quarta-feira, 4 de agosto de 2010

43901 até 44000

1

No caos aonde a vida me arremete
Especular momento em decisão,
E volto a mergulhar da imensidão
No quanto ainda resta e me compete,
O fato na verdade só repete
O tempo que se perde em direção
Deixando para trás a atracação
Quem dera timoneiro. Sou grumete.
Repito a mesma velha ladainha
E penso quando a sorte é mais daninha
Apenas num segundo bem tranqüilo,
Por entre tantas nuvens vida afora
A melodia atroz já se decora
Enquanto no sombrio céu; desfilo.


2

Já não me bastaria tão somente
Acreditar na sorte ou mesmo assim
Vagando sem saber se ainda há fim
O nada novamente se apresente;
Por conseguinte vivo plenamente
E penitente chego a crer enfim
No todo que inda resta dentro em mim,
Qual fosse do não ser, mera semente.
Ao tentar perceber novo desenho
O tanto quanto posso eu desempenho
E terminando a vida desta forma,
Pensando no passado e no futuro
Do nada e do vazio eu me asseguro
E a própria persistência me deforma.


3

Lavando minhas mágoas noutro fato
Apenas resistindo ao que virá
Sabendo e desdenhando desde já
O nada dentro em mim sempre constato,
E quando procurara algum contato
Erguendo o meu olhar, não notará
Sequer a menor sombra, pois e lá
Caleidoscópio traça um medo inato.
Errático e talvez mesmo bisonho,
Na foz de qualquer rio se me ponho
Deste estuário vejo apenas isto,
Caminho contra a sorte e assim persisto
Vacante coração aguarda quem
Decerto no final, eu sei, não vem.


4


Coração deste poeta
Acelera e não tem jeito
Bate forte, toma o peito
E no fim não se repleta
A verdade mais completa
Deixa o sonho insatisfeito,
Mas, deveras sempre a aceito
E o meu ego nada veta.
Do passado vejo a sombra
Do futuro que me assombra
E traduz ansiedade,
Morto-vivo qual zumbi
Neste instante eu me perdi,
Busco à toa, a claridade.


5

Sem sinais de alguma chance
Vago apenas por saber
Que no fim ao bel prazer
A danada já me alcance,
Inda mais quando me canse
De sonhar e de embeber
A alegria; eu posso ver,
Meramente num relance.
Balanceio a vida assim
E perdido sei que vim
Mergulhando em tais perguntas
As palavras repetidas
Transcendendo nossas vidas
Que deveras inda ajuntas.

6

Nada mais posso, afinal
O meu erro foi tentar
Novamente algum lugar
Abortando aquém a nau.
Ao subir novo degrau
Procurando o patamar,
Nada além irei achar,
É o desejo bem ou mal.
Apresento a minha cara
E se tanto já prepara
Outro bote esta serpente,
O meu canto desafina
E a palavra dita, ou sina,
Inda vivo plenamente.


7


Jorra em mim outro momento
Bem diverso do que agora
Inda tento e me apavora
Quanta dor e sofrimento!
No delírio aonde invento
O cenário se decora
E resume sem ter hora
Desnudando este provento,
Reparando bem melhor
O desejo; eu sei de cor,
Mas não canso de aprender
Outra queda se anuncia
E deveras todo dia
Caminhando ao bel prazer.


8

Um jagunço da esperança
Bala à solta, voz nem tanto,
Onde quer e me adianto
O meu passo logo cansa,
Não importa a temperança
Nesta terra aonde o espanto
Produzindo morte e pranto
Traduzindo por pujança.
Pirracento coração
Sabe bem que inda virão
Festas novas noutro dia,
E o meu canto desafia
A palavra solidão
Inda busca uma ironia.


9

Participo do cenário
Sou bufão e nada mais
Onde quero temporais
Vento calmo e solitário,
Resumindo o necessário
Desejar entre os cristais
Outros erros são vitais,
Mas me tranco neste armário,
Vendo assim o olhar de quem
Propusera e já não vem
Deixo tudo para trás,
O meu ermo sonhador
Apressando aonde for
Novamente nada traz.


10


Sou bisonho e até por isso
Nada resta do passado
Onde quis algum legado
O cenário é movediço,
Neste olhar ledo e mortiço
Outro olhar; vi desenhado
E o meu canto desvairado
Já não trama qualquer viço,
Paraíso? Não conheço
A saudade este adereço
Pesa tanto em minhas costas
E se tento outro caminho,
A verdade em tom mesquinho
Adivinha tais respostas.

11


Caminhando vida afora
Sem saber qualquer paragem
Não encontro uma estalagem
Onde o sonho ainda ancora,
Quando a sorte não aflora
O que trago na bagagem
Diz da dura paisagem
Na tocaia sem ter hora,
Curvas tantas enfrentando
Sofrimento desde quando
O menino quis crescer,
Bala, foice, canivete
O meu mundo só promete
Tanta dor e desprazer.


12

Nas tocaias desta vida
Aprendi qualquer defesa
Sendo assim, a mera presa
Que pensavas distraída
Num instante de surpresa
Nesta espreita percebida,
Pela sorte prevenida
Encontrando uma saída.
Nem jagunço ou coronel,
Nem inferno nem o céu
Nada freia quem peleja,
A minha alma sendo andeja
Não encontra, e tanto faz,
Um segundo mais de paz.

13


Quando o tempo quis virar
Eu tentava algum descanso,
Nalgum canto num remanso
Num regaço a perfumar
Alma tonta quis amar
E ao inferno onde me lanço,
Afinal jamais avanço
Fico quieto num lugar,
Prisioneiro deste intento
Onde amor nega provento
Nada serve, nem a vida,
O melhor não posso tê-lo
Sonho vira pesadelo,
Esperança de partida.

14

Sou decerto das montanhas
Das Gerais e sei tão bem
Que a vontade quando vem
Dominando minhas sanhas
Se tu perdes, logo ganhas
E a verdade não contém
Do caminho sigo aquém,
Mas aprendo suas manhas.
Procurando dentro em mim
Vou aguando este jardim
Com o pranto da saudade,
A viola sertaneja
Corredeira murmureja
E o meu sonho volta e invade.

