quinta-feira, 1 de julho de 2010

39401 até 39500

1

Esqueço o meu caminho enquanto tento
Vencer vicissitudes tão normais
De quem ao procurar pelos astrais
Liberta sem defesa o pensamento,
Envolto por total deslumbramento
Anseio e na verdade busco mais
Que simples devaneios espectrais
Ou mero lume em belo provimento.
Perguntas sem respostas; gigantescos
Caminhos entre corpos mais dantescos
Maiúscula e sobeja divindade
Distâncias astronômicas, etéreos
Emanações e eflúvios tais, sidéreos
Além do que pensara imensidade.

2

Imensos os caminhos que talvez
Permitam navegar por tantos mares,
E quando mal sentires ou notares
Além do que em verdade ainda vês
O mundo revelando insensatez
Destrói da própria Terra seus altares,
Destroça a Natureza que aos olhares
Do Espaço apresentando esta nudez.
Dos verdes entre azuis, belos matizes
Agora meramente cicatrizes
Lanhando sob um céu turvo e grisalho,
Assim ao perceber esta agonia
O fim em dor e treva se daria
Enquanto eu mesmo a fúria; em vão, espalho.

3

Espalho pelos ventos a canção
Que possa ainda um dia redimir
Os erros cometidos e o porvir
Não seja tão cruel desolação,
Eu sei; os novos dias mostrarão
Um ar talvez mais puro de sentir
Ou mesmo a solução e presumir
Na Terra o renovar de uma estação.
Mas quando se percebe a realidade
E a cada novo engano que a degrade
Apenas a mortalha se tecendo,
A roupa tão sobeja que em frangalhos
Parece feita apenas de retalhos
Cerzindo com furor cada remendo.


4

Remendos que apresento invés de versos
Pulsando dentro em mim esta vontade
De crer e de sentir saciedade
Embora os dias mortos e submersos,
Anseio por caminhos mais diversos
À sombra desta deusa liberdade,
Mas quando vejo a fúria em realidade
Olhares me rondando e são perversos.
Ascendo ao meu hermético delírio
E tento adivinhar mesmo em martírio
Revelo com angústia o sentimento,
Quisera ter ao fim discernimento
Vencer os dissabores, mas no fim,
A sórdida aridez toma o jardim.

5

Em áridos caminhos percorrendo
O mundo atrás de sombras que inda trago
Do tempo aonde apenas um afago
Seria muito além do mero adendo,
E quando as cores várias percebendo
A lua prata deita sobre o lago
E o vento do passado, sem estrago
Aos olhos do poeta esmorecendo.
O coto da esperança perambula
E apenas no final regendo a gula
A farsa se mostrara vil falácia,
O todo se esvaindo pelas gretas
Além do sonho aonde te arremetas
A fúria desumana em plena audácia.

6

Se audaciosamente eu quis um dia
Sentir as novas luzes de um passado
Há tanto pelo tempo abandonado
Sangrando dentro em mim torpe ardentia,
O pouco ou quase nada que se via
Desértico delírio desolado
O vento sem sentido, o verso ousado,
A morte inevitável reinaria.
Mas quantas vezes tento e não consigo
Sentir além do medo e desabrigo
A paz que tão somente quis sublime,
Mas ergo o meu olhar, sem horizonte
Sem ter sequer um rumo que se aponte,
Apenas o vazio me redime.

7

Apenas o que tento vez em quando
Pudesse transformar o velho sonho
Agora em cada verso onde me ponho
O manto se tecendo ou desbotando,
O rumo se perdendo ou retomando
Caminho onde julgara ser risonho
Tentáculo espasmódico e medonho
Aos poucos o cenário devastando.
Sem marcações de texto a peça segue
E quando aos meus temores vou entregue
Vestindo este histriônico fantoche.
O público, a platéia se delira
Enquanto me puindo em cada tira
Ainda há quem sorria e inda deboche.

8

Sorrir e procurar algum alento
Em meio aos meus diversos passos creio
Ser mais que meramente um devaneio,
Talvez alguma fuga; quando invento
Um ar onde sacie o pensamento
Gerando novos rumos em permeio
Do quanto imaginara se esteio,
Apenas vejo o teu alheamento.
Ocasionando a queda deste fardo
Ainda nova luz eu sei que aguardo
Perpetuando o engano onde entranhara
O medo dissimula a realidade
E quando se percebe a novidade
A luz já se apagou nesta seara.

9


À luz de um belo dia eu quis sentir
A doce maravilha de um momento
Aonde me tocando o pensamento
A sorte poderia resumir
O verso como fosse um elixir
E nele se em verdade estou atento
Reveses tão comuns em pleno vento,
A morte se aproxima a redimir.
O herético desenho de uma vida
Há tanto desvairada e desvalida
Esboça-se no olhar, toma o horizonte,
Porquanto ser feliz é o quanto basta,
A cena agora morta e já desgasta
Não tendo mais sequer aonde aponte.

