quinta-feira, 3 de junho de 2010

35091 até 35100

1

Indefiníveis sons adentram quarto
E quando me percebo estás aqui
Depois de tanto tempo que a perdi
Um sonho desde quando não me aparto,
Qual fosse o renascer de um velho parto
Envolto em tuas sombras me embebi
De novo deste amor que vivo em ti
Não fora quando morta a percebera,
Refaz-se novamente desta cera
A vela que nos guia e me transforma,
O quanto tantas vezes procurara
E ausente dos meus olhos, doce Lara
Agora ressurgindo etérea forma.

2

Aonde se pensara em harmonias
Por vezes discrepâncias mais diversas
Imagens do passado aonde imersas
As sombras dos meus vários, torpes dias.
E quando de teu cheiro me embebias
Os olhos outros mares buscas, versas
E como revivesse tais conversas
E nelas tantas dores e alegrias,
Um dia ao te perder, Lara querida
A morte te roubando desta vida,
Apenas mera sombra me acompanha,
Aguardo o meu momento e nada mais,
Quem sabe nas angústias terminais
Eu possa reviver divina sanha.

3

A vida em seus ocasos talvez possa
Traçar dentro de mim nova esperança
E quando no vazio a voz se lança
Buscando esta lembrança minha e nossa,
O quanto disto tudo a alma remoça
Enquanto à morte o corpo agora avança
E tento reviver cada aliança
E nela o sofrimento então se adoça.
Revivo esta presença de quem fora
Uma alma tantas vezes redentora,
E agora ao poder ver Lara de perto,
Depois de quantos anos, solidão,
A morte redimindo vejo então
E entorpecido e absorto, eu me desperto.

4

A dor se resumindo no que tanto
Deixara para trás na longa vida,
Seara onde julgara já perdida
A sorte onde desejo eu acalanto,
Olhando no meu quarto o velho manto,
Imagem preservada, a despedida
Do sonho, aonde tanto enternecida
Minha alma se afastara do quebranto.
Mas quando me percebo e não estás,
Aonde imaginara haver a paz,
Imensa turbulência se declara,
O mundo tão vazio desde quando
A morte dos meus braços te tomando
Levou-te para sempre, amada Lara;

5

Apenas são visões do meu passado
Rondando cada instante que inda vivo,
E quando destes sonhos eu me crivo
O tempo noutro tanto disfarçado,
O quadro se mostrando emoldurado
Nas fantasias raras que cultivo
E sei que tão somente eu sobrevivo,
Buscando qualquer sombra aqui do lado
De Lara, uma lembrança ainda viva
E quando deste olhar a sorte priva
O mundo se perdendo, pouco a pouco,
Rondando na procura insaciável
Revelo o tempo amargo e inconsolável
Em pleno desvario, insano, louco...


6

Dos cânticos que tanto serenavam
Minha alma em tempestades tão freqüentes,
Agora quando estão de mim ausentes
Meus olhos por teus olhos procuravam,
E quando noutros tempos mergulhavam
No todo que deveras apresentes
Embora em outro mundo eu que sei sentes
As lágrimas nas quais olhares lavam.
Busquei-te na completa insensatez
O todo num instante se desfez
Sem Lara, minha vida nada vale,
O tanto que pudera ser diverso
Não fosse o mundo vão tolo e perverso,
Aonde quem se adora o tempo cale.

7

Vivendo de Lara
A viva presença
A saudade imensa
Assim se declara
Onde não se ampara
Sequer se convença
Partir sem licença
Em noite tão clara,
E agora que vejo
A sombra, um desejo
Domina meu verso
E quanto mais quero
O mundo tão fero
Se faz mais perverso.

8

Dos sonhos surdinas
Calando esta voz
Um tanto feroz
Mas logo fascinas
E quando dominas
Qual fosse um algoz
Lembrando de nós
Cenas cristalinas,
A sorte levara
Meus olhos de Lara
E nunca mais vira,
Assim o que resta
Da vida funesta
É leda mentira.

9

Em flébeis caminhos
Olhares vagando
No tempo sem quando
No quanto mesquinhos
Os dias sozinhos,
A morte rondando,
O quanto foi brando
Agora em espinhos,
Viver sem te ter,
Ausência em querer,
E Lara distante,
O mundo não pára
Porém viva escara
Fatal, degradante.

10

Olhar soluçante
Procura quem tanto
Num rito e num canto
A vida agigante
Um tempo brilhante
E nele acalanto
O sonho em que encanto
Um último instante
E quando sem Lara
O quanto foi clara
Agora é brumosa,
Querida lembrança
Que à noite me alcança
E a faz majestosa.

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