15


Não quero ficar parado
Nestas curvas do caminho,
Caminhando mais sozinho
Esperança lado a lado,
O meu sonho derramado
Jorra sangue feito vinho
E o meu canto, um passarinho
Neste tempo desolado,
O meu peito violeiro
Dos meus sonhos, companheiro
Sabe bem qual a razão,
Mas o tempo é sem juízo
E depois do prejuízo
Dias novos, pois virão.


16


Na fartura do meu sonho,
Minhas contas; pago agora
O que tanto se demora
Na verdade não proponho,
Se o caminho é mais tristonho
A saudade me apavora,
A viola logo chora
E outra moda eu já componho,
Trovador e repentista
Meu olhar tenta e despista,
Já não vê mais nuvem quando
Por detrás de cada monte
Vai mudando este horizonte
E este tempo está fechando.


17

Minha sorte se tempera
Na saudade de quem ama,
Acendendo cada chama
De tocaia a dor me espera,
Na palhoça, na tapera
O meu peito não faz drama
A viola já reclama
Quando chora e destempera,
A morena mais bonita
Tão cheirosa quanto a flor,
No meu peito diz amor,
Mas na vida, uma desdita,
Só me resta esta vontade
E no peito, uma saudade.


18


Vou fazendo a minha vida
Da maneira que eu puder
Com saudade da mulher
Que na curva vai perdida,
Coração já não duvida
Venha o tempo que vier,
Seja como Deus quiser
Levo a vida de vencida,
Na partilha dos meus sonhos
Os que ficam são tristonhos,
Mas me dão felicidade,
Pelo menos trago em mim
Esta rosa no jardim,
Nos espinhos da saudade.


19


Faço verso de improviso
Vou tentando outro caminho,
Coração, bicho daninho
Nunca teve paz, juízo
E se busca o paraíso
O que encontra é tão mesquinho,
Caminhando assim sozinho,
Mas tem tudo o que preciso.
Tenho o sonho em minhas mãos,
Da esperança tenho os grãos
E o meu canto me consola,
Quando a noite é de luar,
A vontade de sonhar
Eu derramo na viola.


20


Nada trago no meu peito
No embornal somente a lua,
A vontade continua
Sonho nunca satisfeito,
Mas na rede onde me deito
A saudade senta a pua
Faz estrago e o sonho amua,
Porém vivo do meu jeito.
No sertão à bala e foice,
O meu amor cadê? Foi-se
Noutros rumos, mas ficou
Coração bate apertado
Vai falando do passado
Quando foi feliz e amou.


21

A verdade de um poeta
Não traduz a claridade
Quando o sonho vem e invade
O real; já não completa
Vive além de qualquer meta
E procura em ansiedade
A palavra quando brade
Nada a cala, é arco e seta.
Volto aos ermos chego após
E se tento antes me engano
Novamente noutro plano
Realçando a minha voz,
A minha alma libertária,
Mesmo cega, é luminária.


22

Não pudesse mais cantar
Nem tampouco ter nas mãos
Os meus olhos entre vãos
Procurando algum lugar,
Num caminho sem parar
Entre dias, meros grãos,
Os meus sonhos, artesãos
Pensam em frutificar.
Resoluto, mas nem tanto
Quando a dor invento e espanto
Traço em linhas paralelas
Universos que freqüento,
Vou levado pelo vento,
Os meus sonhos são as velas.

23


Nada cala a voz de quem
Não se traz entre as algemas,
Mesmo quando a vida temas
O futuro sempre vem,
Na esperança sigo além
E enfrentando os meus dilemas
Crio as minhas piracemas
Reproduzo o que não tem,
Sinto até o quanto nego
E depois neste nó cego
Nas palavras meu cinzel,
O que tanto me afligisse,
Muitas vezes; que tolice!
Busco além do próprio céu.

24


Vicejando dentro da alma
Primaveras onde um dia
Este outono reinaria
Esta voz ora me acalma,
Mas no fundo a sorte palma
Por caminhos de ironia,
E decerto não traria
Senão medo dor e trauma,
Violento temporal
Num jazigo original
Ergue apenas meu sepulcro,
Mas se tenho esta palavra
Da aridez procuro a lavra,
No vazio gero o fulcro.

25

Tantas vezes vida afora
Encontrei matizes vários
Entre sonhos necessários
E o terror quando apavora
A palavra, se senhora
E domando estes corsários
Entre sonhos solitários
Novo tempo revigora,
Mas depois alento cessa
E o que fora uma promessa
Realçando a dor em mim,
Do não ser ao tanto quanto
Poderia quando canto,
Estercando o meu jardim.


26


Onde quis a primavera
Nada mais que agrisalhado
Céu ditando o seu recado
Numa espreita, dura espera
E se o tempo degenera
O que trago é desolado
Caminhando sempre ao lado
Cevo em mim esta cratera,
E bisonho ou mesmo até
Transbordando em medo e fé
Sigo além do quanto eu disse,
Vago em noite enluarada,
Mesmo quando está nublada,
Sonho lavras de Matisse.


27

Órfão de uma vã saudade
Que deveras nada diz
Solto a voz em chamariz
E o teu nome volta e invade,
Nesta dura tempestade
O meu peito estéril, gris
Desta fúria geratriz
Teima em nova e falsa idade.
Mocidade? Já perdida,
Mas renovo a minha vida,
Os meus dentes são mais fortes
E as palavras traiçoeiras
Mesmo quando e até não queiras
Ditam novos, belos nortes.


28

Acertando estes ponteiros
A verdade é soberana,
Mas meu peito já se engana
Sonhos belos, traiçoeiros
Reacende estes luzeiros
E o meu canto ora se dana
Na vontade mais profana,
Nos florais dos meus canteiros.
Rósea luz emana quando
O meu sonho se entornando
Fecundando o solo agreste,
Neste instante é que percebo,
O meu verso este placebo
Quando nunca mais vieste.

