu sei,
Perfilo fantasias onde a grei
Não faz a distinção em céu e mar,
E sei que sendo cego vez em quando,
O todo no vazio transbordando,
Impede até quem sabe de sonhar...



30986


Não vejo este arvoredo em que se trace
Além do verdejante caminhar,
E tanto poderia imaginar
O quanto se mostrasse noutra face
Dispersa luz gerando o mesmo embace
Porquanto nada tenho e sem lugar
O mundo se transforma e sem sonhar
Mergulho com certeza em duro impasse.
Um homem com velhusca e sóbria tez
Que atrás dos meus tentáculos tu crês
Não pode ser disperso em alamedas,
Assim perdendo a vida simplesmente
Por mais que novo rumo ainda tente,
Invejo este formato em que procedas...


30987


Há dentro em mim um anjo que se veste
Deste demônio aonde se porfia
Realidade invade a fantasia
E toma a mais puída e dura veste.
E quando esta renega e não reveste
O corpo com terrível agonia
A porta escancarada não se via,
E todo o sofrimento já se investe.
Percorro esta vereda velha e atroz,
E nada se mostrasse nova foz
Já que sem afluência o rio esgota,
O particípio sempre no pretérito
Roubando da emoção sobejo mérito
O amor nunca obedece qualquer cota...


30988


Após a porta que ora se cerrara
Existe um turbilhão de luzes, cenas
E nelas o que vês é sombra apenas
Do quanto em realidade se escancara,
A face desdenhosa, torpe cara
O pantanal que geras quando em plenas
E tantas sinfonias não serenas
Uma alma recendida à chaga e escara,
Escarram-se mentiras e ilusões
E nelas com certeza contrapões
O quanto imaginavas e não vias,
Mantendo a porta assim, sempre cerrada
Tu não verás além da própria estada
E nisto tu refletes tez sombrias...

30989


O quanto se sonega uma visão
Diversa da que tanto se faz lúcida
Gerando em tez atroz ou mesmo lúbrica
Mentira que se cria em aversão.
E sei não ser só tua esta versão
Por vezes se parece meio estúpida
Eu sei que na verdade se faz cúpida
Porquanto em ti somente esta emoção.
Negando a própria tez jamais te ouvi
E nunca poderia mesmo em ti
Saber do que não vejo ou mesmo invento,
E sei quanto diverso és tu de mim,
Mas como agricultores, o jardim
Supera com ternura o pensamento...

30990


Aonde poderia haver segredos
E neles não se vê qualquer verdade
Ausente sempre está felicidade
E dela não se vêm sequer os dedos,
Mergulho em teus profanos vãos enredos
E bebo do que queres à saciedade
E não suporto apenas tempestade
Aonde poderiam novos medos,
O mundo se transforma e é sempre igual
Nas ânsias costumeiras, gozo e festa,
E proibi-los gera a podre fresta
Causando a cada instante outro venal,
Hedônico ou edênico divergem?
Mas para mim por vezes se convergem...


30991



Cenário inconfundível, a ilusão
Tramando em si diversos tons, matizes
Porquanto a realidade contradizes
E tens mesmo com isto outra visão,
Não posso caminhar na direção
Dos velhos e tampouco de aprendizes,
E quando solos duros sei que pises
Gerando a contumaz contradição,
Nesta adição imerges o que tanto
Negaste, mas ao ver tranqüilo encanto
O mundo não se faz somente triste
Reparte-se em ternuras e terrores,
Escolhas, meu amigo tuas cores,
Mas nunca amaldiçoes se não viste.



30992


Divirjo de mim mesmo? Sou poeta
E assim dicotomias esperadas,
Percorro com terror e luz estradas
A vida para mim não se completa,
Jamais verás minha alma enfim repleta
Se eu tento ou sigo atento nas escadas
As quedas não são mais desesperadas
Tampouco a lua nasce como meta.
Eclético caminho percorrido
E tanto à flor da pele algum sentido
Ou mesmo visionário, ou sonhador,
Por vezes sei que eu sou conservador,
Mas sempre libertário o pensamento,
Pois dele a cada dia eu me alimento...