10

A ponte que uniria meus anseios
Aos tantos quando estás aqui comigo,
Apresso-me a vencer crime e castigo
E os olhos continuam mais alheios,
Procuro da esperança sem rodeios,
Mas quanto mais um rumo enfim persigo
Na solidão vazio ora prossigo
Entregue aos mais espúrios devaneios.
Vestir a mesma roupa que há bastante
Gerara uma ilusão e me adiante
O passo rumo ao quanto ainda possa,
Mas quando me percebo em plena queda
Destino no vazio já se enreda,
Sobrando o mergulhar em turva fossa.



11


Mergulho ensimesmado e tento ver
Além da própria queda anunciada
A sorte noutra face desenhada
Gerando qualquer dor ou desprazer
É como se o vazio a se colher
Trouxesse novamente uma alvorada,
Resumo de uma vida não diz nada
Sequer do que pudesse merecer,
Esqueço o meu caminho e tento a sorte
Aonde na verdade não conforte
Nem mesmo o que pudesse ser diverso,
Não tendo soluções, apenas sigo
E tento mesmo ausente um braço amigo
E encontro no horizonte o mero verso.

12

No horizonte distante
O passo segue além
O nada me contém
Ou mesmo me adiante
O rumo doravante
Seguindo sempre aquém
Do todo e nada vem
Somente a discrepante
Manhã ensolarada
Se esta alma está nublada,
São meras ilusões
Os brilhos que tu vês
A vida sem porquês
Os dias em senões.

13


Senão pudesse ser
O tanto quanto quis
Não vejo o chamariz
Nem posso perceber
Ausência do querer
A morte por um triz,
O risco, a poda, eu fiz
Na angústia de conter.
O fato é que persiste
Embora amarga e triste
A noite dentro em mim,
Imensa bruma doma
E tudo nega a soma
A apenas colho o fim.


14


O fim de meus caminhos
Os olhos não são mais
Que meros festivais
Em dores e em espinhos,
Pudessem tão mesquinhos
Ou mesmo atemporais
Os riscos são fatais
E neles descaminhos.
A sorte, a morte o tom
E nada fosse bom
Semente profanada,
A mão que me alimenta
A boca mais sangrenta
A vida em derrocada.

15


De derrocadas tantas
Aonde não pensara
Sequer noutra seara
E nisto não te espantas
Esgarças velhas mantas
E tanto desprepara
O salto desampara
E nele me adiantas,
Somente o nada em mim
Se um dia quis cetim
Somente vi retalhos,
Os cantos e as promessas
Enquanto tu professas
No mundo teus frangalhos.

16

São mundos bem distintos
Os quanto imaginei
E sei diversa grei
Aonde estão extintos
Os dias onde tento
Vencer os meus temores
E sei que sem pudores
Entregue ao sofrimento,
Resumo em verso e dor
O quanto pude outrora
E apenas me devora
A sorte em tal torpor,
Gananciosamente
A vida se desmente.

17


Desmente-se a emoção
No tanto que resumo
E quando sou o sumo
As sendas mostrarão
Ausência de verão
E nisto me consumo
Ou mesmo tomo o rumo
De estrela queda ao chão.
E nesta embriaguez
O todo se desfez
Não resta nem sequer
O torpe caminhar
Aonde te buscar
Sem ter o que se quer.

18

Se queres outra luz
Ou mesmo algum alento
Não vês o quanto tento
E nada se produz,
Somente em contraluz
O risco, o pensamento
E bebo o sofrimento
E dele faço a cruz,
Arcando com meu erro
Preparo cada enterro
Do sonho que eu pudera
Ainda ter no olhar
E nada a se mostrar
Somente a dor e a fera.

19

Somente acreditava
Na fúria de um anseio
E quando a noite veio
E nela dor e trava,
Minha alma se lavava
E neste devaneio
O corte de permeio
A morte desejava.
O pânico que agora
Ainda me devora
Gerando o dissabor,
Talvez inda resuma
Além a velha bruma
Em tempo assustador.

20

Assustadiço passo
Vencido pelas ruas
E logo continuas
Enquanto o nada traço,
Resumo em pouco espaço
O quanto ainda atuas
E bebo estrelas nuas
Ousando em tal compasso,
Riscando do meu mapa
O todo não escapa
E o resto; em mim o vejo
O tanto quanto pude
E agora em plenitude
Amargo este desejo.



21

Amargo sentimento
Tomando a minha vida
E quando sem saída
Ainda mesmo tento
Vencer qualquer tormento
Ou sorte consumida
Nas ânsias da partida
Em puro sofrimento,
Meu verso em dor e pranto
O tanto que me espanto
E nada se conserva,
Minha alma se perdera
E quando percebera
Dos sonhos, mera serva.

22

A mera imagem traz
Apenas este fato
Aonde fora ingrato
E agora tanto faz,
Resumo mais audaz
De um dia em vão retrato
Alheio eu me arrebato
E busco ainda a paz.
Ouvindo a voz de quem
Já sabe e quando vem
Resulta em tempestade,
Olhando para os lados
Os dias vão nublados
Temor, o que me invade.