29

Engravido-me de um sonho
E percebo quando o aborto
O delírio, se inda importo
Outro tanto que componho
Resoluto, mas bisonho
A palavra não conforto
E tampouco quando exorto
A saída, enfim proponho,
Basculantes, persianas,
As saudades; não enganas
São deveras feras belas
Sem futuro, ou mesmo alheio
Ao que tanto inda rodeio
Quando aquém meu rumo selas.

30


Expressando em riso e pranto
A vontade de encontrar
Qualquer tom, qualquer lugar
Onde a sorte; em paz, garanto,
Quando busco ali; portanto,
Um caminho a desvendar
Estendendo em céu e mar
O meu vasto desencanto,
Quando o sonho se desfaz
E permite este mordaz
Delirar de quem poeta,
A senzala se aproxima,
Dita a sorte, muda o clima
Modifica rumo e meta.


31

Viu de tantos sonhos os heréticos
Caminhos entre os quais pudesse crer
Num novo e mais suave enternecer
Após os meus delírios epilépticos,
Destinos onde os quis quase proféticos
Errôneos entre tanto desprazer,
Porém logo que os pude reviver
Senti estes caminhos vãos e herméticos,
Apocalíptica loucura, insânia em vagas
Horrenda face e nela tu me tragas
Somente os derradeiros dias meus,
E os olhos no horizonte em turbulência
Procuram qualquer luz, paz ou clemência,
Apenas; detalhado, um torpe adeus.


32

Dos transes padecidos, a ilusão
Presume novos erros e decerto
Enquanto o meu caminho ora deserto
Somente duros dias se verão,
Alheio ao que pudesse atracação,
O quanto deste cais jamais aberto
Explode em rumo atroz e mesmo incerto
Tramando tão somente a negação.
Aonde fora tosco, ledo e irônico
Agora num sorriso que histriônico
Transcende à sanidade e nega a paz.
No quanto imaginara esta venérea
Beleza o que vislumbro, a dor funérea
Traçando em desatino, um tom mordaz.


33

Ao segurar a vida entre meus dedos
Não pude controlar sequer timões,
E quando esta verdade tu me expões
Os dias morrem frios, frágeis, ledos.
Aprendo com enganos, velhos medos
E tento novos tempos, direções,
E nada do que dizes; soluções,
Ousando em torpes passos, desenredos.
O quanto quis a sorte noutra tônica
E a vejo se esvaindo agora agônica
Mordaz e simplesmente alheia a tudo.
Desafiando ainda, num conflito
Num dia mais tranqüilo; eu acredito
E novamente- embuste- desiludo.


34


Embalde caminhando noite afora,
Ao perecerem sonhos, nada resta
Senão a mesma face tão funesta
E dela esta incerteza se demora,
O quanto do meu sonho não decora
A noite onde eu pensara riso e festa,
Adentro e mal percebo qualquer fresta
O sonho quando vem, inda apavora;
Dos mantos da ilusão, sequer a túnica
A voz que imaginara audaz, mas única
Agora se perdendo em ecos tais
Que nada mais permite discernir
O rumo aonde possa algum porvir
Entre caminhos vários, desiguais.


35


Equóreo pescador buscando a sorte,
Enfrentando bravias ondas sonha
Ainda quando a noite cai medonha,
Procura qualquer cais que inda o conforte,
A bússola se perde e sem seu norte
À morte aproximando inda se oponha
E quando no sombrio mar se ponha
É necessário ser audaz e forte.
Mas ledo navegante do vazio
O quanto posso crer e não desfio,
Teares em fieiras mais diversas,
A vida se enovela e me tonteia
A sorte permanece vaga e alheia
Enquanto a um novo porto, em calma, versas.


36

À prole dos meus sonhos, o legado
É feito em desarmônica verdade,
Apenas a total iniqüidade
E o rumo; há tanto tempo desolado,
Espreito alguma sorte, atocaiado
Somente este sombrio vento invade,
E quanto mais a vida se degrade
Terror já não se vê defenestrado.
E o canto em discordância gera infausto
No cáustico cenário, este holocausto
Da cria entre tormentas e vazios,
Restando a quem se faz insano e atroz,
Silêncio aonde havia ainda a voz
E dele os mais terríveis desvarios.


37



Um sevo caminhar entre terrores
E neste desenhar jamais eu pude
Traçar a caminhada em plenitude
Sabendo bem diverso aonde fores,
Não tento procurar por novas cores,
O céu; há tanto tempo já me ilude,
E a cada novo instante tudo mude
Agrisalhando enfim os meus albores.
Atrevo-me a sonhar e até sorrir,
Sarcástico demônio dita as regras
E quando este cenário vil; integras
Negando qualquer dia que há por vir,
O pântano domina a minha sorte
Somente a charqueada me comporte.


38


O céu quando traçou a minha dita
Não teve algum cuidado, nem tampouco
O olhar abençoado. Ledo e louco,
Meu passo de algum sonho necessita.
E quando é tão vazia esta desdita
O que resta em verdade é muito pouco
E tento até fingir, um quase mouco,
Porém esta saudade volta e grita.
O sonho quanto o quis afrodisíaco
Trazendo algum luar paradisíaco
Apenas sonegara esta visão
A vida se esparrama e quase esquálida
Sonega a persistência da crisálida
E aborta a minha vã libertação.


39


Onde novos caminhos poderia
Singrar o coração de quem se dera,
Apenas a mortalha, esta quimera
Gerando a dura e farta hipocrisia,
O canto noutro tanto não teria
Sequer o mesmo tom em primavera
A morte é o que decerto ainda espera
Quem nunca noutro tom permitiria.
Amáveis e tocáveis messes, quando
O todo dentro em mim já desabando,
Uma ilusão espúria e nada além,
E quando me imagino em calma e luz,
Somente este terror se reproduz
E nada após a curva, nem ninguém.


