quarta-feira, 16 de junho de 2010

37101 ATÉ 37120

1


Valei-me neste instante mais sombrio
A imagem do que pude acreditar
Diverso dum intenso caminhar
Aonde poderia em desvario
Seguir o passo aonde desafio
As hordas mais distintas; navegar
Falena procurando algum luar
Adentrando este mar imenso e frio,
Não tendo mais a sorte que pudesse
Traçar outro caminho; resta a prece
E sei dos fúteis dias que virão
O peito se entristece e tão somente
A morte a cada passo se apresente
Tomando do meu barco este timão.

2

Procuro a cada passo ter ciência
Da vida após a morte, e em nada creio,
Apenas algum sonho gera o anseio
E a sorte se mostrando em inclemência,
O sonho gera a turva consciência
E tantas vezes busco e já rodeio
Tento acreditar em frágil veio
E nele se possível providência,
Mas quando desta ausência sigo certo
E as tramas de um futuro ora deserto,
Minha alma se moldura em vã tristeza,
Afasto o quanto tive em fantasia
E apenas o vazio em mim se cria,
Negando qualquer forma de surpresa.

3

Modelos de esperança; eu já não tento,
Apenas creio enfim na treva após,
E sendo na verdade mais atroz
Do quanto nada existe em provimento,
As ânsias mais vulgares, sofrimento,
Calada deste sempre alguma foz,
O porto se mostrando em frágeis nós,
A morte na verdade é meu provento.
Eu tive em tola infância imagem vaga.
Porém o dia a dia entranha a chaga
E toda a realidade se desnuda,
Minha alma se inda houver, busca a saída,
E morta após cessada a minha vida
Agora silencia, e segue muda.


4

Bradara inutilmente vida afora
Tentando perceber alguma luz,
Mas quanto mais o sonho ali eu pus
Mais forte a realidade que devora
O barco sem um porto não se ancora
Apenas ao vazio me conduz,
Do corpo decomposto, mero pus,
A vida em tom feroz morte devora,
E sei do quanto inerme e decomposto,
O corpo num momento sendo exposto
Em mesas funerais, velas e cenas.
Mas nada lembrarei sequer da vida,
A carne pouco a pouco apodrecida
Só levará os ossos, e isto apenas...


5

A morte se prepara e impunemente
Prepara este vazio após e além
Do todo que me momentos se contém
Apenas o não ser já se apresente,
Um corpo e decomposto, eis somente
O quanto fora em vida, dor, desdém,
Amortalhada cena quando vem
Demonstra a derrocada plenamente.
Sem nada que alimente uma esperança
Assim a minha história agora avança
E nada na verdade me redime,
Dos funerais, esquifes, tolo olvido,
O meu caminho há tempos decidido
Enquanto uma esperança se suprime.

6

Oponho-me às diversas esperanças
Sabendo da sombria realidade,
O corpo morto enquanto se degrade
Em turvas e terríveis alianças
Preparam-se diversas comilanças
No quanto se vendendo a falsidade
A mera fantasia, nova grade,
E nela em luzes turvas tu te lanças,
Sonhando com a vida após o fim.
Arcanjo, algum demônio, um querubim.
Presenças que inventaste em proteção,
Do nada ao mesmo nada retornando,
Cenário nem tão brando nem nefando,
Apenas verdadeira exposição.

7

A natureza humana é tão cruel
Que nada poderia redimir,
Nem mesmo uma esperança de porvir
Gerada em duro inferno ou claro Céu,
Assim ao se mostrar em mel e fel,
O quanto desta fera há de existir
E nela sem saber do que há de vir
Cumprindo sua etapa e seu papel,
Num ciclo feito em vida e morte apenas
Enquanto as crenças tolas te serenas,
Realidade brusca, tu renegas,
Andando sobre a Terra por instantes
Os seres mais venais e degradantes,
Vagando sem destino sempre às cegas.

8

Insaciável fera não se cansa
De exterminar a vida e não refaz
Senão noutro formato tão mordaz
Deixando no passado uma esperança,
O ser que se entranhara em tal pujança
Um velho guerrilheiro alheio à paz
Enquanto a cada passo se desfaz
Na ponta do fuzil, na bala ou lança
Aos poucos decomposto em treva imensa
Em nova chance, estúpido já pensa
E assim desfila em vida; soberano,
Mal sabe que depois dos funerais
A frase a ser ouvida é nunca mais.
Legado que teremos; desengano
E a profusão de vermes e bactérias
Decompondo ao final as vãs matérias.

9

A fome insaciável destes seres
Aonde o nosso corpo em podridão
Demonstra no final a negação
Do quanto mais pensares e quereres,
Ainda muito aquém dos tais poderes,
Momentos mais atrozes se verão
E neles a terrível solução
Enquanto num final apodreceres,
Resíduos, meros ossos, por enquanto,
Depois de certo tempo, não me espanto
Sequer de ti sinais por sob a Terra
Aonde em armas vis tanto mataste,
Agora sendo o leito em tal contraste
E nela uma esperança já se enterra.

10

Consórcios de diversos animais
Ousando devorar cada pedaço,
Aonde no passado, houvera espaço,
Agora faces podres, terminais,
E tento adivinhar possível cais
E quando me percebo e nada traço,
O engodo em que entranhara não mais grasso,
E bebo destes ritos funerais.
Ocaso tão somente o que me espera,
Invés da imensa e torpe, dura fera,
A profusão de vermes tão minúsculos,
Assim se perfazendo ao fim da vida,
Dos sóis a derradeira despedida
Surgindo após somente tais crepúsculos.