23

Temores entre enganos
E sei dos versos tais
Aonde originais
Pudessem velhos planos,
Os ermos mais profanos
Os campos virtuais
As horas em cristais
E as quedas dizem danos.
Erguendo alguma voz
E sei que quanto atroz
O canto se espalhara
E aquém do que inda tento
Sobejo alheamento
Domina esta seara.

24

Domino com meu erro
O tempo onde amiúde
Além do que mais pude
Prevejo algum desterro,
E sei do meu enterro
E nisto em atitude
Diversa não se ilude
Quem vive em tal aterro
Dos sonhos e promessas
E quando ali confessas
Erráticos delírios
Somando os meus engodos
Encontro os erros, todos
E sorvo estes martírios.


25

Sorvendo cada gole
Da morte em luz sombria,
O tanto poderia
E o nada já me engole
O corpo o risco a fome
A sorte em novo rumo,
Aos poucos desaprumo
O bote que consome
E vejo a minha lua
Expressamente morta,
Batendo à minha porta
A sombra que foi tua,
Palavra lavra fel
E o mundo em carrossel.

26

Dos carrosséis em sonhos
Medonhas faces tento
E sei deste provento
Em dias mais bisonhos,
Enfrento os enfadonhos
Caminhos, sofrimento
E quando sigo atento
Buscando vãos risonhos
Encontro a queda e o corte
E nada mais suporte
O passo de quem veio
Singrar as esperanças
E quando além me lanças
Da sorte sigo alheio.

27


Alheamento eu vejo
No canto mais atroz
E quase já sem voz
O tanto mais sobejo
O risco de um desejo
O corte onde feroz
Desfaço velhos nós
Aquém do que inda almejo.
Arrisco a caminhada
E sei que nesta estrada
Jamais conseguiria,
Esboço reações
E nada ainda expões
Senão vital sangria.

28

Vitais momentos tento
Sentindo a luz imensa
E nela a recompensa
Expressa o forte vento
E quando em desalento
A morte até compensa
O verso mata a crença
E vivo em sofrimento,
Orgânica loucura
Aonde se perdura
A sina de quem ama
Jogado sobre o solo,
O mundo em medo e dolo
Apaga qualquer chama.


29

Apaga-se esta luz
E não mais tendo além
Do medo que convém
A quem decerto eu pus
O corte e o medo enquanto
Pudesse ainda crer
No mundo onde o prazer
Deveras eu garanto,
Revelo o meu caminho
Em dor e tempestade
E tanto desagrade
O quanto sou mesquinho,
Mas no final das contas
Ao morto mar remontas.

30

Remonto ao que pudesse
Ainda me trazer
Quem sabe o bem querer
Ou mesmo a doce messe,
E nada mais se tece
Senão não posso crer
No todo a esmorecer
E gero em medo e prece
O risco mais cruel
E sei do medo e fel
Aonde não coubera
Senão a minha morte
E quanto mais se corte
Maior e viva a fera


.


31

A fera que apascento
Ou mesmo me devora
Sabendo desde agora
Do quanto em testamento
A morte diz provento
E nisto mesmo ancora
O pranto e se demora
Gerando intenso vento
Pudesse adivinhar
O quanto a decorar
Caminhos divergentes
E sei que após o nada
A sorte desejada
O que jamais tu sentes.

32

Jamais eu pude ver
O dia noutro instante
E quando se adiante
A morte a me colher
Sentindo entorpecer
O passo degradante
Ou nele me agigante
Ou tudo irei perder,
Somente sei da queda
E nisto já se veda
A nova caminhada,
A porta se fechando
Assim e desde quando
Eu sinto não ser nada.

33

Se nada ainda tenho
Ou mesmo acreditava
Na sorte onde se trava
O passo em tom ferrenho
O quanto desempenho
E venço e medo e lava,
Meu manto se traçava
Num torpe e vago cenho,
Escuto a minha voz
E nela sei de nós,
Mas nada mais recolho
Somente olho por olho
A lei que se tramara
Gerando nova escara.

34

Gerando a minha queda
No vértice do sonho
E nada mais reponho
Enquanto o rumo enreda
E sei do quanto seda
A sorte em enfadonho
Caminho onde proponho
Reverso da moeda,
O gesto o tempo o rito
E sinto, necessito
Talvez de algum descanso,
Mas morto em vida alento
O parto e o pensamento
Deveras não alcanço.


35

Alcanço apenas isto
O fim da minha história
E tento de memória
Ainda não desisto,
Revelo o quanto insisto
Se a vida é merencória
O corte diz da glória
E nela não persisto,
Acreditar na vida
E ter uma saída
É tudo o quanto anseio,
Mas quando me percebo
E nada mais recebo,
O manto nega o veio.

36

Se veio por diverso
Caminho aonde eu pude
Na minha juventude
Tecer único verso,
Agora vou submerso
Em pranto onde se ilude
Preparo um alaúde
E nele estou imerso,
O luto, a morte a vela
A sorte se revela
Em dor e em franco espasmo,
O parto diz do aborto
O sonho agora morto
A vida em tal marasmo.


37

Marasmos entre medos
E sinto o mar ausente
E quanto mais se tente
Vencer caminhos ledos,
Os dias, desenredos
O manto se apresente
E gere o penitente
Resumo em vãos segredos,
Arcando com enganos
E sendo assim os danos
Aonde nada levo
O tempo não pudera
Vencer tola quimera
Em ar duro e longevo.

38

Longevo sofrimento
Aonde não sabia
Sequer se poderia
Haver ainda um vento
E quando um novo tento
A morte mais sombria
A sorte em ironia
Ausente provimento
E teimo em dor e pranto
E quando até me espanto
Não vejo solução,
Apenas o temor
E nele morta a flor
Invernos domarão.

39

Invernos destro em mim
E nada mais se vê
O mundo sem por que
A sorte dita o fim,
Resumo e sei que enfim
O todo não se crê
Nem mesmo se revê
O passo em meu jardim.
Amargo e sem juízo
Semeio o prejuízo
Recolho a tempestade,
O mar de imensa treva
É tudo o que se leva
Do pouco quando agrade.

40

A grade ainda existe
E nada mais conservo
Senão meu peito servo
Do olhar domado e triste,
O peso inda persiste
E tento quando observo
O passo onde preservo
O pouso não resiste.
A queda ao vento e o medo
O quanto não concedo
Senão deste final,
Expresso esta saudade
E nela a realidade
Destrói no ato fatal.



41

Fatalidade apenas?
Não sei e não mereço
Qualquer bom adereço
Ou noites mais amenas,
Enquanto me apequenas
E sei do meu tropeço
O parto eu endereço
E nada mais serenas,
Servindo de alimária
À sorte procelária
A morte é solução
Desvio a minha estrada
E a porta já travada
As dores domarão.

42

Domando a minha vida
O corte a porta a morte
E nada mais conforte
Quem nunca vê saída
E sendo assim urdida
A posse noutro norte
O pouco que inda aporte
Aumenta esta ferida.
Não pude e não quisera
Saber da primavera
Em ácidos espinhos,
Os dias que me restam
Somente ao medo emprestam
Caminhos mais mesquinhos.


43

Caminhos discordantes
E neles não se vê
Sequer algum por que
Ou nada mais garantes,
Os olhos penetrantes
Em nada mais se crê
Somente se revê
A morte por instantes,
Negociando assim
O corte, o porte e o fim
O vândalo resgate
Navego pelo espaço
E sinto mesmo baço
O quanto se combate.

44

Combato a boa luta
Aonde nada mais
Dos ventos terminais
Ainda além se escuta,
A porta em cena bruta
Os dias são iguais
Agônicos portais
Na fúria mais astuta,
Resulto do passado
E quando sonegado
Meu passo nada traça
Somente o quanto pude
Viver em atitude
Disperso em tal fumaça.

45

Fumaças de cigarro
O olhar embevecido
O tempo repartido
E nele me desgarro,
O porto, o corte o carro
O canto enlouquecido
O verso presumido
Nas ânsias eu me agarro
E tento a salvação
No bote ou na promessa
A sanha recomeça
E nela se verão
Somente os ermos tantos
Aonde gero espantos.

46

Espanto e nada mais
O quanto pude em vida
Agora de partida
Não tendo outros sinais
Os dias são venais
E quando sendo urdida
A morte distraída
Espalhas seus cristais
Esbarro nesta fúria
Em medo esta penúria
Não deixa que se creia
No olhar ainda vivo
De quem deveras crivo
Em sorte mais alheia.


47

Alheio ao que inda possa
Vencer em medo e cruz
O parto reproduz
A verdadeira fossa,
A noite nunca é nossa
E nela sem a luz
O manto reconduz
A vida ao quanto endossa
Vergando as minhas costas
Procuro por respostas
E sei que não mais há
Somente o medo existe
E nele aponto em riste
O tempo desde já.


48

Já não consigo mais
Sentir qualquer alento
E quando a sorte invento
Somente em vendavais
Os riscos são fatais
E tanto sofrimento
Gerando alheamento
Em quedas tão boçais,
Restando dentro em mim
O pouco de onde vim
E o nada a que destino,
Meu canto não se ouvindo
O tempo destruindo
Ausente qualquer tino.

49

Desatinadamente
Eu quis acreditar
Na força do pomar
E nada se apresente
A fruta a morte sente
O porto outro lugar
Aonde se ancorar
Ou mesmo imprevidente
Versando sobre o nada
Ainda vejo a estrada
Distante dos meus dias,
E quando mais audaz
O passo ali se faz
Maiores heresias.

50

Em heresias tantas
As sortes não se vêm
E sigo sempre aquém
Do quanto me garantas
E nada mais espantas
Nem mesmo sou refém
Do medo que contém
As luas entre as mantas,
Aprendo com o medo
E sei quando procedo
Ser sempre assim em dor,
Jamais pude sentir
A paz no meu porvir
Nem canto alentador.