40


De todos os demônios, meus infensos
Os ermos de minha alma são fatais,
E quando se aproximam, vejo-os mais
A cada novo dia, tão imensos,
Os céus entre neblinas, fúrias: densos
E os cantos dos antigos madrigais
Agora mortos sonhos e; jamais,
Quando se vêm além somente os lenços,
Partidas entre dores e tormento
E busco uma saída, ainda tento
Vencer os meus terrores, mas no fim
O quanto poderia em sonho régio
Agora se traduz em sortilégio
Gerindo cada passo de onde vim.


041

A deleitar-se um sonho mais audaz
Não deixa que se pense na verdade
E quando esta ternura ainda invade
Um dia mais suave enfim se faz,
A voz em consonância dita a paz
E todo o meu caminho nega a grade,
Apenas encontrar tranqüilidade
Num rastro mais atroz e até mordaz.
Assisto às ilusões como quem busca
Apoio após a queda atroz e brusca
Vencendo os seus tropeços vida afora,
Mas quando acordo e vejo solitário
O quando que pensara solidário
A vida sem proveitos; desancora.

042


Os meus erros que à dita não iludem
Repetem velhas frágeis ironias,
E quanto mais diversas me trarias
As noites onde os passos nunca mudem,
Nem mesmo as falsas luzes inda ajudem
Traçando as minhas noites mais sombrias,
E nego a claridade de outros dias
Ainda quando os sonhos amiúdem.
Na pequenez desta alma insone e espúria
Apenas o que a rege, esta penúria
Expressa a solidão reinando em mim,
Acossa-me o desejo de outra sorte,
Porém a cada sonho que se aborte,
Mais próximo eu percebo então meu fim.


43


Lutar somente contra o que se sente
E crer numa vitória após a lida,
Assim ao se encontrar a já perdida
E estúpida loucura de um demente
O corte se mostrando plenamente,
Não vejo no final qualquer saída,
E tento algum refúgio nesta ermida
Consolidada agora em minha mente.
O fato de sonhar talvez pudesse
Traçar algum caminho mais diverso,
Mas quando no vazio ainda verso,
Restando esta ilusão em mera prece,
Vacância se transforma em norma e lei
Herméticos caminhos entranhei.


44

Exíguo este cenário aonde eu vejo
Iníqua fantasia se perdendo,
O olhar por vezes fúnebre remendo
Não traz a menor sombra de um desejo,
O tanto quanto posso e ainda almejo
Num ato mais suave, mero adendo,
Retrato este terror, atroz e horrendo,
Pensando ser apenas um lampejo.
Metástases invadem cada parte
A morte se aproxima ora destarte
Não deixa qualquer sombra de esperança,
E fragilmente sigo até o fim,
Abrolhos dominando o meu jardim,
A sorte no vazio enfim se lança.

45



“Seu” moço dê licença de eu contar
As dores que carrego no meu peito,
A lua se espalhando quando deito
Bebendo os raios claros do luar
Viola no meu sonho a pontear
O dia noutro dia satisfeito,
Uma esperança agora faz seu eito
Aonde quis meu canto em paz arar.
Na sorte traiçoeira de quem ama,
A voz desafinada toma a trama
Enquanto uma saudade faz a festa,
Desta janela aberta dentro em mim
O cheiro mais gostoso do jasmim
E um beija-flor entrando pela fresta.



46


O quanto mais cuidoso, o pensamento
Procura soluções onde não há
Esgoto o meu caminho e desde lá
Apenas da esperança me alimento
Hercúlea esta batalha aonde eu tento
E sei que nada mais me proverá
Somente este não ser dominará
O passo quando inepto busco e invento.
Decrépito velhusco ora me engelho
E o tanto se traduz num torpe espelho
Traçando cada ruga em minha face,
E quando quis um véu primaveril,
Apenas a mortalha é o que se viu
E nela este cenário enfim se trace.


47


Arguto sonhador, poeta tenta
Novéis delírios entre tantos fardos,
E quanto mais audazes estes bardos
Maior é dentro da alma uma tormenta.
Entre caminhos duros e retardos
Os dias se apresentam; na sangrenta
Batalha entre o que eu quero e se apresenta
Ferido mortalmente por vis dardos.
E sei tal cupidez em tons venais
É mera estupidez e nada mais,
Mas vejo retratado desta forma
O tanto quanto eu quis e não teria,
Amor é meramente uma utopia
Que a realidade aos poucos já deforma.

48

Sendo investido apenas pela rústica
Loucura que transcende à própria vida
Encontro a cada passo a repartida
Noção de outra manhã em vaga acústica.
Ecoa dentro em mim em dissonância
Este infortúnio aonde quis a dor
Com seu poder atroz, transformador
Marcar com virulência e discrepância,
No quanto se moldara este espetáculo
Diverso do que oráculo dissera
Miraculosamente escapo à fera,
Sentindo-me roçar cada tentáculo,
E quando imaginara sóis e méis
Apenas os rancores, vis tropéis.

49

Admoestando a dor ainda tento
Vencer os descaminhos mais constantes
E mesmo quando aquém nada garantes
Eu bebo a imprecisão de cada vento.
E quando se mostrara mais sangrento
O olhar entre terrores, tais farsantes
Delírios mais atrozes, provocantes
Meu canto se aproxima virulento.
As noites solitárias, duras, parvas
Eclodem em terrores estas larvas
E a morte da crisálida entontece,
O quanto quis apenas uma messe
A vida refletindo esta alma infecta
Além do ledo inferno após me ejecta.

50

Jazigo em punição expresso em voz
Acentuada em tétrica e fatal
Espasmódica e lúbrica, venal
Ao mesmo tempo lúdica e feroz.
Esparsas ilusões, amor algoz
Enquanto num momento sensual
Expondo este delírio em sol e sal
Desata com furor; antigos nós,
Nova ventura ou dura realidade?
O quanto deste sonho se degrade
E impeça até meu rumo de provê-lo,
No tanto imaginário em gozo e sonho,
Cenário desejoso e mais bisonho,
Transforma o paraíso em pesadelo.


