domingo, 16 de maio de 2010

32901 até 32950

32901

Chegando muito cedo quem deveras
Eu não imaginava ter por perto,
E quando a realidade já deserto
Ainda penso noutras primaveras,
Assim enquanto vês as mesmas feras
E delas não consigo, peito aberto
Vencer e imaginando, mesmo alerto
Metamorfoses ditam novas eras,
E a morte se aproxima e não me deixa
Sequer pensar, sonhar, e sem ter queixa
Adentro os seus caminhos e indefeso
Não tendo outra saída, vou entregue
Até que o turbilhão já se sossegue
E irremediavelmente esteja preso.

32902

Qual fora uma efeméride, num ato
Somente dividido em várias cenas
Num transcorrer em horas duras, plenas
Envolta por prazer e desacato,
Numa constância mansa de um regato
Inundações, às vezes, mas apenas
Momentos em que aos poucos envenenas
Ou mesmo por resposta eu te maltrato,
Na brevidade expressa em raros gozos
Noturnos caminhares, prazerosos,
E depois a rotineira e tola ermida,
Sozinho em multidões, assim a vida
Início preparando a despedida...

32903

Instante mera foto de um conjunto
Que tanto se perdendo ou diluindo
No espaço sendo o próprio mesmo findo
E nisto renascendo em novo assunto,
Porquanto estes cenários teimo e junto
Tentando algum formato torpe ou lindo,
E assim neste somar já prosseguindo
Quebra cabeças, peças re-ajunto
Vivendo cada ausência ou mesmo a vida
E nela se percebe a ressurgida
Manhã depois da noite em treva ou lua,
E deste somatório de emoções
Porquanto sejam tantas divisões
Uma noutra decerto continua.

32904

Alguma coisa sempre se perdendo
No vai e vem da vida em noite e dia
E assim se perfazendo a fantasia
E dela outro tempo já se vendo
Porquanto cada fato de outro adendo
Renovação se faz e se sentia
Nesta medida exata em que seria
Compêndios em compêndios se envolvendo.
Ressurjo quando tento nova história
E morro a cada instante na memória
De um mundo tão mutável, mas constante
E neste carrossel, roda gigante
O tempo não condiz com a verdade
Na medida em que o velho se degrade.

32905

Amor começa enquanto prenuncia
O fim da tarde e tanto modifica
Enquanto derrubando me edifica
Ao mesmo tempo deveras anuncia
A morte incontestável de outro dia
E tanto quanto possa não explica
Tampouco do que vem mostrando dica
Refaz onde se o encanto perderia.
Amar e conceber outro momento
E dele se mostrar quando freqüento
Um renovado ser, mesmo que falso,
Tropeço após tropeços eis o amor
E tanto renovável forma e cor
Gerando a salvação e o cadafalso.

32906

Aonde se acabasse um ideal
A vida não teria mais sentido,
E tendo mesmo estando adormecido
O sonho libertário fonte e nau
Da qual por vezes fujo, mas igual
Momento se apresenta ressurgido
Ou mesmo disfarçado e distraído
Galgando a cada dia outro degrau,
Por vezes me calando em estratégia
A vontade porquanto seja régia
Domina o pensamento e mesmo assim,
Aflora-se meu sonho vez em quando
E aos poucos me sentindo transmudando,
Mas coerentemente chego ao fim.

32907

Embora tenha visto aqui meu cais
E até sentido os pés em terra firme
Por mais que a realidade sempre afirme
O olhar neste horizonte busca mais,
A vida não permite claramente
Os sentidos unirem concebendo
O quanto se pudesse em estupendo
Momento quando o sonho nos desmente
Assim nesta inefável caminhada
Por entre meus escombros e esperança
O tempo noutro fato já se lança
Por mais que a meta esteja demonstrada.
Renovo-me e talvez isto sustente
Esta inconstante fúria em minha mente.

32908

Arrisco-me porquanto ainda viva
E sei do quanto é boa a nova aragem,
Rever de vez em quando a paisagem
Imagem que persiste em tez altiva,
Mas quando da esperança já se priva
A vida se contendo em tal barragem
Impede qualquer sonho e sem miragem
Não há quem na verdade sobreviva.
Ausento de mim mesmo desde quando
Percebo o meu olhar sempre buscando
Um brilho ainda até residual
E dele alimentado, não sacio
Mutante criatura eu me recrio,
Monótono, mas busco ser dual.