51

Alento eu poderia
Vestir enquanto tento
Vencer o sofrimento
Ou mesmo esta agonia
E nada mais teria
Senão meu pensamento
Vencendo qualquer vento
Ou nova hipocrisia
Amordaçado sigo
E quando em desabrigo
Pensara em nova senda,
Mas sei do quanto pude
Assim a plenitude
Deveras não me atenda.

52

Atendo o telefone
Engano novamente
E tudo se apresente
Em noite quase insone
Ainda que abandone
O amor nada pressente
Somente em verso ausente
O todo não se adone
Sequer do verso ou messe
E quando assim se tece
O quadro mais sutil,
O canto não se ouviu
Nem mesmo a minha prece
O tempo presumiu.

53

Presumo alguma luz
Aonde nada havia
Somente esta sombria
Noctívaga conduz
Ao corte medo e pus
E gera esta ironia
E tudo poderia
Saber do quanto opus
Revejo a minha lenda
E nela não se atenda
Sequer o que eu anseio
E sigo além do cais
Imensos vendavais
E neles sem receio...


54

Receio a queda após
O tempo mais constante
E nada me garante
Sequer o corte em nós
E tanto quanto a foz
O rio ou navegante
Em sonho transbordante
Ou medo mais atroz,
Resumo em verso e fardo
O passo onde retardo
O pranto ou mesmo a dor,
E sei do quanto pude
Vencer o velho açude
Em rito acolhedor.

55

Dos ritos que imagino
Ou mesmo poderia
Sentir a fantasia
E nela o meu destino,
O tempo cristalino
Espelha a hipocrisia
E gera esta alegria
À qual jamais domino,
Vencido pelo imenso
Carinho onde compenso
A dor que inda carrego
Depois de tantos erros
Diversos meus desterros
Prossigo mesmo cego.

56

Cegueira não retém
O passo em tal caminho
Aonde vou sozinho
Dos medos um refém,
Vestindo o quanto tem
E nisto sei do espinho
Olhar quieto e mesquinho
Resume este desdém,
O parto sonegado
Aborto do passado
Agora não se vendo,
O todo que pudera
Gerar a primavera,
Somente algum remendo.

57

Remendos entre tantos
Enganos inconstantes
E quando me garantes
Apenas desencantos,
Os erros em quebrantos
Os olhos diamantes
E neles por instantes
Pensara em magos cantos,
Mas tudo fora em vão
Certeza? Indecisão.
Alheio ao quanto posso,
Rodeio o meu passado
E bebo deslumbrado
Caminho outrora nosso.

58


Outrora um sonhador
Agora nada mais,
E sei dos desiguais
Anseios de um amor,
Perdendo a viva cor
Somente em terminais
Delírios virtuais
Aonde decompor
Caminho para o fim
E sei que sempre assim
Jamais enfim descanso,
Pudesse pelo menos
Em dias mais amenos
Saber de algum remanso.


59

Remanso onde um dia
Apenas pude ver
O sol se esmorecer
Em tarde mais sombria
A morte prosseguia
E nela sinto crer
O manto a me tecer
E o corte se traria
Na farsa mais cruel,
Bebendo em ti o fel
Soberba madrugada
A noite não traduz
E morre enquanto pus
O olhar sobre este nada.


60

Olhar impunemente
O manto mais feroz
E nele já sem voz
O nada se apresente
Tomando a minha mente
O corte nega a foz
E sei do quanto em nós
Ausente um afluente,
O rio segue em trevas
E nele também levas
As mansas ironias
Gerasse alguma sorte,
Mas nada me comporte
Somente o que trarias.


61


Somente não mais trago
O parto, a prece e o riso,
O tanto mais preciso
Negando algum afago,
Resumo em puro estrago
Amor e prejuízo,
Refém de um paraíso
Outrora vivo e mago
Agora nada sei
E quando perco a grei
Adentro este vazio
Sementes de ilusão
Apenas podridão
E em mim imenso estio.


62

Estios onde tento
Cevar uma alegria
E nada mais teria
Senão tanto tormento
E quando a luz fomento
Buscando em mim o dia
A dura fantasia
Aumenta o sofrimento,
Resumo a minha prece
No quanto me obedece
O parto ou mesmo a dor,
Cansado de lutar
Pudesse imaginar
Um canto redentor.


63

Redimo os meus pecados
Nas tramas mais vulgares
E quando ali tocares
Verás o desmembrado
Caminho anunciado
Sem sol e sem luares
Somente então notares
O manto já rasgado
A porta não se abrindo
O todo se esvaindo
Apenas nos umbrais
Quisera outro momento,
Mas quanto mais eu tento
Escuto o nunca mais.


64

Nunca mais eu pudera
Saber de alguma luz
E quando decompus
A minha primavera
Apenas mesma fera
Tocaia em contraluz,
O fardo a imensa cruz
E o nada me tempera,
Olhando de soslaio
Ainda já me traio
E vejo tão somente
O manto denegrido
O risco e então duvido
Até desta semente.