51
Acordei assim...
Com vontade de ti sentir mimetizado em mim,
Teu cutâneo manto a me cobrir,
Teu abissal sonho a colorir
Tua voracidade a devorar...
REGINA COSTA

Teu corpo no meu corpo amanhecendo
Delírio incomparável, farto gozo
Caminho que extasia; majestoso
Entrelaçar sobejo se tecendo,
Um sol quando irradias; estupendo
Tornando o nosso dia prazeroso,
Anseios dominando o caprichoso
Desejo que ora em ti bebo e desvendo.
Voracidade em toques mais audazes
E nesta louca insânia tu me trazes
O porto imaginável, nu e exposto,
O tanto que te quero e necessito
Num dia delicado e tão bonito
Meu rosto se entranhando no teu rosto.


52


Deixando esta morada aonde um dia
Pudesse tão somente imaginar
Um cais, um porto e quase mesmo altar
E nela o sonho em caos se refugia,
Bebendo fartamente a fantasia
No quanto pude outrora acreditar
E vejo noutro tom já realçar
Os erros onde o nada se tecia,
E deixo para trás qualquer detalhe
Aonde o barco apenas, pois encalhe
E a solidão decore assim as docas,
Do tanto que pudera e nada tive
Ainda quando a espera não se prive
Dos sonhos quando ausente, me provocas.


53

Na pálida incerteza onde se impera
A solidão e; dela, eu me inebrio
O quanto se transforma em desvario
Gestando a turva face da pantera,
Ausência de quem tanto ainda espera
E sigo navegando imenso rio,
A cada novo dia um desafio
E o tempo na verdade não coopera
A morte se aproxima e vejo ali
A paz que tantas vezes persegui
Gerada na mortalha e num jazigo.
No sepulcral silêncio, este abandono
E quando do vazio enfim me adono
Descanso finalmente, ora consigo.


54


Neste ócio se traduz a solidão
E nada mais eu vejo senão isto,
E quando no final, calo e desisto
Percebo em minha morte a solução,
O velho desdentado, o tempo em vão,
Num caos sem precedentes eu persisto
E finalmente além agora avisto
As brumas da soturna decisão.
Apodrecendo em vida, o quanto resta
Expressa esta armadilha e pela fresta
Apenas adivinho alguma luz,
Mas nada se trançando no horizonte
Somente este caminho já se aponte
Numa expressão de cal, mortalha e pus.



55


Separado de um sonho aonde um dia
Tivera a imprecisão de um passo além
E quando a solidão à noite vem
O manto em tons grisalhos teceria,
A sorte não se vendo, só se adia
O tempo onde a morte dita o bem,
Restando dentro em pouco, sem ninguém
Apenas a mortalha caberia.
E singro os meus herméticos caminhos
E bebo destes sonhos tão mesquinhos
Resumos de tais noites em que a messe
Deixando para trás qualquer promessa,
E o fim que dentro em pouco se endereça
E nele toda dor a ausência esquece.


56


Ignoro o meu futuro, mas percebo
O quanto nada resta e sigo assim,
Vagando do princípio ao ledo fim,
O sonho, na verdade algum placebo
E quando em fantasias eu concebo
A mágica expressão; não vejo em mim
Senão a inexpressão deste jardim
E a morte em solução; quero e recebo,
Se um dia fui audaz, agora sinto
Apodrecendo o sonho, e estando extinto
Já nada mais consola quem batalha
Senão a negação do próprio ser
Assim ao me sentindo a me perder
Enfrento o frio fio da navalha.


57

Na verdade o que inda quero
Não traduzo em verso quando
O meu mundo se tornando
Muitas vezes mais severo,
Revelar o quanto espero
E percebo desabando
Outro tempo em contrabando,
Mesmo até sendo sincero
Vivo e livre do que um dia
Tantas vezes poderia
E não sei porquanto existe,
O cenário que desnudo
No passado disse tudo,
Mas agora o vejo triste.


58

Onde vejo algum lugar
Feito em claridade e sonho
O meu canto; ali proponho
E começo a navegar
Entre as sendas deste mar
Um canoro, mas medonho
Desfilar deste bisonho
Caminheiro a se fartar
Esperando alguma luz
E deveras não produz
Nem sequer um brilho em mim,
A vontade nega o rumo
Quando enganos eu assumo
E percebo em paz meu fim.


59

Ao satisfazer quem tanto
Não pudera um só segundo
Perceber o quanto imundo
O luar em desencanto,
O meu canto vagabundo
Outro dito em tal quebranto
Quando o vejo enfim me espanto
E me perco deste mundo.
Vagamente quis a sorte
E deveras sem meu norte
O final se vendo alheio
Ao que tanto procurava
Mesmo a via fria e brava
Pela qual meu sonho veio.

60


Já não tenho mais um dia
Nem de paz nem de promessa
O meu rumo se endereça
Onde a sorte não veria,
Tendo em mim tal fantasia
O delírio recomeça
E o meu pranto já não cessa
Feito em dor, farta agonia.
Esperando alguma chance
O vazio ora se alcance
E depois de tantos erros,
Só restando ao caminheiro
O desejo derradeiro
Feito em trevas e desterros.


61

Quero o dia mais bonito
Neste sol irradiando
Um desejo se mostrando
Onde o sonho eu necessito,
E se tanto eu acredito
Neste encanto desde quando
O meu tempo se moldando
Nas essências do infinito,
Versejando em paz e sorte,
Tendo alguém que me conforte
Nada temo nesta vida,
Labiríntico caminho,
Se não vou ou sou sozinho
Eu encontro uma saída.

62


Demarcando cada passo
Com vontade de chegar
Onde tanto quis brilhar
Ou deveras já desfaço
O meu erro num cansaço
Num desejo a me tomar
E bebendo do luar
Vejo a vida noutro traço
Reparando agora bem
O caminho sempre tem
Seus espinhos, pedregulhos,
Mas depois de tanta queda
A esperança em paz me seda
E traduz novos mergulhos.


63

Vendo ao longe esta morena
Que pudera um dia ser
Pura essência de um querer
E deveras me envenena,
Onde a sorte se apequena
Na mortalha do prazer
A vontade de viver,
Tal tempesta já serena.
Vejo a vida de outra forma
Na vontade que transforma
E traduz em brilho aonde
O passado não mais fale
Noutro tempo se regale
O que em sonho se responde.