11

Até chegar momento aonde eu possa
Vencido pela morte, ser ao menos
Mais útil do que fora, pois serenos
Alentos que esta podre face acossa.
Jogado sem defesas numa fossa,
Bebendo os derradeiros bons venenos,
Os dias de viver foram pequenos,
A sorte a cada passo já destroça.
E o vento do futuro segue alheio,
Enquanto morto sirvo de recreio
Aos ermos animais e os alimento,
Assim do quanto fora mais perfeito,
Agora ao penetrar último leito
Resulto neste vão, torpe excremento.

12

Meu canto em desespero? Nunca mais.
Preparo-me deveras para o fim,
E sei do quanto posso, mesmo assim,
Cerzindo em minhas mãos versos finais,
Ousando na mortalha em germinais
Caminhos renascidos no jardim,
Da podre e decomposta face eu vim
Retornarei aos vãos originais.
O prazo determina a minha sorte,
Na morte nova vida tem aporte,
Diversidade dita a realidade,
Em átomos, moléculas, somente.
Do apodrecido corpo uma semente
Traduz mais fielmente a eternidade.

13

Não vejo inferno ou Céu, prossigo assim
Retorno ao mesmo barro e não reclamo,
Enquanto nesta vida servo ou amo,
Agora liberdade vejo enfim.
Na pútrida visão do que no fim
Pudesse ser diverso do que clamo,
O peso se dispõe, mas cada ramo,
Compõe diversidade em tal jardim.
Da face mais nefasta esta verdade
No corpo que a mortalha já degrade
Transformação diversa se percebe,
De um se altivo e torpe, pelo menos,
Refeito em vermes frios, mas amenos,
Florada garantida nesta sebe.


14

Assento procurando aonde em dores
A vida não pudera mais conter
A fúria e a precisão de já morrer
E nisto sem quereres nem opores,
Vencidos pelas sortes, seus rumores,
Gerando após a vida algum prazer
Banquete sem igual a oferecer
Alimentando abrolhos entre flores.
Não quero perceber sequer a sombra
De uma mortalha vaga onde se assombra
Tampouco quero o luto, hipocrisia.
Ousando muito além, quero o sorriso,
Se a vida fora mero prejuízo
O nada após a morte; redimia...

15

Estâncias onde vejo a negativa
Da dor e do prazer, apenas nada,
Assim ao ser no vão, a alma lançada
Não tendo nem lembrança do que viva,
Rescinde com o sonho em despedida,
Adentra a noite eterna e desolada,
A carne pela vida profanada,
A cada espaço abrindo outra ferida,
Os verses desencarnam, meros ossos,
Assim ao perceber torpes destroços
Não tenho sentimento, dor ou gozo,
Porém na inércia imensa aonde adentro
Ao menos no banquete estou no centro,
Momento derradeiro e majestoso.

16

A inveja, a dor, soberba, a vaidade
O quanto em orgulhoso caminhar
Fizeste desta vida um lupanar
E agora a cada instante se degrade
O quanto se moldara em majestade,
A carne a cada instante a demonstrar
Do todo que pensavas, a vagar,
Apenas só restara a iniqüidade.
Legado de uma vida espúria e vã
Futuro dita a face mais malsã
E teimo vez em quando noutro rumo,
E quando me percebo em morte, eu sinto
O todo imaginário sendo extinto,
E aos poucos no vazio eu me consumo.

17

Levado pelas mãos das ilusões,
Durante muito tempo acreditei
Na vida após a morte, nobre grei,
E nela com ternura exposições
Que agora percebendo quando expões
Medonha face aonde mergulhei,
E nada do que tanto procurei,
A morte não transforma em decisões,
Os erros nem acertos, sem Juízo,
Não levo nem a dor e nem sorriso,
Apenas este corpo perecível,
Não sou ateu, porém não acredito
No quanto de outro mundo ou infinito,
A vida se resume aqui e só.
Renova-se em faceta bem diversa,
E quando sobre o nada o passo versa
Preparo-me decerto para o pó.

18

Onipotente imagem que criaste
De um ser que controlasse cada passo,
Vagando sem destino pelo espaço
E nele bem ou mal, duro contraste,
De toda esta existência além da haste
O marcador em sórdido compasso,
Medíocre camarada agora lasso,
Da luta sem descanso, sem desgaste.
Imaginário ser, apenas isto.
E sei que na verdade ainda existo
Por uma criação divina, é certo.
Mas sem juízo sobre cada fato
Onipresente ser? Um desacato,
A morte te transforma num deserto.

19

Um Deus imaginário que nos traça
Destino ou mesmo julga desvarios,
Assim ao perceber os turvos rios
No céu feito em terror, treva e fumaça,
Imaginando o quanto já se passa
E nestes dias teimo em desafios,
Manter da integridade finos fios,
Deixando muito além qualquer trapaça.
O esgoto em que se fez este planeta,
Aonde sem pudor já se cometa
Insanidades tantas, Deus existe?
Uma esperança tosca e tão tardia,
Enquanto a própria vida desafia,
O ser humano esgarça e em vão persiste.

20

A sede de um reinado sobre tudo
Seria muito além do imaginário,
Um pai fantasiado de corsário,
Perdoe, mas no fundo eu não me iludo,
Se este cenário torpe não transmudo
O dia se moldando temerário,
Ainda que eu persista solitário
O velho coração, em pouco é mudo.
Não quero redenções tampouco ritos,
Nem mesmo me interessam infinitos,
Amor, perdão, a paz e a liberdade,
Sinônimo real: felicidade,
Não penso e não cobrando eternidade
Pouco me importa lendas, velhos mitos...

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