65

Sementes espalhara
E tento agora a ceva,
Mas quando mais se atreva
O passo em tal seara
A vida sonegara
E tanta luz já leva
Mantendo apenas treva
Aonde se quis clara,
O beijo ou mesmo o tédio
A vida em tal assédio
Gestando este granizo,
O passo rumo ao nada
A estrada desolada
Um preço mais preciso.

66

Preciso de um afeto
E sei que nada tenho,
Somente este ferrenho
Caminho em medo e veto,
O porte o corte o feto
O sonho não retenho
E quando me detenho
O passo não completo,
Mergulho no passado
E vejo sonegado
O quanto pude outrora
A morte não me larga
A boca imensa e amarga
Aos poucos me devora.


67

Devoro cada engano
E bebo os erros quando
O mundo se entornando
Em tom turvo e profano
Enquanto eu já me dano
Ou mesmo derramando
O passo desabando
O quanto fora um plano,
Distante desta plaga
A morte ainda traga
Apenas solução,
Erguendo o velho olhar
Sem nada mais tocar
Somente a negação.


68

A negação de um sonho
Um moto intenso e raro
Ainda se declaro
O olhar segue medonho
E sei ser enfadonho
O passo onde me aclaro
E bebo cada amaro
Momento onde proponho
Ao menos um segundo
E sei quanto é profundo
O risco de sonhar,
Sem horizonte ao menos,
Os dias mais amenos,
Somente imaginar.

69

Imaginando um porto
Aonde atracaria
O barco em alegria
Ou mesmo tão absorto
Não posso ver além
Do quanto resistisse
E sei desta tolice
E nela se convém
Sentir qualquer delírio
Qual fosse solução
Os dias não verão
Senão mesmo martírio
E à bala ou faca e adaga
O fim ainda afaga.

70

Afago meus erráticos
Caminhos pelo mundo
E quando em vão me inundo
Em sensos mais dramáticos
Expresso o desvario
Em verso ou na canção
Pudesse desde então
Seguir um manso rio,
Porém a foz distante
O olhar não anuncia
Sequer um novo dia
Aonde se garante
Ao menos o sossego
Quem sabe em desapego?


71

Em desapego eu sonho
Vagando por espaços
E sei dos velhos passos
Aonde em enfadonho
Desejo eu recomponho
Embora eu sinta os lassos
Desenhos em cansaços
Ou mesmo mais medonho
Procuro vez em quando
Sentir já transbordando
O mundo invés da dor
E tento novamente
Ainda que se ausente
Das trevas meu louvor.

72

Louvando cada dia
E mesmo assim sozinho,
Resumo o meu caminho
Em tez dura e vazia
Aonde poderia
Gerar senão mesquinho
Delírio eu adivinho
Além desta ironia,
Espero pelo menos
Momentos claros, plenos
E sei ser impossível,
Meu canto não transcende
E quando se pretende
Apenas indizível.

73

Apenas quis um manto
Aonde me cobrisse
Sem medo e sem mesmice,
Mas nada mais garanto
E quando me adianto
O tempo diz tolice
Recebo o que me disse
A sorte em treva e pranto,
Restando muito pouco
E quando me treslouco
Bebendo este aguardente
O tanto que pudesse
Agora já se esquece
Embora ainda o tente.

74

Embora nada reste
Do todo que pensara
A morte semeara
Em solo tão agreste
O nada se reveste
E dita esta seara
Aonde se escancara
O quanto não se investe,
Temendo qualquer passo
A solidão eu traço
E faço sem sentido
O peso de uma ausência
E nela esta inclemência
Ditando o amor perdido.

75

Perdido e sem destino
Resvalo no caminho
E nele sorvo o espinho
Então eu me alucino,
O fim em raro tino
O medo em vago ninho
E quando me adivinho
Apenas desatino.
Resvalo no vazio
E tento enquanto crio
Um ledo caminhar,
Medonha face exposta
Aonde sem resposta
Cansado de lutar...

76


Cansado desta sorte
Em meio aos dias vagos,
Procuro teus afagos
Ou algo que conforte,
Mas quando sei sem norte
Os medos, ritos, lagos
E teimo em tantos tragos
No quanto me suporte.
Vencido sem a luta
A força amarga e bruta
O risco de viver,
E tento doravante
Ainda em inconstante
Desejo a se tecer.


76

Tecendo em voz sombria
A morte aonde pude
E nada mais ilude
Quem tanto saberia
Certezas de ironia
Ausente em plenitude
Resumo em atitude
Diversa o que eu queria,
Vivendo do passado
Jogado em duro enfado,
Procuro um velho cais
E sei que nada tendo
Apenas sou remendo
Em dias terminais.


77

Termino a cada verso
Falando do meu mundo,
E quanto me aprofundo
Apenas sei disperso
O canto em universo
Gerando o vagabundo
Caminho onde me inundo
Em tom duro e perverso,
Cansado desta sorte
Preparo a minha morte,
E bebo esta sangria
E nela se percebe
A fútil turva sebe
Que o tempo me daria.