64


Violeiro e trovador
Noite afora bebo a lua,
Desço o sonho e vou à rua
Procurando outro sabor,
Navegar aonde eu for
E desejo se cultua
Na esperança que flutua
E traduz em multicor
Este prisma no horizonte
Onde o olhar agora aponte
Fonte nova em luz e glória,
A saudade se esquecendo,
Deste vão, tolo remendo
Nada resta na memória.



65

Aprendendo desde cedo
A dançar conforme o tom,
Se delírio fosse bom
Beberia este segredo,
Mas agora não procedo
Como fosse um raro dom
Este encanto, ledo som,
Meu amor em novo enredo.
Ascendendo ou desvendando
Outro dia desde quando
O meu canto quis em luz,
Mas se tenho em minhas mãos
Esperanças de outros grãos
A colheita se produz.

66

Corri mares mais distantes
Entre as ondas tão bravias
E esperava em novos dias
O que outrora me garantes
Já pudessem ser constantes
No vazio onde me guias
Os delírios, fantasias,
São dispersos diamantes,
Reunindo em cantos vários
Os meus passos, necessários
A quem tanto quis outrora,
Na esperança me perdi,
Mas agora e desde aqui
Noutro porto, o sonho ancora.



67


Nessas margens do meu sonho
Erros fartos; reconheço,
Só não sei se inda mereço
Ou ao nada me proponho,
Vejo quanto te envergonho
No caminho e num tropeço
Vou tocando e até do avesso
Novo rumo e em paz; enfronho.
Enfadonha a vida quando
Este sol se desenhando
Vê nublado este horizonte
Já cansado da batalha
Onde o fogaréu se espalha
Noutro lado a passo aponte.



68


Onde entre os mortos pudesse
O meu sonho trafegar
Procurando algum lugar
Bebo o quanto se oferece
E deveras já se esquece
Quem quisera outro luar,
A vontade de sonhar
Gera a dor e mata a messe,
Na verdade, o quanto pude
Em saber desta atitude
Já transmude o meu destino
Sendo assim se nada faço
Inda busco o meu espaço
Dia a dia eu determino.

69

Ao tentar outra esperança
Poderia ver até
Um caminho feito em fé
Onde o nada a vida alcança,
E o meu passo já se cansa
Não suporta mais galé
Procurando mesmo a pé
Qualquer cais; uma bonança.
Mas se tanto quis um dia
Outro canto poderia
E no fundo é tudo igual,
Nos corcéis raro tropel
Invadindo terra e céu
Num delírio magistral.


70

Tantas vezes pude crer
Na vontade mais atroz
E se ouvisse a mesma voz
Desditosa do querer
E sem nada mais fazer
A não ser buscar a foz
Ou tentando crer em nós,
Onde mora o desprazer.
Resumindo e vendo nisto
O que tange quando insisto
Transcendendo ao próprio verso,
Do passado quando assombra
Não vislumbro alguma alfombra
O meu rumo além, disperso.
71

Já não quero a falsa luz
De quem crê apenas nisso
Num terreno movediço
Outro passo eu jamais pus
E se vendo em contraluz
Perde logo qualquer viço
O que tanto ora cobiço
Teu caminho não traduz,
Deu pra ti. É fim de jogo
E deveras nem por rogo
Volto atrás. Olho pra frente,
No passado se perdeu,
O meu canto sendo meu
Noutro canto não se sente.


72


Se é por falta de um adeus,
Eis aqui, já está dado
Aproveita este recado
E se perca noutros breus,
Outros dias, ledos, meus
Eu pensara noutro fado,
Mas agora no passado
Os delírios, apogeus.
Resumindo assim o fato,
Se decerto eu me resgato,
Dando o fora, por favor.
Não se esqueça de levar
Cada raio do luar
Que perdeu, contigo, a cor.


73


Hoje enfim me libertando
Desta estúpida promessa
Vou seguindo e me interessa
Outro tempo calmo e brando,
O passado desde quando
O futuro já começa,
Pois sozinho se tropeça
Muito longe te levando,
Eu desejo boa sorte
E talvez alguém suporte
Carregar tamanho fardo,
Já não tenho paciência
E por certo a virulência
Desta que se fez um cardo.


74

Parta agora pro diabo,
Para o inferno que lá se cria
Quem transporta esta alma fria
E um sorriso de nababo,
Enfiando em pleno rabo
O que tanto caberia,
Noutro tempo poderia,
Mas agora em paz, acabo.
Serventia? Pois nenhuma,
À saudade se acostuma
Quem enchera tanto o saco,
Entre tanta palhaçada
No final não sobrou nada;
Neste merda não me empaco.


75


A verdade seja dita
É preciso ter na fé
Paciência e mesmo a pé
Não suporto voz maldita,
O meu canto necessita
Liberdade e sei até
Da montanha ao seu sopé
Outro fim o olhar não fita.
Vou levando a minha vida
Da maneira que eu puder,
Mas não quero mais sequer
Ouvir quem jamais foi minha
A verdade ora se alinha
Da maneira que eu quiser.


76

Não suporto babaquice
De quem acha ser bacana
O delírio quando engana
Traduzindo o que não disse,
E ficando na mesmice
Mais um dia, outra semana
A verdade quando dana
Tanto faz; vira tolice.
Abandonos? Nada disso,
Alma nunca perde o viço
Segue em frente e sendo assim
Vai picando a tua mula
Bosta quando se acumula
Vira esterco em meu jardim.


77


A palavra mais audaz
Que eu conheço é: liberdade,
Não suporto qualquer grade
O que eu faço, tanto faz,
Interessa a minha paz,
Resto eu deixo na saudade
E se tudo se degrade,
Caio fora, e sou capaz.
Vasculhando esta gaveta
Nada mais do que prometa
Levo fé, pois minha amiga.
Diamante? Jóia rara?
Falsa pedra se escancara
Noutro rumo, pois já siga.