32909

A morte segredando em meus ouvidos
A sorte desairosa, mas constante
Por mais que na verdade se levante
E tente disfarçar outros sentidos,
Os dias entre dias percorridos
Moldando a fantasia num levante
Inútil quando eu vejo estar diante
Dos fatos tantas vezes repetidos.
Renovo-me e procuro ainda ver
Futuro aonde sei haver passado
Inutilmente sinto degradado
O que deveras dera mais prazer,
Até que num descanso ou num vazio
O fim encerra o ciclo em que desfio.

32910

Riscando o meu caminho em inconstância
Em ondas mais diversas, mesmo mar,
Negando o que bem sei poder voltar
E nisto não sentir mais discrepância,
A vida renovada em militância
Porquanto é necessário, pois sonhar
E quando chega ao fim, sem se notar
Do todo nem sequer sombra da infância
Enquanto restitui-se em nova forma
A sombra do passado nos informa
O quanto não cumprimos ou falhamos,
Aos poucos esta fronde, hoje raiz
No quanto se perdera busca e quis
O vicejar sublime de seus ramos.


32911

Porquanto andara tanto em meio às sombras
Durante muitas léguas, vida afora
Ainda vejo quando ao longe aflora
A sorte desejada em tais alfombras,
Mas quando na verdade se apresenta
O mundo entre luzeiros mais fugazes
E neles vez em quando te refazes,
Viver é conceber esta sedenta
Imagem que jamais será calada
Nem mesmo saciada plenamente,
E quando eu me renovo e me apresente
Com face sutilmente disfarçada,
Não percebendo assim a direção
E nela esta constante mutação.

32912

Adentro pensamentos e buscando
Algum sinal de vida aonde outrora
A fera adormecida já se aflora
E torna o caminhar bem mais nefando,
Negar a minha história, transformando
Sem ter sequer noção de um tempo e de hora
No quanto a vida em si já se demora
Eternamente o todo reformando,
Até que num formato terminal
A morte com seu brado ritual
Eleve-se e domine toda a cena,
Por ser assim e nada mais, insisto
Se eu penso e se decerto ainda existo
A parte que me cabe é tão pequena...

32913

Floresce em mim a sombra do que eu quis
E nunca poderia consistir
Na fonte de um momento no por vir
Gestado a cada ausência ou cicatriz,
No quanto ser alegre ou infeliz
Bebendo do que tanto irei sentir
Apenas pelo fato de existir
No qual a realidade contradiz,
E sendo assim vital fugacidade
O quando do meu todo se degrade
Até chegar à tola podridão
Realço os meus fantasmas, mas os tenho,
Mas quando de esperanças eu me emprenho
O empenho gera a mesma negação.

32914

Entre ócios tão diversos vida passa
E tento segurar o que não vejo,
E assim apenas sendo este lampejo
E mera forma expressa em tal fumaça
Ainda procurando qualquer graça
E nela refazer um ar sobejo
Prescrito pelo quanto mais almejo
No fundo o fim da peça a vida traça.
E sei deste caminho inevitável
Penhascos entre rocas, rochas, morte,
Farturas entre sonhos, vão aporte
O todo se mostrara inalcançável,
Existo e por saber que ainda vivo,
Encontro pelo menos lenitivo.


32915

As lâmpadas acesas, sala aberta,
E nada adiantando esta promessa
O quanto do viver não recomeça
Enquanto a própria vida não desperta,
Servindo ao navegante como alerta
Momento vez em quando já se engessa
E o turbilhão seguindo ora sem pressa,
Aos poucos me servindo de coberta.
Acetinada sombra de um momento
Aonde pelo menos me apascento
Sabendo da puída resistência
E quero crer possível novo dia,
Embora na verdade o que se via
Em progressiva forma, inexistência.

32916

Por vezes neste quarto eu cambaleio
Tentando algum apoio aonde eu sinto
Apenas o fulgor de um velho instinto
Usando da alegria qual recreio,
E quando a realidade ainda anseio
E beijo este vulcão em mim extinto
Dos antros mais vorazes eu pressinto
O tempo que jamais um dia veio.
Negar a coerência e ser aquém
Do todo que decerto sempre vem
Moldando com adagas o caminho,
Encontro neste espelho em rugas feito
Retrato aonde em vão inda me aceito
E da verdade aos poucos me avizinho.