30993


A liberdade dita a incoerência
Desejos maltratando o maltrapilho
Caminho onde às vezes cego trilho
E bebo a me fartar desta inclemência,
Felicidade dita a convivência
Do ser e do não ser, e sempre o brilho
Da mente pode ser um empecilho?
Noutro estribilho pálida inocência,
E rendo-me ao saber que nada sei
E nada poderia tendo a grei
Filosofo porquanto existo e penso,
Mas nada disto vale muito a pena,
Uma ignorância às vezes me serena,
É duro o caminhar assim tão tenso...


30994



Voltar a ser criança quando a vida
Transcorre com perguntas sem resposta
E tendo a minha mesa sempre posta
Porquanto da verdade se duvida,
Contradizendo a sorte já se agrida
Quem sabe outra vertente, outra proposta
Incoerência dita a face exposta
E dela esta obviedade trama a ermida.
Queria sossegar a minha mente,
Mas sei que não seria estar contente
Já que por natureza a vilania
Ascende ao pensamento e me perturba,
Gerando dentro em mim imensa turba
O corte do que tento se porfia...


30995


O mundo se repete, eterno plágio
E não podia mesmo ser diverso
Embora gigantesco este universo
A cada novo tempo, o mesmo adágio,
E se cobrasse a sorte com deságio
O peso mais comum, o mais disperso,
E tanto se uniria o que é disperso,
Usando com temor novo sufrágio.
À parte do que tanto poderia
Vencer com emoção a aleivosia
E derramar sanguínea direção
Aonde com aportes diferentes
No fundo somos todos congruentes
Até na incongruência da visão...


30996

Perguntas sobre o quanto e o quando ser,
Não tendo outras respostas não perecem,
E quantas vezes sei que se obedecem
Aos mesmo e temporário desprazer,
E sinto a cada instante se tecer
Caminhos onde os velhos mortos tecem,
Nas regras, mesmas normas esvaecem
E geram o provável sem se ver.
Sofrido ser humano. Cada dívida
Transcorre em mesma face sempre lívida
E mata o que pudesse salvação.
Pensar e repensar e não seguir
Sequer o que talvez noutro porvir
Sonegue a que pensavas direção...






30997


O sábio caminhar por entre espinhos
Negar qualquer momento aonde a foz
Mostrando-se num tom quanto feroz
Matando os mais diversos passarinhos
E tanto passará e sem os ninhos
Resulto no que fora mais atroz
Rompendo do passado velhos nós,
Da adega avinagrando caros vinhos.
Resumo no talvez este abandono
E quando do passado eu já me adono
Mergulho no que fora iridescente,
E agora já não cabe a vestimenta
Que tanto quanto pode me atormenta
Por mais que vez em quando me apascente...


30998

Atravessando em mim meus oceanos
E deles não se vendo qualquer nau
Sofrível navegante em ritual
Percebe no final os mesmos danos
E quando se condenas, desenganos
Farturas entre nãos corte venal
Fagulhas do que outrora em abissal
Mergulho se mostrara em rotos panos.
Demônios são comuns ao sonhador,
E nada impede o vândalo se opor
Ao que com certa luz ainda insiste,
E tendo este caminho poluído
O tanto se mostrara dividido,
No fim o que coleto é sempre triste...


30999


Qual ânfora que tanto está partida
Nas ânsias de quem busca por respostas
E tanto quanto podes tu apostas
Na perda sorrateira desta vida.
Risonho caminhar em distraída
Senda que pelas luas decompostas
Exporta a mesma voz aonde postas
O corte inusitado em dolorida
Fartura dita a eterna confiança
No quanto nada tendo, já se alcança
Ao menos o sofrível pensamento,
Alheio ao que divagas, vagas volvo
E tento com ternura o velho polvo
Que emerge deste mar todo momento...


