sexta-feira, 1 de julho de 2011

1

Não perco mais o tempo a procurar
O quanto bem sabia não existe,
O olhar se aproximando, bem mais triste,
Do que pudesse um dia, imaginar,
A vida não mais tendo onde ancorar
O velho coração ainda insiste
E a sorte que pudera, não resiste,
E vaga sem saber qualquer lugar,
Meu sonho se colide com penedos
E sei dos mais constantes desenredos
E cedo, imaginasse algum encanto,
Não tendo nem sequer a referência
Restasse tão somente uma inclemência
E a face mais cruel, ledo quebranto.

2

Marcasse com o sonho o que apresentas
Em ânsias tão diversas, virulentas,
Singrando pelas tramas mais vulgares
Ainda que decerto não notares.
Enfrento as mais temidas, vis tormentas,
E sei que na verdade o que inda tentas
Tramasse com ternura em velhos bares,
Assim como também nos lupanares.
Esqueço-me do quanto fui feliz,
E beijo a meretriz que tanto quis
Na noite sem pudor, temor e pejo,
Apenas mais um gole de saudade
E o vento noutro rumo agora invade
Somente o fim da festa, enfim eu vejo.

3

A bela prostituta, a noite imensa,
Seguindo cada rastro do que um dia
Misture realidade e fantasia
Na sorte que deveras me convença,
O passo numa sorte amarga e tensa,
O canto refinado, uma harmonia,
E tudo o que decerto eu não faria,
E o gozo por suprema recompensa.
Não vejo mais os ermos de uma vida
Jogada sobre as ruas, na avenida
Perdida pelo tempo, hoje morta.
Um cão que apenas ouço em noite escura,
O olhar se perde além, vaga procura,
E o vento bate intenso em minha porta.

4

Ainda que pudesse ser diverso
Do tanto que apresente num momento
A vida se transcende ao próprio verso
E busco no final, meu grande alento,
Sabendo que deveras se disperso
Um novo caminhar em paz; eu tento.

O canto ressoando em meus ouvidos,
Ecoa tua voz em mansidão,
Os dias entre tantos resumidos,
O fardo dita sempre o mesmo não,
Meus sonhos seguem mortos, esquecidos,
Só resta com certeza, árido chão.

Não quero outra palavra que redima,
Tampouco ledo amor em baixa-estima.


5

Não mais se imaginasse qualquer farsa
Além das costumeiras: dia a dia,
O tempo noutro tom já não disfarça
E deixa que se morra a fantasia,
A vida na verdade segue esgarça
E o sonho com certeza não viria.

Bebendo mais um gole, contumaz,
O corte se apresenta e nele entranho,
Vagando sem saber o que se faz
Da vida que pudera enquanto ganho
O rústico momento, ausente paz.

No fim já não me cabe nova sorte
Senão a que traduza o medo e o corte.

6

Um símbolo que possa desvendar
As vagas provisões de quem tentasse
Vencer o que buscasse porfiar,
Ou mesmo desnudando a velha face,
Refém do tempo turvo a se moldar,
Enquanto cada passo me embarace,

No fim a sordidez refaz o fato
E nisto outro cenário se resume
No tanto que deveras mal constato,
E sigo sem saber do teu perfume,
Na noite mais diversa ora retrato
O tênue caminhar que se presume.
Não quero novamente o falso passo
Que leve tão somente ao meu cansaço.

7

De todos os jargões que a vida traz
De tantos elementos que conheço,
O quanto poderia ser capaz
Do tempo sem saber um adereço,
Vigio com ternura quando a paz
Descubra, sem querer, meu endereço.

No fundo sou apenas sentinela
Que a vida noutro tom já disfarçasse
O olhar sem mais proveito se revela
E nisto sei do quanto em desenlace
Moldasse no final a rude tela
E nela toda a vida em turva face;

O corte na raiz, o medo além,
O preço a se pagar não mais convém.

8

Levando para sempre o que inda resta
Da luta sem sentido, sem proveito,
Apenas o caminho nega a festa

E sei que na verdade quando deito,
A luta se traduz enquanto atesta
O velho delirar já contrafeito,

No tempo onde pudera ser feliz,
No encanto tão diverso do que um dia
Ousasse acreditar em fantasia,
E ter o que deveras contradiz.

Sentindo esta verdade o que mais quis,
Agora com certeza não viria,
Sequer um toque a mais em alegria,
Somente a mais dorida cicatriz.

9

Não vejo mais a face de quem tanto
Seguisse passo a passo vida afora,
O mundo se desenha em desencanto
E o corte noutro tempo me apavora,

O vento penetrando em cada canto,
Saudade com certeza me devora,
No pânico em que a vida dita o quanto
O passo sem sentido gera o pranto.

Vestindo esta sofrível ilusão
Encontro tão somente o mesmo não,
E como alimentar uma esperança?

A farsa se desenha a cada instante
E nada mais deveras me garante
Senão cada tormenta onde se lança.

10

Não quero mais viver qualquer momento
Além do que me cabe, pois a vida
Há tanto sem defesas, concebida,
Traduz o quanto reste em desalento,

O tempo na verdade em mau provento,
Resume esta esperança já perdida,
E a luta noutra senda resumida,
O canto sem sentido ainda tento.

Não pude perceber o que traria
Ao mundo qualquer tom em alegria
Senão a mesma face desbotada,

De quem se fez tão rude caminheiro
E agora noutro tempo, derradeiro,
Expressa esta verdade feita em nada.

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