78


O tempo não renega
O passo rumo ao vasto
E nele se me afasto
A sorte sendo cega
O quanto se navega
E tento outro repasto
Aonde me desgasto
E tudo sempre nega,
Vestindo esta mortalha
A fome em mim se espalha
E toma o meu sentido,
E quando quis resgate
Apenas se constate
A dor em tal gemido.

79


Gemente melodia
E nada mais que o traço
Aonde me desfaço
E gero hipocrisia,
Pudesse luzidia
A vida noutro passo,
Mas sei o quanto escasso
O sonho em tez sombria,
Vagando pela noite
Tocado pelo açoite
Rasgando a minha pele,
O todo que pudera
Vencido pela fera
À morte me compele.


80

Compele-me a vontade
De crer em algo além,
Mas nada me retém
E o medo ainda brade,
Vencida tempestade,
Dos sonhos sigo aquém
Tentando um novo bem
Que ainda tente e agrade,
Resvalo no passado
E sinto desolado
O parto aonde há tanto
Pensara redenção,
Mas sei que só virão
Temor e desencanto.

81


Temendo cada passo
Aonde pude ver
Além do desprazer
O dia noutro espaço
E quando ainda caço
A sorte de viver
Ou mesmo me deter
No rito em manso traço,
Seguindo vão e alheio
O todo que receio
Transcende a qualquer luz
E nela se pudera
Ainda em mansa espera,
Mas nada se produz.

82

Produzo algum alento
Aonde quero a paz,
E sei ser incapaz
De ter além do vento,
Matando o pensamento
O corte mais tenaz
E nele sendo audaz
Encontro esquecimento,
E morto sem ter chance
Ao vão agora lance
O passo sem juízo
Depois de certo tempo
Somente em contratempo
Recolho o prejuízo.

83

Recolho cada engano
Aonde quis o manso,
E quando nada alcanço
Apenas eu me dano,
E bebo do profano
Caminho sem remanso
E quando ao vão me lanço
Revejo o desengano
Selando passo e corte
Somente a minha morte
Transita no meu rumo
E tanto quanto posso
Ainda sendo nosso
O medo enfim consumo.

84

Consumo meu desvio
E nele me atormento
Bebendo o sofrimento
Ainda me recrio,
E tanto em desvario
Ou mesmo alheamento
Encontro o desalento
Aonde quis meu rio.
Ressalto em queda e medo
O todo que concedo
Ou nada que recebo,
A sorte não se vendo
Apenas o remendo
E nele me percebo.


85

Percebo a queda quando
O tempo dá sinais
Em dias desiguais
O nada se tramando,
Revelo o transtornando
Em meros rituais
Bebendo muito mais
Do quanto sei nefando,
Esgoto o verso e tento
Enquanto ainda atento
Sentir outro caminho,
Mas sei que nada sou
E o quanto me restou
Apenas teu espinho.

86

Espinhos que plantara
E agora em tais daninhas
Ainda me adivinhas
Tomando esta seara
A noite se escancara
E doma as sortes minhas
Resvalo em andorinhas
Aonde não migrara
A luz que tanto quis
E sei ser infeliz
Assim como apresento
O medo em cada verso
E sei quando disperso
Meu canto contra o vento.

87

O canto sonegado
O tempo em desafio,
O quanto inda desfio
Das sendas do passado,
Resumo cada enfado
E bebo inteiro o rio
Além deste sombrio
Aonde desvendado
O pranto, o canto e a dor,
Revelo o sonhador
E nele me pergunto
O quanto deste assunto
Ainda deveria
Reinar em turvo dia.


88

O dia já não traz
Senão a mesma bruma
O passo se acostuma
E teima até audaz
Perdendo qualquer paz
E em nada já se esfuma
Enquanto ao nada ruma
E assim se satisfaz
No passo em contratempo
Entregue ao medo e ao tempo
Sem mais a solução
Em rara turbulência
Sem luz e sem clemência
Imensa subversão.

89

Subverto o desalinho
E tento outra promessa
E nada se confessa
Além deste daninho
Mergulho onde adivinho
A morte sem a pressa,
E tanto recomeça
Aonde sou mesquinho,
Erguendo o meu olhar
Sem nada divisar
Um horizonte escuso,
Escondo o meu receio
E sigo sempre alheio
Enquanto o sonho eu cruzo.

90

Cruzando a tempestade
Aonde não pudesse
Senão por reza e prece
Além desta saudade
O nada ainda brade
E gera o que se tece
E logo já se esquece
Nos olhos da verdade.
Medonho e caricato
Assim eu me retrato
Em meio ao meu tormento
E embora seja falho,
Ainda quero e espalho
Ao menos sentimento.



91

Ao menos poderia ver a luz
Enquanto a vida fosse tão diversa,
Mas quando sobre o nada já se versa
O medo tão somente reproduz
O quanto de meu todo enfim me opus
E tanto quanto posso a sorte imersa
E neste caminhar leda conversa
Transcende ao que talvez gerasse a cruz,
Mergulho no vazio e silencio
Enquanto na verdade eu sinto o frio
E nele refazendo a minha história
No pouco ou quase tanto ainda resto
E sei quanto pudesse em novo gesto
Trazer o olhar ausente da memória.

