segunda-feira, 1 de agosto de 2011

SONETOS DO ABANDONO I

Procuro-te e deveras nada vejo,
Somente a mesma sombra do passado
Que trago junto a mim e lado a lado
Expressa tão somente um vão desejo,
O mundo se transforma e a cada ensejo
Um velho sonho já dilapidado
Quem fora pela vida abandonado
Encontra no vazio medo e pejo,
Aonde poderia ser feliz
A vida a cada engodo contradiz
E deixa tão somente a sensação
Do inútil caminhar sem direção
Aprofundando mais a cicatriz
E o tempo traduzindo amor em vão.

2

Há tanto que buscara alguma luz
Vencido pelas várias tempestades
E sinto quando aos poucos vais e evades
Marcando o quanto possa e não conduz
Ao todo que deveras se propus
Expressaria apenas velhas grades
E nelas o que tanto de degrades
Gerando este abandono em contraluz.
Vivendo tão somente por viver
Sem ter sequer resquícios de um prazer
Num verso revelando o quanto pude
Sentir feito um bafio desta fera,
A morte que somente em mansa espera
Sorri com seu olhar suave e rude.

3

Marcantes ilusões em joviais
Cenários que se foram e não resta
Sequer de uma esperança qualquer fresta
O sonho não retorna nunca mais,
Abandonado barco em tosco cais,
Visão desta incerteza que, funesta,
Aos poucos me domina enquanto empesta
Traçando rumos torpes e venais.
E quando a cada passo desabono
Alguma farsa feita em redenção,
Expresso a mais temível negação
E bebo tão somente este abandono,
As sendas mais felizes tão distantes,
Momentos solitários, torturantes.

4

De que me valeria a vida quando
O tempo sonegasse uma esperança
O verso no vazio ora se lança
E o sonho noutro enredo se negando,
O quanto desejasse bem mais brando
Aos poucos perde força e confiança,
Aonde é necessário temperança
O mundo se desnuda rude e infando.
Abandonado cão, qual pária sigo,
A cada novo engodo o desabrigo
E o canto se mostrando sem sentido.
Meu sonho se transforma em pesadelo,
O fim em solidão traduz ao vê-lo
Somente as teias frágeis deste olvido.

5

Não possa mais viver sequer o quanto
A vida poderia ter em si,
Quando esperança aos poucos eu perdi
Restara dentro da alma o desencanto,
Somente o mesmo nada enfim garanto,
Este intragável mundo que sorvi
Transforma num momento o que senti
E gera após a queda outro quebranto.
Jogado pelas ruas, indigente,
Ainda que vislumbre ou mesmo tente
Já nada mais carrego dentro da alma,
Nem mesmo a sensação de ter no olhar
Aonde possa um dia descansar
Ao fim de cada farsa não me acalma.

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