32917

Prestes a sentir o que em verdade
Jamais eu poderia imaginar
Na juventude há tempos, demonstrar
A face aonde o mundo se degrade,
À parte dos meus sonhos, claridade
Não traduzindo ao menos o lugar
Aonde eu poderia desfilar
Somente qualquer tom: felicidade.
Não vejo e nem seria uma surpresa
Saber da inexistência desta mesa
Porquanto do banquete nem sinais
O todo se perdendo em mil pedaços
E quando se transformam velhos traços
Os fatos refletindo o nunca mais.

32918

Um deserto que ainda habito quando
A noite se aproxima e solitária
Não deixa qualquer sombra, necessária
A quem se fez deveras noutro bando,
O mundo com tal fato realçando
A dita muitas vezes temerária
E nela cada ausência é procelária,
Porém pressinto o todo desabando
No vago caminhar em noite escusa
O quanto a vida enfim ainda abusa
Da busca incoerente, mas constante,
Eu tento discernir em plena sombra
A imagem espectral que ainda assombra
Num ato inconseqüente e degradante.

32919

Sentindo a me tocar o vento brando
Em brisas ou quem sabe mesmo em fúria
A sorte não suporte mais lamúria
E neste quadro eu sinto emoldurando
O fato de viver e semeando
Ainda mesmo em vão qualquer incúria
E pego de surpresa em tal penúria
Jamais se imaginara em mim nevando.
Mentindo muitas vezes finjo bem,
E sei da incoerência que convém
Enquanto minto ou tento em omissão
Negar a própria face da verdade
Por mais que ainda beba a realidade
Eu não vislumbro mais tal divisão.

32920

Veludos do passado, sedas nobres
E agora nos retalhos que te trago
Ainda se percebe algum afago,
Porém nem mesmo sombra tu descobres,
Na expectativa imensa em que recobres,
Existe a placidez de um frágil lago
Não tendo este poder, queria um mago
Momento feito em luzes, ouros, cobres.
São meras ilusões de um sonhador,
A culpa é desta insana poesia
Que tanto quanto poupa e me recria
Gestando com loucura um torpe amor,
Ainda não percebe a face escura
Da lua que no céu clara emoldura.

32921

É como se no incerto caminhar
Houvesse algum alento pelo menos
E a vida traduzindo tais venenos
Nos quais eu me entreguei e sem pensar,
Vestígios de uma sombra em luz solar
Tornasse os dias duros mais amenos
Portanto já seriam bem pequenos
Os velhos turbilhões onde lutar.
Encontro em galerias de minha alma
As sobras pelas quais o tempo acalma
E transcorrendo em paz o que talvez
Noutro momento possa até trazer
Imensa turbulência em desprazer
E apenas este sonho não desfez.

32922

Tantas vezes procuro algum sinal
Que possa me trazer ao menos paz,
E quando a gente fosse mais tenaz
A vida não seria bem e mal
As horas num momento germinal
Transformam novamente o que se faz
Em outra discrepância até audaz
E assim se rezando o ritual
Até que nada sobre ou mesmo reste,
O passo em caminhada mais agreste
Permite que este mundo amadureça
E nisto a realidade dita o tempo
Imerso em alegria e em contratempo
Tomando sem limites a cabeça.

32923

A sorte não produz a mesma face
E mesmo nos sinais onde arrebento
A fome se mostrando sem provento
E nisto cada engano bem se trace,
Aonde a fantasia já não grasse
Exposto às variantes deste vento,
O mesmo sol que dita provimento
Gerando noutro instante duro impasse.
Restingas entre praias, mares, mesma areia
O cais já se ausentando e sem sereia
A vida não permite fantasias,
Assaltos entre balas e vielas,
No canto em que deveras tu revelas
As duras emoções dos torpes dias.

32924

Relembro cada dia do que fora
Imagem refletida noutro espelho
E quando no vazio me aconselho
Resposta nunca sendo tentadora
Denota a falsa imagem em reflexo,
Assim em profusões diversas cenas
E nelas quantas vezes envenenas
Tornando o já sem rumo mais se nexo.
Dos pós em prós e contras sigo
E tanto navegando em sortilégio
O amor que não pudesse ser tão régio
Ditando com terror qualquer perigo,
E assim ao desatar caminho e senda,
O nada que inda trago não se atenda.

32925

Assídua voz em tons diversos tendo
Caminhos discrepantes entre tatos
Vencidos pelos sonhos os contratos
Não vejo nem entendo mais adendo
Retendo com palavras não desvendo
Senão os meus ritos, meus retratos
Em atos divergentes, lautos pratos
E neles o que tive se perdendo,
Acasos entre ocasos, casos são
E beijo a conseqüência do verão
Na brônzea maravilha desnudada
Mas logo repasso noutra face
O traço que a verdade já desgrace
E volto novamente ao velho nada.

