quarta-feira, 14 de abril de 2010

HOMENAGEM A DEMÉTRIO KORSI

EU SOU OUTONO

Este outono que em ser galante insiste
esse outono angustiado que me arejas,
quer alegrar-me,mas no entanto é triste
e me engana outra vez quando me beijas.

Esse outono é cruel, grade florida,
por dentro é sombra, vencimento, nada;
sem teu calor não pode mais ter vida
sua última rosa desfolhada.

Pois, sou outono. Vem, vem e me toca
a fronte lassa, tu que és horizonte,
que és primavera e beijos nesta boca,
e eu, madrigal de rosas em tua fronte.

Outono, já chegaste, e quem resiste?
e tu, primaveril, bem-vinda sejas:
outono sou também, outono triste,
porém, menos outono se me beijas.
DEMÉTRIO KORSI













1

“porém, menos outono se me beijas”
E assim ao renascer em primavera
Depois de tanto tempo em tensa espera
Estrelas sem destino, vãos, andejas
Sentindo desde agora a florescência
Que há tanto não sabia mais haver
Vivendo este momento de prazer
A voz da esta esperança em eloqüência
Cansado de lutar inutilmente
Cansado de viver tanto abandono
Enquanto imaginara eterno outono
Um novo amanhecer já se apresente
Acalentando um sonho onde se viu
Intenso renascer, primaveril...


2

“outono sou também, outono triste,”
Durante o caminhar perdendo o rumo,
A vida sem ternura e sem aprumo,
O sonho tão somente em vão persiste,
Pudesse ainda crer num novo dia
E nele me entregando sem defesa,
Mas sigo tão somente a correnteza
Meu passo em trevas, frios, já se guia
Vencido caminheiro que deveras
Sonhara com momento mais feliz
E agora cada passo ora desdiz
Ainda as mais remotas primaveras,
E tanto poderia acreditar,
Porém só sinto a vida se invernar...

3


“e tu, primaveril, bem-vinda sejas:”
Fazendo renascer esta esperança
À qual intensamente o amor me lança
Em noites bem mais claras e sobejas,
Viver esta alegria após o tanto
Que imaginara e nunca saberia
Ser possível colher esta alegria
Após cevar somente dor e pranto,
Vestígios de um momento mais dorido
Resistem ao que possa acredita
Num novo amanhecer em luz solar,
São tantos descaminhos, sem olvido,
Mas quando tu chegaste em ar sereno,
O amor que tanto eu quis; agora é pleno.


4


“Outono, já chegaste, e quem resiste?”
Jamais conseguiria imaginar
O fim do tanto sonho a se mostrar
Num ar atroz, amargo, frio e triste,
Cansaço desta vida itinerante
Andando sem destinos, bares, noites,
As horas solitárias, quais açoites
Não tendo nenhum riso que agigante
O passo deste a quem a vida nega
Momento prazeroso como houvera
E quando se percebe a primavera
Diversa desta sorte dura e cega
O mundo num outono sem saída
Aos poucos invernado a minha vida.


5


“e eu, madrigal de rosas em tua fronte.”
Sabendo quanto posso desfrutar
Do amor que incendiando sem falar
Traçando novo dia em que se aponte
A sorte desejada e tão querida
Depois de tantos anos, solidão
Momentos de alegria mudarão
O rumo do que fora amarga vida
E sendo assim só teu neste segundo
Nas sendas mais floridas eu me vejo
Matando com carinhos meu desejo
Meu mundo se apazigua e me aprofundo
No encanto deste amor em paz e luz
E a primavera em mim se reproduz.

6


“que és primavera e beijos nesta boca,”
Traçando novo rumo aonde eu posso
Vivendo este momento meu e nosso
Saber desta alegria que se aloca
No peito de um antigo navegante
Que tanto quis a sorte noutra face
E após vencer a luta em que se trace
Caminho tão diverso num instante
Deságua dentro em mim sobeja fonte
E dela novo tempo se moldando
Agora com certeza bem mais brando
No quanto tanta luz o amor aponte,
Vicejas novamente em primavera
Depois de tanto tempo em dura espera...


7


“a fronte lassa, tu que és horizonte,”
Beijando com carinho traz enfim
A bela florescência no jardim
Diverso do que outrora inda remonte,
Singrando mar tão belo da esperança
Teus olhos verdejando a alma sombria
E quanto renovasse a fantasia
O mundo noutro rumo agora avança
E mostra num sorriso mais tranqüilo
A fonte desejável de uma luz
Que tanto me serena e já conduz
No amor que novamente em paz desfilo,
Sabendo desde sempre tal beleza
Entregue à mais sublime correnteza...