31000


O teu sorriso estúpido permite
Que eu possa desvendar a solução
De quem se mostra em tanta divisão
E sabe que jamais teve limite
Porquanto noutra sendas se palpite
O que já se mostrara coração
Vulgar em tempestade e se verão
O quanto cada dor me delimite.
Resenhas do passado, velhas chagas
E ainda com ternura tu afagas
As vagas que desfilam temporais,
O teu sorriso traz na estupidez
Tranquila e tão serena, mas não vês
Naufrágios destes sonhos, falsos cais...


31001


A lua se desnuda em noite clara
E quanta maravilhas se percebe
A claridade intensa desta sebe
Aonde pleno amor já se declara,
A fonte de raríssima beleza
E dela se entranhando enquanto brilha
A mais divina glória traçando a trilha
Polvilha sobre nós tanta pureza,
Assisto ao espetáculo lunar
E vejo a senda assim se transformando
Outrora este cenário em mim nefando
Agora se podendo vislumbrar
Fantástica e sobeja imensidão
Mudando do meu verso a direção...


31002


Desfolhando em raríssima ternura
A fonte se transcende e me transtorna
E quando esta beleza já se entorna
A vida não permite uma amargura
E tanta maravilha se perdura
Após a vida atroz, às vezes morna
A frágua que decerto ora me adorna
Deixando para trás a desventura
De quem se fez poeta e sabe bem
Que tanta luz o amor cedo contém
E também como a lua me transforma
Nas fases costumeiras desta vida,
A história se demonstra dividida
Gerando agora em mim a plena forma...



31003


Coroa se deitando sobre nós
O plenilúnio dita esta nobreza
E sigo contra a turva correnteza
Sabendo incomparável sua foz,
Ouvindo a mais sublime e rara voz,
E nela com ternura e com destreza
O amor ao ser exposto em clara mesa
Destrói o descaminho mais feroz,
Pudesse ter eterna a claridade
Que agora tão somente doma e invade,
Traçando novo rumo em nossas vidas,
Jamais se perderia este caminho
E nunca mais se vendo assim sozinho
Quem tanto acostumou-se às despedidas.


31004


Tragicamente bela em palidez
A morte se mostrando, toma a cena
E assim tanto demora e se serena
Gerando em minha vida o que desfez
Caminho se prateia e a insensatez
Porquanto de outra forma bem mais plena
Gestando esta ilusão que sei mais plena
E nela todo o fardo que revês
Cadenciando o passo rumo ao nada,
A sorte tantas vezes degradada
Agrada a quem se fez assim tão mórbido,
Brumosa noite expulsa a dama nua
E quando não se vê ainda a lua,
O coração se opõe amargo e sórdido...

31005


Aloca-se emoção em torpe senda
E dita esta ilusão que regra a vida,
Normatizando a dor da despedida,
Não tendo quem meu sonho mais atenda,
O quanto poderia e sei ser lenda
O amor que degenera e sempre acida,
Porquanto a minha história é dividida
E nela nem um só luar desvenda,
Arcando com enganos muita vez,
O peso do passado em se que fez
A minha caminhada rumo ao farto,
E quando não me vejo em lua imensa,
A sorte desairosa se convença
E da ilusão decerto mais me aparto...


31006


Tu passas tão distante a cada dia
E vês o que talvez nunca pudesse
Quem tanto do calor viva benesse
E nada do que mostra a tez sombria
De quem a cada não mais se dizia
Ausente do caminho em que se tece
O amor que na verdade não tivesse
A sorte desvalida em poesia,
E assim ao conseguir somente o não
O mundo se mostrando em aversão
Derruba sorrateiro cada passo
Que dás sem direção e sei ao léu,
O quanto sou incerto e até cruel,
No todo quanto em ti já me desfaço...

31007


Ao banha-se em turvos mares
Esta senda uma amarga ilha
No caminho em que polvilha
Sonegando os meus luares
Tantas vezes maltratares
Que deveras já não brilha
E caíste na armadilha
Feita em dores ao notares
O descarte em que conduzes
O que outrora foram luzes
Hoje apenas duras trevas
Atormentas com terrores
E se tanto ainda fores
Já contigo não me levas...