78

Passa boi, passa boiada
Nos caminhos de um amor,
Outro dia a se compor
Deixa atrás a madrugada,
Vou seguindo a minha estrada
Seja lá como e se for
O meu canto sem favor
Vai seguindo a sua estrada,
Quanto a ti, moça bonita,
Nem meu sonho necessita
Nem vontade faz a festa.
Já prossigo o meu caminho
E prefiro até sozinho,
Quando a sorte já não presta.



79

Na verdade sou apenas
Um pedaço de ilusão
Outros dias se verão
E se trazem mais amenas
Incertezas e envenenas
Com terror sem compaixão
Já não quero a direção
Ao não mais, pois te condenas.
Resumindo assim o fato,
O meu mundo ora resgato
E te deixo enfim em paz,
Mas o quanto quis outrora
Já nem mesmo me apavora
O caminho se refaz.

80

Jogo as cartas sobre a mesa,
Nem bilhete nem recado,
O meu rumo foi traçado
Sem saber qualquer surpresa
Vou seguindo em correnteza
Desta vida e se me enfado
Deixo o tempo no passado
E ao futuro outra incerteza,
Mas melhor ficar assim,
Cada qual no seu pedaço,
Novo canto agora eu faço
Ou retorno de onde vim,
Só não vou ficar mais nessa,
Minha vida? Recomeça!


81


Este tempo feliz que um dia vira
E crera ser possível, quando após
Do sonho se vislumbra alguma foz,
Mas quando se percebe. Vã mentira.
Enquanto esta esperança além se atira
O mundo desatando frouxos nós
E sinto em discordância a nossa voz
Felicidade errando assim a mira.
E quantas vezes; pude imaginar
Apenas um cenário a se mostrar
Suave e, na verdade, falsa luz.
Restando quase nada do que fomos,
Disperso deste sonho em vários gomos
Ao nada cada passo nos conduz.

82


Dos erros tão comuns à juventude
Percebo cada engano que cometes
E neste delirar já me arremetes
Ao nada que deveras desilude,
Enquanto neste tom nada se mude
E geras o vazio e sem confetes
Os dias mais felizes; comprometes
Na insensatez da estúpida atitude.
E sei que nada disto mais traria
Ao menos qualquer luz, marcando o dia
Com trevas em brumosa realidade,
Descarto um ledo passo e no futuro
Um porto mais tranqüilo eu me asseguro
Ganhando a todo instante a liberdade.


83

Jamais quis ser estorvo para alguém
E sinto muito até pela partida,
Mas quando se percebe a presumida
Mortalha aonde o nada mais detém
Cansado de lutar contra o desdém
De quem se crê maior, mas se duvida
Do herético caminho feito em vida
Diversa da que à sorte se convém.
Vestir as minhas faces mais cruéis?
Não quero reverter os méis em féis
Apenas prosseguir e agora em paz,
Meu mundo se caiu, problema meu
Há tanto meu olhar, pois percebeu
E agora, na verdade, tanto faz.


84

Falando com franqueza, minha amiga
Eu quero ter somente dentro em mim
O canto mais tranqüilo e busco enfim
Quem tanto o mesmo passo já persiga.
No quanto desejara e não consiga
Cevar com mais cuidado este jardim,
Eu sinto a face escusa e mesmo assim
Ainda ao caminhar, o passo obriga.
Mas deixo-te à vontade, vá em paz
E tudo neste instante se desfaz
Deixando para trás sequer saudades
E quando tu quiseres companhia,
Esqueça que tivemos algum dia
Um sonho aonde em fúria já degrades.


85

Um passo para frente; olho o horizonte
E sei que qualquer dia o sol virá
E quando isto aconteça mostrará
Da vida uma razão, talvez a fonte.
Mas quando na brumosa tez aponte
Sabendo deste fato e desde já
O rumo noutro espaço levará
Mesmo que ao ledo estio se remonte.
Reparo cada estrela e busco o brilho
Aonde na verdade o sonho trilho
Deixando o sentimento em que apequeno
Minha alma se transforma e de repente
O quanto se deseja e se pressente
Traduz algum momento mais sereno.


86


Serenas noites; tudo o que mais quero
E sinto o caminhar em pedras quando
O tanto que eu quisera desdenhando
Traçando novo rumo mais austero,
E sendo neste instante, até sincero
Jamais eu poderia vislumbrando
Um ar tão poluído quão nefando
Num rude delirar duro e severo,
Assim ao me entregar a novo passo
O velho num segundo; em paz, desfaço
E traço o meu destino noutra trama,
O quanto quis e nada mais terei
Mudando de cenário e; nova grei
A um dia mais tranqüilo ora me chama.

87




Já não me caberia decidir
O rumo aonde possa ter suave
O passo se a verdade sempre entrave
Deixando em amargura algum porvir
A sorte se transforma em elixir
Sem nada nem tormenta que inda agrave
Se tudo não mostrasse a face grave
Matando e nada posso presumir.
Agora descansar; somente nisto
Pensando e quando enfim eu já desisto
Há muito precisava ter certeza
Do quanto se perdera em inverdades
Não restarão sequer as tais saudades
O mundo decorrendo sem surpresa.


88

Aprendo a decidir com calma e quase
A vida não pudera ser assim
A sorte transformando tudo em mim,
Ainda que deveras sempre atrase
Permite o caminhar em nova fase
E renascendo em paz este jardim,
Pressinto que terei, agora enfim,
Um dia com mais firme e forte base.
Eu sei que precisava apenas disso
E a paz tão necessária; hoje eu cobiço
E faço do meu verso um doce alento
Vagando em solidão? Melhor; garanto,
Do que se entorpecer em tolo canto
Jogando uma palavra solta, ao vento.


89

Percebo cada curva e sigo após
Tentando adivinhar o fim da estrada
E sei que mesmo quando der em nada
Valeu cada momento, até atroz.
Rescindo o meu contrato e busco a foz,
Depois de tanto dar, tomar porrada
A vida não seria desejada
A quem se transformou em mero algoz.
Presumo qualquer dia em tom diverso,
Mas sei também deveras ser perverso
Versando sobre tais cotidianos
E neles eu percebo o quanto posso,
Ainda até se fosse algum destroço
Já não suporto mais os tantos danos.