8

“Pois, sou outono. Vem, vem e me toca”
E saiba que ao tocar a pele em rugas
Ainda se preparam novas fugas
E nelas o prazer já desemboca
Sorvendo esta alegria, finalmente
Cansado de lutar contra o fastio,
O amor que novamente é desafio
O tanto se mostrando plenamente
E assim ao mergulhar neste delírio
Um andarilho imerso em solidão
Sabendo dos momentos que virão
Esquece totalmente o seu martírio
E bebe desta fonte inebriante
O mundo se renova ao mesmo instante.


9




“sua última rosa desfolhada”
Há tanto morta em mim a primavera
Tomando cada passo esta quimera
Matando o que seria uma alvorada
A sorte se traduz em dor intensa
E nela com certeza ainda vejo
A morte insofismável do desejo
Não tendo quem deveras me convença
Do dia prometido em luz suave
Da mansidão após a tempestade
Enquanto este vazio me degrade
E o medo a cada não bem mais se agrave
O quanto poderia haver em mim
Há tanto destroçando o meu jardim...


10



“sem teu calor não pode mais ter vida”
Quem tanto procurara outro caminho
E vendo-me decerto assim sozinho
A morte a cada passo sendo urdida
A treva toma conta do que fora
Num tempo mais feliz bela paisagem
E agora a neve entorna esta roupagem
Matando uma alma leve e sonhadora
Mergulho nesta insânia e rasgo o tempo,
Medonha face vejo neste espelho
E quando no vazio me aconselho,
Encontro a cada passo o contratempo
Beijando o teu retrato amarelado,
A vida se condena ao vão passado.



11



“por dentro é sombra, vencimento, nada;”
Assim vou prosseguindo até o fim,
Matando o que restara, amor, em mim,
A sorte totalmente destroçada
Risonho sonho diz da juventude
Mortalha do presente no futuro
O quanto em morte/vida me asseguro
Caminho que deveras nada mude,
Mesquinhos os momentos que inda tenho
E neles não encontro mais a paz
Do Amor que tantas vezes satisfaz
Só resta esta vontade em tolo empenho,
Vasculho nesta insânia que sou eu
E encontro o que decerto se perdeu.


12



“Esse outono é cruel, grade florida,”
Deixada numa ausente primavera
A sorte a cada passo destempera
Regendo solidão, matando a vida
Ainda o que restara sendo pouco
Não trama novo rumo; e quem pensara
Apenas numa noite mansa e clara
No imenso turbilhão, já me treslouco
E vago sem destino em noite vil
Persigo qualquer luz, mas nada resta
Apenas esta imagem mais funesta
O amor sem ter caminho não se viu
E morto desde quando em frio tanto
Outono fez se ouvir em torpe canto...


13


“e me engana outra vez quando me beijas”
A furiosa noite em tempestade
Porquanto ainda viva cante e brade
Deveras muito aquém do que deseja
Uma alma sonhadora em luz tão forte
Ausente dos meus olhos a esperança
Enquanto no vazio o passo avança
Sem ter sequer na vida algum suporte
Mergulho neste pouco que pensara
Bastante, mas somente o que se vê
A vida sem carinho e sem por que
A sorte se mostrando bem mais rara,
Mortalha em torpe luto e nada mais,
Onde quisera dias magistrais...


14


“quer alegrar-me,mas no entanto é triste”
Ilusões não bastam, quero a luz
E quando ao mesmo nada me conduz
O passo pelo qual o sonho insiste
Amedrontado mesmo, nada vejo
E creio tão distante este momento
No qual deveras tento e me apascento
Vivendo a realidade de um desejo
Anseios tão diversos não encontro
E quando tento um passo mais audaz
Apenas a mortalha é o que se traz
Na vida feita em dor e desencontro
Apronto cada dia em luz sombria
A primavera, morta, não me guia...


15


“esse outono angustiado que me arejas,”
Este medo sutil de nova senda
A sorte com ternura não atenda
O quanto mais em luzes tu desejas
Não pude perceber outra saída
A morte poderia me aplacar
E assim ao ver distante o imenso mar
O quanto se prepara é despedida
Não tendo em minhas mãos a solução
O tanto se desnuda em voz funesta
E vivo o que talvez adentre a fresta
Pensando noutros brilhos que virão,
Mas sei do outono e nele já me interno
Aguardo finalmente o torpe inverno...


16

“Este outono que em ser galante insiste”
Depois de tanta luta em noites vãs
A vida sem saber d’outras manhãs
Deixando o coração deveras triste
Ansiosamente busco por notícias
Que possam me trazer algum alento
Mas quando mais procuro e me atormento
Do tempo só encontro tais sevícias
E assim ao perpetrar este vazio
Somenos importância tem a morte,
Sem ter momento algum que me conforte
O coração se mostra amargo e frio,
Na gélida expressão desta borrasca
Ao peito só restando uma nevasca...

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