32926

Refém da poesia em ti mergulho
E tento reverter caminho torto,
Buscara inutilmente qualquer porto
Apenas por ouvir longo marulho,
E sendo na verdade mero entulho
Resíduo do passado semimorto
Mesquinha realidade vulgo aborto
Ainda vou fazer muito barulho.
E nada do que possa ser assim
Diverso do que espero inda de mim,
O pangaré desta alma traiçoeira
Bebendo esta aguardente batizada
Transcende à qualquer forma de alvorada
E assim na liberdade dou rasteira.

32927

Rodopiando em diverso temporal
O tempo vai tomando cada fato
E sendo tão comum este retrato
Aonde se mostrara desigual
Imagem que proponho, tanto qual
Ainda noutro tanto, mesmo prato
Lavando a fantasia no regato
O mar se mostra ausente ou pontual,
Esqueço dos meus medos, meus anseios
E busco novamente em devaneios
Momentos que talvez ainda tenha,
E neles crer no amor, mesmo tardio
E quando em outros versos me recrio
É como reacender fogueira e lenha.

32928

Assino com meu sangue o compromisso
Do tempo quando em tempos mais dispersos
Invade com furor todos os versos
E nisso me percebo quase omisso,
O tanto quanto pude e mais cobiço
Vibrando em ares fartos e diversos
No todo dos meus sonhos vão imersos
E assim se manteria ainda o viço.
Vestígios do que tanto quis em fases
Aonde cada dia que inda trazes
Permite amanheceres com ternura,
No encanto feito em dor ou mesmo luz,
O amor já sendo a fonte que produz
Ao mesmo tempo a paz ou a loucura.

32929

Amei e não podia mais negar
O fato escancarado nos meus atos,
E quando percebera novos tratos
Distantes do que pude imaginar,
Vibrando em emoções pude tocar
Os sonhos entre tantos vãos retratos
E sinto se talvez pudessem gratos
Momentos onde a sorte fui buscar,
E sei que por amar não bastaria
E nesta fase agora, meu outono,
Entregue ao mais terrível abandono
Na espreita deste inverno em noite fria,
Um novo amanhecer, mesmo tardio,
É mais do que um caminho: um desafio!

32930

Descendo pelos antros da seara
Amarga aonde tanto quis lutar
E vendo inutilmente se mostrar
A noite aonde nada mais aclara,
O verso inconseqüente se declara
E tenta vez em quando disfarçar
Usando de outra imagem; divagar
E ter nos meu destino o que me ampara
É como receber em plena noite
O sol em fúria feito, iridescente
Porquanto se perceba onde se acoite
A fantasia tola e necessária
Assim, ao se tocar o que se sente
Completo-me na intensa luminária...

32931

Fazendo do meu canto uma fonte
Da qual já não pudesse me livrar
E tendo a cada prece outro sonar
Ainda que não veja no horizonte
Sinal aonde a vida mostre e aponte
Por onde deveria começar
Ou mesmo noutro tempo me ancorar
Destroços de uma velha e dura ponte.
À porta dos meus sonhos sentinelas
Mordazes sensações às quais atrelas
Os dias entre sonhos, fantasias,
O parto é demorado e quando surge
A imagem deste caos aonde se urge
A vida em faces claras, mas tardias...

32932

Percebo o quanto pude e não consigo
Sentir além da vasta negação
Aonde a vida molda a direção
E trama a cada curva um vão perigo,
Apenas ao somar o desabrigo
Não mais queria ter a solução
E o pranto sem total lamentação
Somente disfarçando, pois nem ligo.
Esqueço e recomeço além do todo
E quando me pensara em pleno lodo
Renasço e nada deixo para trás,
A vida determina esta mudança
E o quando a plenitude já se alcança
Um novo desafio ela nos traz.


32933

Um pouco do universo existe em mim
E todas as figuras que percebo
Do assassino frio já concebo
Cenário de onde fujo e tento ao fim
Negar a mesma face de onde vim,
E quando noutro tanto acaso embebo
Demônio se pensando quase um Febo,
O beijo da mortalha, um estopim,
E neste conhecer as variáveis
De uma alma entre diversas faces vista,
No quanto poderia pessimista
Os dias com certeza são mutáveis
Em tal dicotomia posso ver
A dissonante face do meu ser.