90


Alheio ao que pudesse ser ou não
Eu tento e descobrindo novo rumo,
O tanto quanto eu teimo e me consumo
Num verso possa dar definição,
E sei quando outros dias formarão
E vejo no final, deveras prumo
E quando no vazio eu já me escumo,
A sorte pega em paz outro vagão.
Descarrilada a vida de quem busca
A luz em noite opaca e mesmo brusca,
Ariscos os meus ermos, disto eu sei.
No fundo em concordância com a vida,
Espero mansamente uma saída
E digo que decerto a esquecerei.

91

Perceba a solidão enquanto a vida
Transcorre paralela em festa e gozo,
O canto se tornando pavoroso
E a sorte noutra face resumida,
Ainda quando o tempo não decida
E trace novo rumo; é caprichoso
Cenário onde outrora majestoso
Agora noutra estrada sem saída.
Esboços em retalhos são comuns
Enganos? Sei que tenho, ainda, alguns
E vejo a própria história resolvê-los.
Só não suporto mais a noite insana
Aonde o meu caminho enfim se dana
E trama tão somente pesadelos.


92


A podre criatura que devora
E traça atocaiada a sua presa
Percebe na verdade a sutileza
Do tempo quando a vida em vão aflora,
Por isso é que caminho desde agora
Vencendo qualquer dura correnteza
E trago cada passo com firmeza
Se a própria queda; às vezes, revigora.
Já não mais me percebo encurralado,
Outono no meu céu, pois desenhado
Permite a mansidão, mas nada disto
Esgota a minha eterna paciência,
Do todo que se tem qualquer ciência
Ao fim sem destempero, em paz, assisto.



93


Bastando tão somente acreditar
Nos dias onde possa ter a sorte
De quem em novo rumo me conforte
E saiba e reconheça este lugar.
Mas quando se percebe e sem traçar
Sequer neste desejo qualquer norte,
Ainda que a verdade dura corte
Não posso e nem consigo sonegar.
Esbarro vez em quando nos meus erros
E quando mal disfarço em vãos aterros
A charqueada em lodo se rebela,
E toda esta vontade eu dessedento
E entrego o meu caminho ao próprio vento
O coração abrindo à plena, a vela.


94


Já não sei mais sequer o que fazer
Com toda a incoerência demonstrada
Por quem se fez outrora tão amada
E agora se desdenha em desprazer.
Lutando contra a sorte eu pude ver
O fim da velha e dura, torpe escada
E a queda noutro tom prenunciada
Esboça a realidade a me envolver.
Voltando ao recomeço desta história
Não quero na verdade uma ilusória
Vontade de beber de qualquer jeito,
Depois de certo tempo num outono
Enquanto dos meus passos já me adono,
Uma ordem sem razões; jamais aceito.


95


Perdoe se deveras fui assim
Durante muito tempo quis um dia
Aonde tão somente eu poderia
Vencer a discordância viva em mim,
Acendo neste instante outro estopim
E todo o meu passado explodiria
Deixando para trás tal companhia
Vivendo plena paz, até que enfim.
Rascunhos em desenhos tão mal feitos
Os dias não seriam mais perfeitos
Se tudo presumisse apenas queda,
Mas logo me levanto e no horizonte
O olhar com mais firmeza sempre aponte
E a vida numa messe e em paz se enreda.


96

Abrindo os velhos olhos de quem sonha
Eu posso presumir cansaço e dor
Nas tramas onde tanto o desamor
Pintara numa face mais bisonha,
O tempo na verdade não se oponha
Enquanto o meu traçado inda compor
Com toda fortaleza e com vigor
Não tendo mais a voz tão enfadonha.
Resquícios de uma vida imersa em pranto,
Mas quando novo dia eu me garanto
Na força de quem busca apenas paz,
O risco de sofrer? Já não padeço,
Um sonho que busquei; mero adereço,
Meu passo com firmeza então se faz.


97


Jogando sobre a vida esta toalha
Já não comporto mais sofrer em vão,
E sei que novos tempos mudarão
O rumo desta vida onde se espalha
A fúria de uma torpe e vil batalha
E nesta entorpecida imprecisão,
Meu mundo se repara em novo não
E o bote que preparas ora falha.
Alertas de emoção depois do outono
São quedas num terrível abandono
E desabono um passo dado assim,
Espero pelo menos qualquer dia
Ausente desta espúria fantasia
Traçando a calmaria dentro em mim.



98

A sorte esta jagunça sem juízo
Fazendo uma bagunça no meu peito
E quando noutro encanto eu me deleito
Pesando sobre mim o prejuízo,
Assim se novamente eu me matizo
Já não me dou sequer por satisfeito
Sem essa de qualquer engano aceito
Eu quero é descansar num Paraíso
Ainda que preciso seja até
Andar todo o caminho mesmo a pé
O quanto me importando desde agora
É ter a mansidão de um lago calmo,
É quando em calmaria canto um salmo
E a paz suavemente em mim se escora.

99

Bastando de promessas a quem tenta
Seguir em tom suave a paz que um dia
Ainda noutro fato prometia
Quem desta forma agora desencanta.
Vestindo esta saudade, fina manta
O frio onde mais nada enfim queria
Somente uma mentira, uma ironia
Enquanto o descaminho em paz se espanta.
Aprendo esta lição somente após
A queda sobre a pedra mais atroz
Vagando pelo espaço de um segundo
Neste abissal delírio não me ponho
Nem alimento assim um mero sonho
E nem sequer no falso eu me aprofundo.

100


Não posso presumir o que virá
Nem mesmo se ainda venha algum dilema
A vida noutra via já se emblema
E segue novo rumo aqui ou lá,
Percebo que jamais perecerá
O sonho libertário e sem algema,
E quando a fantasia vira um lema
O todo se aproxima e brilhará.
Num canto após qualquer queda presumo
O fim e demonstrando um supra-sumo
A força no final revitaliza
Suavizando a queda após o fato
E desta forma o sonho em paz, resgato
Traçando meu caminho em mansa brisa

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