sexta-feira, 18 de junho de 2010

1

Há um tempo de partida e de chegada
Momentos tão diversos, mas iguais
Nos movimentos que rotacionais
Demonstram fielmente esta jornada,
A noite se entregando em alvorada
Os dias mostram mesmos rituais
Depois adentra a lua em meus umbrais
Na escuridão a volta completada,
A vida também obedece à regra
O corpo que devora desintegra
E entregue aos tais infaustos sob a terra
Renova-se em diversa forma e assim
Minúsculo começo até o fim,
O ciclo do viver jamais se encerra.

2

Um gole de café, broa de milho,
O cheiro do passado me rondando,
Um tempo mais feliz porquanto brando
E nele quão difícil o longo trilho
Agora anoitecendo este andarilho
Aos poucos noutra forma se mostrando,
O corpo com o tempo degradando
Olhando para neto, neta e filho.
Assim ao me entregar aos devaneios
Percebo a minha vida em tantos veios
E tento adormecer sem mais te opores,
Canteiro da existência se completa
Colheita em festa e dores, frágil seta
Dormitando, sonhando em várias cores.


3

Olhando da janela da existência
Percebo o perecível caminhar
E tento novo dia vislumbrar
Após o meu final em coerência.
O tempo determina uma ingerência
No dia que virá farto a brilhar
E o sol quando de novo vir brilhar
Demonstra a divindade em persistência.
Porém o meu ocaso se aproxima,
O fim de um longo caso em vário clima
E o sol; jamais verei no renascer.
O todo se esvaindo em poucos anos,
Ao contabilizar ganhos e danos,
No fim não tenho nada a receber.

4

Procuro algum nuance de um momento
Aonde pude mesmo acreditar
No sonho mais distante e até tocar
Com tal sofreguidão o intenso vento,
E quando uma saída busco e invento,
Não tendo quase nada, ausente mar,
O mundo se mostrando devagar
Olhar permanecendo mais atento,
O pouco que eu continha já se fora
De uma alma etereamente sonhadora
O fim em placidez e negação,
Assim ao me entregar à correnteza
Após o meu final, leda incerteza
Restando-me no fim, contemplação.


5


O tempo não perdoa, mas alenta,
Agrisalhando os sonhos, nada resta
Nem mesmo da esperança mera fresta
Apenas o crepúsculo sustenta.
Uma alma juvenil, tanto sedenta,
Agora no final ao nada empresta
E assim cada momento a vida gesta
Até que no final de mim se ausenta.
Repastos tão diversos, sonho e medo,
Ao pantanal e ao lodo eu me concedo
Sabendo ser a sorte desta forma,
Do exuberante ser que aqui reinara,
A ossada demonstrando a vera cara
E em pestilência a vida se transforma.


6

Não pude navegar em mares tais
Aonde vislumbrara ancoradouro,
A própria vida fora o meu tesouro
Envolta em pestilências e cristais.
Momentos muitas vezes desiguais
O sol mesmo escondido, onde me douro,
Do sonho de ser mais, imorredouro,
Ao nada em duros frios funerais.
Perguntas sem respostas eu carrego,
Em plena claridade andando cego,
Galgando os mais profundos ermos da alma,
Um ser em turbulência e inconstância,
Senilidade sorve a mera infância,
E incrível que pareça, isto me acalma.

7

Ainda que tivesse alguma paz
Na turbulenta e vaga juventude,
O quanto muitas vezes já se ilude
Ou mesmo nada doma ou satisfaz
Gerando um passo além, e nisto audaz,
Mudando passo a passo de atitude
Olhando mansamente arisco ou rude
Nesta inconstância lúdica e tenaz
Eu vejo este retrato em mutação
Diversidade dita uma emoção
E quando se imagina mais constante
O passo se transforma num instante
Momentos mais diversos se verão
Do pouco um novo brilho que agigante.

Nenhum comentário: