domingo, 20 de junho de 2010

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1

Jamais mendigaria algum perdão
Nem mesmo pediria esta clemência
Aonde se faz rara turbulência
Meu passo segue em nova direção,
Embora deste pouco ou tanto o não
Transcorre sem a mínima ingerência
Além do que me cabe em consciência
Outros momentos sempre moldarão
Em tantas faces quantas necessárias
As ânsias ou as turvas procelárias
Independente mesmo do querer,
Caminho entre penhascos e rochedos,
Os ermos que adentrando; mesmo ledos,
Traduzem toda a essência do meu ser.

2

No referver dos sonhos, as promessas
Diversas que entranhara e já não tenho,
O mundo em mais complexo desempenho
Aonde descaminhos tu confessas,
Ao nada ou quase tanto te endereças,
Num ato tão cruel quanto ferrenho,
E mesmo sem regalo não retenho
Palavras quando inúteis, mal expressas.
Aprendo em pestilência a minha estrada
E quanto mais a vejo; degradada,
A angústia dominando o verso e então
Das farpas costumeiras e venais
Demonstro os meus receios mais banais
E busco inutilmente a solução.

3

Esquálida figura cavernosa
Espúria criatura que acalanto,
E muitas vezes; busco, mas, portanto
A realidade adentra e logo glosa.
Se a senda mostra a face pedregosa
Aonde se espalhara tal quebranto,
Ainda uma esperança, tolo, eu planto
E teimo no deserto, busco a rosa.
Afoito muitas vezes, já se atreve
O passo contra a fúria e mesmo breve,
Apenas encontrando este vazio.
Perguntas sem respostas, mero engano,
A divindade gera o roto pano
Enquanto cada engodo em vão, desfio...

4

Voltando à própria terra em sepultura
Não levarei mais nada do que um dia
Talvez pudesse haver em fantasia,
A morte muitas vezes já nos cura.
E quando me entranhara em amargura,
O pouco desenhado em heresia
Depois de certo tempo esta ironia
Permite ver o mundo com brandura.
Mas nada temo ou mesmo quero além
Do quanto aqui e agora ora contém
E sei o quanto é vaga uma esperança,
O olhar procura apenas o descanso,
E quando sob a terra, enfim me lanço,
O nada em plenitude e em paz se alcança.

5

Da sorte, muitas vezes vendavais
Ou tantas calmarias reticentes,
Esquálidas imagens tu pressentes
Ou atos tolamente magistrais,
Não quero e nem preciso ter a mais
Do quanto em realidade me apresentes,
Os olhos do futuro vão ausentes,
Aguardo tão somente último cais.
Não guardo mais venenos nem rancores,
Tampouco desenhando em raras cores,
A treva que decerto se anuncia.
Jogado sob o solo, nada levo,
Jamais imaginara ser longevo,
Vivendo o dia após o velho dia.

6

Procuro pela praia em mansa areia,
Não temo algum naufrágio, nem procela,
O tempo se mostrando em franca vela
O mar do início ao fim, tudo permeia.
Se uma ânsia juvenil nos incendeia,
A mansa face o inverno nos revela
Mudando o claro tom da mesma tela,
A dita segue sempre vaga e alheia.
Nem albatroz; sou frágil andorinha
Migrante no final, em paz se aninha
E busca o seu descanso terminal,
Depois desta jornada em riso e pranto,
Num último revôo eu me levanto
E volto ao mesmo ponto, original.

7

Pousando em teus cabelos minhas mãos
Sentindo a maciez do teu perfume,
No quanto ao sonho frágil me acostume,
Os sonhos são dos dias artesãos.
Depois ao penetrar nos ermos chãos
Ausente algum olhar, sequer um lume,
Gerando em nova forma um bom estrume,
Cevando com firmeza novos grãos.
E deles a florada garantida
Renasce de outra forma o que era vida
E neste florescer, suave aroma.
Num cíclico caminho sem tormenta,
A morte quando a vida ela alimenta
Tocando os teus cabelos, nada a doma.

8

Ondulações suaves desta vida,
Em meio aos mais complexos caminhares,
Por quanto tantas vezes tu lutares,
A luta desde sempre está perdida.
Não vejo outra verdade sendo urdida,
Tampouco quero além dos vãos sonhares,
Se eu trago desde o início em mim os mares,
A história transformada é repetida.
Um rapineiro apenas, meramente,
Da morte tão somente me alimente
E após o meu final serei servido
Ao fabuloso ciclo renovável,
Tornando assim o mundo mais arável,
Dando ao viver enfim, algum sentido.


9

Não creio nos mistérios da existência,
Nem mesmo quero um dia uma resposta,
A vida sobre a mesa estando posta,
É mera e tão sutil coincidência,
O todo se refaz de uma excrescência
A morte traz à vida outra proposta
A peça que se perde então reposta
Sem medo, sem pudor e sem clemência.
Não há qualquer caminho que não esse
Aonde toda a sorte se tecesse
Da forma mais suave e verdadeira.
Não busco alguma luz se já a concebo
Agradecendo sempre o que recebo,
E um dia devolver de outra maneira.

10

A Terra com seus seios majestosos
Dessedentando a fúria dos humanos,
Em atos mais audazes e profanos,
Caminhos sempre torpes, pedregosos.
Os olhos muitas vezes caprichosos
Adentram com furor, provocam danos,
E os vejo sem remédio, pois insanos,
Em atos tão cruéis voluptuosos.
Cenário em decadência, mero esgoto,
Este equilíbrio há tanto vejo roto
E a mãe de seios farto sucumbindo,
À fome inesgotável de seus filhos
Ousando penetrar nos ermos trilhos,
Matando e destroçando o que foi lindo.