92

Memórias tão vazias; nada tento
Somente a morte em voz suave ou tensa
E quando a realidade não compensa
Ao menos resta em mim o pensamento,
E sei quanto sobejo alheamento
E nele a sorte mostra a face intensa
Aonde na verdade está propensa
A toda esta heresia ou sofrimento,
Procuro pelo menos o descanso
E quando a paz ainda eu tento e alcanço
Disfarço com palavras, sonhos ermos
E tanto em desvario ousando termos
Dispersos do que um dia pude enfim,
Resumo em verso e dor o meu jardim,

93

Jardins aonde eu tanto acreditara
Possível qualquer flor e nada havia
Somente esta semente hipocrisia
Domando com certeza esta seara,
A mão que com terror me desampara
A manta aonde o medo se tecia
O peso na verdade me traria
A sensação cruel e nela a escara
Determinando o fim de quem buscava
Certezas onde a vida dita a trava
E nega qualquer passo ou mesmo um rito
Aonde possa haver alento enquanto
O mundo traça a queda e se espanto
Ainda no futuro eu acredito.

94


Acreditar num sonho e perseguir
As sombras do que um dia pode ser
Além da face escusa do querer
Quem sabe novamente presumir
Meu erro se transforma em elixir
E nele tão somente pude crer
No passo aonde nada se faz ver
Nem mesmo o que inda posso em vão sentir
Açoda-me a incerteza de um futuro
E quando penso além eu me torturo
Singrando tempestades, nada mais.
Errático cometa vida afora
Apenas a saudade ainda ancora
Durante os mais supernos temporais.

95

Em tantos temporais eu vi a vida
Perdendo a direção enquanto eu cria
Possível novo tempo em alegria,
Porém já sei da sorte em despedida,
A morte com certeza presumida
Num verso feito em dor e em agonia
Cenário tão diverso não traria
Sequer outra defesa ainda urdida
Não peço nem sequer alguma paz
Somente a carne exposta o tempo traz
E quanto mais alheio ao sofrimento
Talvez eu inda veja alguma sorte
Aonde se presume e não comporte
Cerzindo qualquer brilho, ainda tento.

96

Tentando qualquer luz aonde outrora
Tentáculos da morte me tocaram,
Os dias em verdade não notaram
A cerca onde a dor ainda aflora,
Mergulho no passado e sem demora
As hordas em silêncio se preparam
E quando meus caminhos desamparam
Somente a solidão ainda ancora
E reina em absoluta face escusa,
E tanto quanto posso o nada cruza
E doma cada passo que inda dê
A morte se espalhara a cada instante
E o quanto se procura e se adiante
Não deixa nesta vida algum por que...

97

A vida não pudera ser aquilo
Que tanto procurei sem serventia,
A sorte noutra face velaria
O manto aonde encanto eu não perfilo,
Eu sinto e sei deveras mais tranqüilo
O rumo em mais dorida hipocrisia,
A manta que me cobre se puía
E nela nem o sonho inda desfilo,
Audaciosamente quis um fato
Aonde poderia ser mais grato,
E ingrata a fantasia não me cabe,
Bem antes inda mesmo se desabe
O pouco que me resta ora desato
Além do que em verdade a morte sabe.

98

Não sei se posso mesmo ter um sonho
Quem sabe no final não merecia
Senão a sorte atroz e tão vazia
E nela este caminho mais medonho,
Proponho apenas isto e nada mais,
Um templo aonde possa acreditar
Somente nalgum raio a me tocar
Diverso dos meus ermos tão fatais,
Pudesse pelo menos ter em mim
A luz que não vejo e inda receio
Seguindo a cada passo mais alheio
Do quanto poderia crer enfim,
Sementes espalhando em solo rude,
Apenas o que posso e inda me ilude.

99

As várias ilusões por onde tento
Cercar com paz as duras realidades
E quando com terror tu mais degrades
Matando o que inda tenho em alimento,
Perdendo o quanto pude e não fomento
Adentro as mais cruéis fatalidades
Sem ter discernimento das verdades
Apenas sou tal mero desalento
E a morte se prepara na tocaia
E quando mais voraz não satisfeita
Olhando a cada passo noutra espreita
Alheia ao que pudesse e já me traia
Tormento eu sei de cor e nada faço,
Aos pouco vou perdendo cada espaço.

100


Perdendo o que me resta sigo só
E tento acreditar nalguma luz
Aonde na verdade reproduz
A morte sem destino, medo ou dó,
Acervo de esperança, eu não mais guardo
Mortalha é o que me resta e não reluto
Apenas bebo a sorte e teço o luto
E sei que no final não me resguardo,
Ascendo ao meu caminho em corte e dor,
Alheio ao que vier sigo distante
E sei o quanto posso e me garante
Somente o quanto tenho e sem me opor,
Mergulho no vazio e ainda servo
Semente de ilusões; já não conservo.

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