32934

Negar a discordante fantasia
Aonde o meu passado renascesse
E tanto quanto possa merecesse
A sorte renovando em agonia
O tempo quando a vida desafia
E sendo sem saber imensa messe
O encanto aonde o tempo se obedece
E morre quando muito em alegria.
Das pétalas diversas, flor sombria
Matando a primavera, nega o fato
E quando esvaziando mundo e prato
A porta não se vê, pois negaria
Saída a quem se fez em cor dispersa
À qual a poesia já não versa.

32935

Recomeçar caminhos após medos
E receber a sorte do não tido
Mergulho sem saber de algum sentido
Tentando desvendar velhos enredos,
E sei das discrepâncias dos segredos
O temporal tocando o já perdido
A morte transformando o dividido
Em dias mais longínquos mesmo ledos
Na estupidez gerada pelo fardo
E nele cada trama vira um dardo
Penetrando profunda furna em mim,
Mesquinharias grassam pelo vão
E toda realidade em direção
Diversa da que ainda existe enfim.

32936

Resolvo meus problemas com adagas
E facas e punhais, revólver, bala,
Assim a sorte às vezes avassala
E deixa para trás ausentes plagas,
E enquanto as fantasias tu afagas
Deixando-se antever em plena sala
O pouso necessário e não se cala
Procuras também mesmo pelas chagas
Extintas esperanças noutro quarto
E assim cada cadáver que reparto
Prenunciando o próximo transcende
Ao quanto do vazio ainda levo
Percebo o meu destino aonde cevo
A morte quando dela alma depende.

32937

Jorrando dentro em mim inferno e chama
Pendulando por faces agressivas
E nelas as montanhas mais cativas
Geradas pela fúria em pleno drama
Se resolutamente uma alma clama
E tenta noites claras permissivas
As horas em que tantos sonhos privas
Mergulham no passado e nada trama
Sem amas, serviçais porra nenhuma,
A vida com certeza se acostuma
À torpe liberdade em gozo e festa;
Errático planeta desmembrado
Do todo que já fora emaranhado
Demonstra a cara amarga e nada presta.

32938

Distância não conheço e nem queria
Saber do sofrimento desta ausência
Amor quando se faz em anuência
Permite a bela noite em voz vadia.
A chuva desabando não traria
Sequer a dor precoce em penitência
Ao menos santidade na clemência
Da qual e pela qual o sonho guia.
Resumo de uma vida em tempestade
Porquanto cada engano desagrade
As lutas vão travadas entre céu e mar,
E quando poderia estar perdido,
Encontro finalmente este sentido
No tanto que aprendi contigo a amar.

32939

Relembro deste beijo em noite clara
Serena madrugada gozo à plena
E ainda ao reviver a velha cena
A bela melodia se declara,
E toda a fantasia já me ampara
E nela se percebe quando acena
A sorte noutra face mais amena
E nega qualquer dor nesta seara,
Beijando a tua boca noite imensa
A vida traz assim a recompensa
De quem se quis feliz e não sabia
Que toda a maravilha se resume
No quanto deste sonho a vida assume
E transforme em calorosa, a noite fria.

32940

Nada do que pudesse ser maior
Que amor entre os sentidos mais perfeito,
E quando noutra senda me deleito
Tomado pela fúria do suor,
O beijo transformando num acorde
E nele toda a música se faz
Traçando com ternura fogo e paz
No quanto tanto gozo se recorde,
Amar e ser feliz sem ter perguntas
As almas delicadas quando juntas
Percorrem infinitos sem saber
Do quanto se pudesse ser além
Vivendo esta beleza que contém
A sorte inusitada de um prazer.

32941

Não pudera saber da tempestade
Que tanto se escondera dentro em nós
E quando me percebo noutra foz
A voz do meu passado ainda invade,
E tanto quis viver felicidade,
Mas a vida inclemente, vil algoz,
Restando totalmente impune e atroz
Não deixa qualquer sombra que inda agrade,
A chuva que ora vem torrencial
Entorna no meu peito em desigual
Caminho e se transforma em dor e mágoa
Pudesse ser feliz, ao menos isso,
Mas quanto mais eu vejo movediço
Meu mundo no vazio já deságua...