11

As aves voltam sempre aos velhos ninhos
Depois das migrações, eis a verdade
E quando do viver a liberdade
Buscando com certeza outros caminhos,
Por vezes te parecem mais daninhos,
Mas nada que deveras desagrade,
Romper esta barreira, torpe grade,
Ao menos não seremos mais mesquinhos.
Um ato de nobreza dita morte
E geras desta forma um novo aporte
Restituindo à Terra o que foi dado.
E nesta certa ausência coerente
A morte redentora se apresente
E a vida que renasce é seu legado.

12

O sol inexorável doma a cena,
E após a tempestade renascendo
No todo dominando este estupendo
Senhor, o pai da vida, me serena.
A sorte noutra dita concatena
E gera novo tempo se tecendo
Na face deste além se desfazendo
Verdade que se mostra clara e plena.
Qualquer mudança gera o desconforto,
A ausência de algum cais, nefasto porto
Abortos se fariam; nada além
O refazer magnífico da vida
Nesta manhã sublime percebida
Único segredo em si contém.

13

Inunda-se de vida o matagal
E sobre corpos mortos, decompostos,
A vida cobra à vida seus impostos
E traça este sublime ritual,
O refazer após o original,
Apresentando assim os seus propostos
Não tendo nem prazeres nem desgostos,
Um ato simplesmente magistral.
Cristalizando ali dura verdade
Numa óptica diversa se degrade
O que em realidade se refaz,
A morte é base eterna de uma vida,
Encontro consumindo a despedida,
Cenário se mostrando assim tenaz.

14

Um raio de existência meramente
Reboa sobre a Terra num instante
Depois noutro vazio se garante
O renovar jamais deixando ausente
Além do que em verdade se apresente
Um ato corriqueiro e fascinante,
Não há sequer um ser que é dominante
Num cíclico caminho onde se sente
Uma importância igual e sem divisas,
Se existem tempestades sei das brisas
E tanto é necessário o fim à vida
Do verme no futuro te matizas
A sorte noutra sorte consumida
Não há sequer ausência ou despedida.

15

A luz em plenitude segue à treva
Assim existe e sempre existirá
O fato é corriqueiro aqui ou lá,
Independendo mesmo desta ceva,
Aonde o pensamento já nos leva
A etérea persistência domará
Sem ter Tupã, Javé sequer Alá
Na renovável face da existência
Não vejo sequer luz ou inclemência
Apenas a diversa maravilha
E nela muitas vezes se anuncia
Em pleno temporal o claro dia,
E o sol mais cedo ou tarde enfim rebrilha.

16

Aonde houvera ao menos um clarão
Agora em turbulência vejo a vida,
E sei do quanto a sorte é preterida
Em torno desta nuvem, rente ao chão.
Os dias noutra face moldarão
Realidade turva, mas sentida
E quando se percebe esta ferida,
Jamais imaginei a solução.
O fato de existir não me permite
Por ter abençoado e bom limite
Ousar além do quanto eu poderia.
Futuro tem apenas a incerteza,
De tanto navegar, a correnteza
A cada tempo vejo mais sombria.

17

Cedendo à força imensa desta enchente,
Não tendo outra saída, me entreguei,
E quando se obedece à norma e à lei
Já nada no amanhã, pois se apresente.
Ainda quando incerto rumo eu tente,
As marcas do que fui carregarei,
E a sombra desenhando a nova grei
Somente um ar nefasto e decadente.
Outrora no apogeu, agora em queda,
Minha alma no vazio se envereda
E bebe a realidade mesmo amarga,
A vida em plenitude já se esvai,
O pano sobre a cena se descai,
O apego ao solo, aos poucos, pois, me larga.

18

Olhando para a mina, rara fonte,
Percebo que esta foz já se aproxima,
O tempo muda rápido de clima,
E o nada desta forma ora se aponte,
A vida na verdade é frágil ponte,
Entre os vazios; logo se suprima
E quando a realidade enfim se exprima
Não vejo nada além deste horizonte.
Envelhecido e nunca envilecido
Cansado, pelo tempo consumido,
Aguardo tão somente o mero fim.
Já não reluto mais, apenas sigo.
Do nascedouro até o meu jazigo
Sem anjo nem demônio ou querubim.

19

Aonde em ardentias juvenis
Buscara a inconseqüente maravilha,
Agora o nada ser a alma palmilha
Não sendo nem tristonha nem feliz,
Não tendo e nem pretendo o mais que quis
Apenas prosseguindo a minha trilha
E nela a poesia se polvilha,
Mais forte do que o senso eleva e diz
Pressinto em abandono a solidão,
Nos ermos mais fecundos deste chão,
E ali descansarei depois da luta.
Porquanto a vida entranha e nos doma,
Depois já num torpor ou mesmo coma,
A morte com certeza é mais astuta.

20

Acordo e permanece vivo apenas.
Os olhos sem buscar qualquer caminho,
Retorno à poesia; e ali me aninho
Vivendo ou inventando tantas cenas.
As horas no teclado são serenas,
O mundo se é cruel tolo ou mesquinho,
Se eu levo esta roseira ou vago espinho,
Verdades absolutas, falsas plenas
Assim me extasiando em palavras,
Ousando nestas vagas, tolas lavras,
Aonde se transmita a quem me escuta
O pouco ou muito ou nada que carrego,
Nem vaias nem aplausos tocam o ego,
Refúgio terminal, última gruta...

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