31008

A sombra que se exilara
Da emoção em tez sombria
Toda noite nega o dia
E jamais se torna clara,
Posso ver nesta seara
O que tanto merecia
Quem decerto inda porfia
E traduz em cada escara
A verdade feita em dor,
E se fosse o sonhador
O poeta do passado,
Navegando em mar terrível
Em borrascas sabe audível
Vendaval que está traçado...

31009



Tantos prantos que inda trago
Mergulhado em turvo chão,
Caminhar sem direção
Tempestade em pleno lago,
E deveras sem afago
Contradigo a solução
E se tenho a proteção
De quem amo em sonho mago,
Na verdade poderei
Ser o quanto imaginei
Sem castelo, rei, vassalo,
Mas se o peito em vão eu calo,
Onde posso se sem lei,
Tanto quero e já não falo...


31010


Sombra amarga e dolorida
Acompanha quem deveras
Ao viver entre quimeras
Encontrara o fim da vida
E se tanto se duvida
Do que agora em dor temperas
Os meus dias, primaveras
Encontraram despedida,
A mortalha se tecendo
Onde outrora em estupendo
Caminha se procurara
O perdão teve seu preço
Meu amor, eu sei, mereço
Cada corte em tez amara...


31011

Quando em mantos dolorosos
Envolveste cada sonho,
Inda mesmo o que proponho
Não trará mais raros gozos
E se tanto majestosos
Caminhares, não componho
O que tanto em ar medonho
Transformara em tenebrosos,
Dias turvos mera ausência
E vivendo esta inclemência
O que posso ter enfim?
A mortalha que me deste
Com terror, frieza agreste
Já prevendo em dor meu fim...


31012



Minha voz vai se esvaindo
Nesta imensa e dura sebe
Todo o encanto que concebe
Neste sonho belo e infindo,
Ao sangrar em dores brindo
O que tanto em vão embebe
Coração já não percebe
Um sonhar outrora lindo,
E se tanto ainda busco
Em tormenta sei do brusco
Caminhar por entre espinhos,
Os meus dias são terríveis
Os meus cantos implausíveis,
Meus momentos mais sozinhos...


31013

Estas plagas mais distantes
Em convulsas tempestades
Tantas vezes ditam grades
São cenários degradantes,
Outros sonhos, diamantes
Em tormentas tu invades
E destroças com verdades
O que tanto se quis antes,
E deveras meu engano
Foi pensar aquém do dano
Que decerto causarias,
Sendo assim o meu futuro
Sendo escuso e logo escuro,
Minhas noites são sombrias...


31014

Vagas tantas encontrei
Nestes mares mais ferozes,
E sequer conheço as fozes
Destes rios desta grei
Onde outrora desejei
Caminhando entre os algozes
Não se ouvindo mais as vozes
Duras feras encarei,
Mas se tanto posso ainda
A seara sendo infinda,
Nada tenho em rumo certo,
E se tento novo dia,
O que tanto poderia
Pouco a pouco já deserto...


31015


Vendavais ao enfrentar
Procurando a mansidão,
Nada tendo, a direção
Vou perdendo devagar,
E pudesse neste mar
Grandiosa esta amplidão,
Mas somente vejo então
O meu mundo a naufragar,
Timoneiro no passado,
No presente sem futuro,
O que tanto em vão procuro
Já faz tempo destroçado,
O saveiro em que sonhara
Noutro porto se ancorara...

31016


Quanta treva e escuridão
Onde tanto quis a luz,
E se agora me conduz
Em terrível direção
A cruel embarcação
Novamente reproduz
O que tanto fora cruz
Hoje a mesma negação.
Ao sentir a tempestade
O terror agora invade
E detona o timoneiro,
Sem certeza de algum porto,
O meu sonho agora morto,
No vazio não me inteiro...

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