32942

Notícias variadas que mandaste
Falando de momentos mais felizes
E quando dia a dia contradizes
Eu vejo a falsidade feita em haste,
A vida se condena a tal contraste
E nela se percebem tantas crises
Geradas pelos medos e deslizes
Diverso caminhar onde traçaste
Futuro desvairado e sem sentido,
Deixando uma esperança em pleno olvido
E neste nada ser eu me revendo
Após o contumaz caminho em vão
Bebera com certeza a direção
Do vento noutro tanto me movendo.

32943

Negar a realidade é como ser
Especular retrato de outra face
E ainda que a verdade te desgrace
Melhor é prosseguir e perceber
Irradiante brilho a se sorver
E nele não deixando algum impasse
Porquanto mesmo a vida já não grasse
Entranhas mais diversas do querer.
Não quero mais nem lágrimas ou dor,
Viver o falso brilho de um instante
Aonde se imagina um diamante
Melhor do que ao vazio se propor,
E tanto enamorado quanto vivo,
Dos sonhos mais audazes não me privo.

32944

Às custas deste sonho sigo em frente
E tanto poderia se não tento
Ao menos o que manda o pensamento
E nele toda a glória se apresente
Amor quando demais nunca apascente,
Mas mesmo sendo assim louco e sedento
Não tendo outro caminho nem invento
Momento aonde o mundo se apresente
Da forma mais diversa que seria
Gerada pela paz e fantasia
Trançando por espaços siderais,
Vivendo a cada instante sem buscar
Respostas que inda possam disfarçar
Apenas desejando e muito mais.

32945

O tempo diz do quanto é necessário
Seguir contra a maré, mesmo pudesse
Vencido pelo fogo que se tece
Gerado pela insânia, vão corsário
O mundo não se mostre noutra messe
Tampouco restaria ainda a prece
Tocado por terror imaginário.
Vivendo sem perguntas, por viver,
E sem saber de falsas luzes vejo
O tanto que procuro noutra senda
Aonde todo amor a vida estenda
E mostre o serenar de algum desejo.

32946

Retorno do passado aonde eu quis
Beber esta seara divergente
Porquanto cada dia se apresente
Diverso do que outrora e por um triz
Vencendo o meu olhar, riscado a giz
No espelho aonde o mundo é penitente
Enquanto novo verso não invente
Ainda continuo este aprendiz.
Sonhando sem fronteiras, nem limites
Além do que talvez inda acredites
Caçando cada sombra do que eu vira,
O parto necessário à liberdade
Por mais que o dia a dia já degrade
Mantém com toda a força a imensa pira.

32947

Não restará mais nada após o sol
Seguir o seu caminho suicida
Assim ao se mostrar o fim da vida
Num ato indescritível, sem farol,
O quanto poderia ainda em prol,
Mas vejo esta seara em despedida,
E nada se mostrara em face erguida
Matando o que se fez de girassol,
E quanto da harmonia se perdeu
A terra se inserindo em pleno breu
Mortalha derradeira desta a quem
Pensara ser maior, mas na verdade
A cada novo tempo mais degrade
Deixando no passado o que contém.

32948

O tempo se perdera e a juventude
Depois de desabar em cenas falsas
Procura com terror almas descalças
E delas quer que o sonho ainda mude?
Não posso discernir nova atitude
E quando as ilusões deveras calças
Esqueces das estradas, perdes balsas
E ainda se deseja quem saúde?
Noutra face mentiras demonstradas
Renegam as dispersas vis estradas
Molduram no passado a torpe tela,
E assim o quanto pude e nunca veio,
O mundo se afigura mais alheio
Nem mesmo a fantasia se revela...

32949

Refiro-me ao vazio como tento
Vencer os meus anseios contumazes
E sei da vida em fúria, tantas fases
E sigo mesmo assim em desalento,
Eu quero a solução do sofrimento
Em ares mais terríveis e mordazes
E neles o carinho que me trazes
Não serve nem pudesse de provento,
Calçado nesta incrível sensação
Do mundo sem amor e sem perdão
Perdida serenata em lua cheia,
Ao menos a mortalha ainda aquece
E nela toda a sorte já se esquece
Enquanto a fantasia me rodeia.

32950

Revivo com tristeza cada passo
Aonde no passado poderia
Vencer com suavidade e calmaria
O mundo novamente noutro traço
E ainda se tentando nada traço
Senão a mesma face escusa e fria,
O quanto já perdi da alegoria
Vivendo sem caminho e sem espaço,
Resido no momento mais atroz
Aonde se pudesse ser a foz
E sei que na verdade nada existe,
O peso de uma vida não suporta
Quem tenta arrebentar assim a porta
Com olhar amargo e duro sempre em riste.

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